Carta do Brexit dá início a um longo e difícil processo de negociação
A partir de agora começa a contar o prazo de até dois anos de negociação entre as partes, estabelecido no Artigo 50
Cumprindo a formalização prevista no Artigo 50 do Tratado de
Lisboa, o embaixador britânico na União Europeia (UE), Tim Barrow, entregou uma
carta ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, em Bruxelas nesta
quarta-feira (29), dando início de fato ao processo conhecido como Brexit, que
caracteriza a saída do Reino Unido do bloco.
Na legislação da UE, é o Artigo 50 que prevê a possibilidade
de um estado-membro deixar a União Europeia e estabelece os mecanismos básicos
para isso. A carta formalizando o desligamento foi assinada pela
primeira-ministra britânica Teresa May e a partir de agora começa a contar o
prazo de até dois anos de negociação entre as partes, estabelecido no Artigo
50.
“Esse é um momento histórico. Nós vamos tomar nossas
próprias decisões e fazer nossas próprias leis. Vamos ter controle sobre o que
é importante para nós”, disse May, ao anunciar, para o Parlamento britânico a
entrega da carta. Ela também disse estar determinada a conseguir uma parceria
especial e profunda com a UE, ao mesmo tempo em que espera usar a oportunidade
para forjar um papel ainda maior para “uma Grã-Bretanha global”.
Direrizes
Nesta sexta-feira (31), Tusk deverá apresentar aos líderes
europeus um esboço das diretrizes a serem adotadas na negociação sobre como a
separação será feita. O objetivo dele será minimizar os custos para cidadãos e
negócios europeus. A versão final dessas diretrizes será definida junto com os
27 países-membros da União Europeia, numa cúpula especial que acontecerá no dia
29 de abril, em Bruxelas.
O processo oficial de saída do Reino Unido do bloco europeu
começa quase nove meses depois que 52% os britânicos votaram a favor do Brexit,
em junho passado. O acordo de separação precisará ser aprovado por 72% dos 27
países-membros, representando 65% da população, e ratificado pelo Parlamento
Europeu – conforme regra do Artigo 50.
A Grã-Bretanha precisará agora transformar a legislação
europeia em leis britânicas. O primeiro passo deve ser dado amanhã (30), quando
Teresa May deverá publicar seus planos para o chamado “Grande Projeto de
Revogação”. Caberá ao Parlamento britânico determinar o que permanece e o que será
descartado e criar outras legislações específicas para cobrir lacunas na
legislação, num processo que deve durar até meados de 2018.
As negociações de fato entre UE e o governo britânico devem
começar no fim de maio ou começo de junho do ano que vem.
Pontos-chave
Além dos termos de saída e suas implicações políticas,
jurídicas e financeiras, estará em jogo qual será a relação entre a
Grã-Bretanha e a União Europeia. Teresa May admitiu em seu discurso que o
Brexit terá consequências para o país, principalmente em termos econômicos.
“Nós sabemos que perderemos a influência sobre regras que afetam a economia
europeia. Nós sabemos que empresas britânicas que fazem negócios com a UE terão
que se alinhar com regras definidas por instituições das quais nós não faremos
mais parte. E nós aceitamos isso”, disse May.
Fora do mercado comum europeu, o governo britânico tem como
um dos principais objetivos conseguir um bom acordo de livre comércio com o
bloco.
Direitos
Outro ponto-chave são os direitos dos europeus vivendo na
Grã-Bretanha e os de britânicos que moram nos outros países da União Europeia.
Na carta dirigida ao Conselho Europeu, Teresa May diz que os cidadãos devem ser
colocados em primeiro lugar e que os negociadores devem ter como objetivo
conseguir um acordo sobre esses direitos o quanto antes.
De um lado e de outro, há um forte clima de incerteza, com
britânicos que correm para conseguir cidadania de algum dos 27 países-membros e
europeus que tentam garantir a residência na Grã-Bretanha – uma batalha
burocrática que, muitas vezes, termina sem sucesso.
Analistas esperam um divórcio difícil e estimam que as
negociações do Brexit poderão tomar mais do que dois anos. As negociações
contudo só poderão ser estendidas se todos os países-membros da UE concordarem.
Se até março de 2019 não houver acordo, nem extensão do prazo, a Grã-Bretanha deixará
o bloco automaticamente.
Enquanto o governo britânico espera negociar os termos de
saída e as relações bilaterais ao mesmo tempo, ao longo dos próximos dois anos,
o Parlamento Europeu já sinalizou que essas futuras relações só poderão ser
discutidas depois que o divórcio for concluído.
Na carta do Brexit, Teresa May dá a entender que, se não
houver acordo comercial em dois anos, a cooperação na luta contra o crime e o
terrorismo será enfraquecida – o que está sendo visto como uma “ameaça” à UE.
“Num cenário como esse, tanto a Grã-Bretanha quanto a União Europeia lidariam
com a mudança, mas é um resultado que nenhum dos dois lados espera. Por isso,
nós devemos trabalhar duro para evitar esse resultado”, diz o documento.
Caso não se chegue a um acordo comercial, a Grã-Bretanha
terá que adotar as tarifas básicas da Organização Mundial do Comércio (OMC)
dentro do mercado comum europeu, que são mais elevadas do que as atuais.
Independência da Escócia
Num desdobramento direto do Brexit, o Parlamento escocês
votou ontem (28) a favor da realização de um segundo referendo para promover a
independência do país do Reino Unido, diante da perspectiva de que a região
fique fora da União Europeia (UE), apesar de a maioria dos escoceses ter votado
contra o “Brexit”.
(Agência Brasil)