Livros infantis ganham espaço no mercado brasileiro
Embora as vendas tenham aumentado, as obras infantis ainda representam fatia pequena do mercado nacional de livros, 2,8% em 2016
Dados do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel)
mostram que o crescimento de vendas do gênero infantil em 2016, em relação a
2015, foi de 28%. Nesse mesmo período, o mercado geral de livros caiu 9,7%. Os
dados tratam dos livros vendidos no varejo, em livrarias, e foram levantados a
pedido da Agência Brasil. Hoje (18) é comemorado o Dia Nacional do Livro
Infantil, data escolhida em homenagem ao escritor brasileiro Monteiro Lobato,
que nasceu neste dia, em 1882.
A empresária Flávia Oliveira, 31 anos, é uma das
compradoras. Ela apresentou os livros à filha, Bruna, de 3 anos, desde cedo,
antes mesmo de completar 1 ano. Eram livros de páginas mais duras e com imagens
que faziam parte do cotidiano. “Como ela ia muito ao zoológico, comprávamos
livros com ilustrações de animais, nos quais ela identificava coisas que faziam
parte do universo dela”.
Segundo Flávia, após ouvir várias vezes a mesma história,
Bruna se senta com as bonecas em círculo e conta para elas o que ouviu e o que
criou a partir do livro. “Eu acho que se a gente quiser que ela tenha esse
interesse por livros quando for maior, tem que criar hábito desde criança, para
que seja algo prazeroso. Eu não tive isso. Quando entrei na escola, achava os
livros muito maçantes. Eu queria que a leitura trouxesse algo prazeroso para
ela”, diz.
Embora as vendas tenham aumentado, as obras infantis
ainda representam fatia pequena do mercado nacional de livros, 2,8% em 2016 –
um aumento em relação aos 2% registrados em 2015.
“É muito importante saber que esses livros tiveram
um crescimento, pequeno, mas significativo”, diz a secretária-geral da
Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, Elizabeth D’Angelo Serra. Para
ela, os dados, que mostram os livros comprados em livraria, não refletem no
entanto todo o acesso das crianças, que ocorre pela escola. As compras das
escolas públicas, como não ocorrem no varejo, não entram no cálculo.
“Se pensarmos na maioria das crianças do país, sem
dúvida o acesso a livros infantis se dá na escola. Muitas nunca tiveram isso
nas próprias famílias, têm pais e mães analfabetos e semianalfabetos”.
Livros na escola
Nos lugares onde se tem acesso à literatura, os efeitos
são positivos. Para Márcia Helena Gomes de Sousa Dias, professora do Centro de
Educação Infantil (CEI) do Núcleo Bandeirante, região administrativa do
Distrito Federal, os livros infantis têm papel fundamental na formação das
crianças e ajudam inclusive no processo de alfabetização. A escola, além de ter
momentos de leitura dos professores para os estudantes, incentiva as crianças e
pegarem os livros, a inventarem histórias a partir das imagens. A intenção é
que os livros estejam inseridos em todas as atividades, que se forem brincar,
por exemplo, possam usá-los. E aprendam também a cuidar, a colocar no lugar
depois de usar.
Os livros, de acordo com Márcia, servem para que as
crianças se familiarizem com as letras: “As crianças têm primeiro o
trabalho visual. Começam a perceber nos livros de história que algumas letras
fazem parte do nome dela, dos pais ou de colegas. É uma pré-alfabetização.
Fazem sempre essa conexão, de figuras com letras e depois de letras som, quando
lemos para elas”.
Além de trabalhar a literatura na própria sala de aula,
as escolas podem servir de incentivo para que a leitura chegue à casa dos
estudantes.
Um estudo da Universidade de Nova York, em colaboração
com o IDados e o Instituto Alfa e Beto, divulgado no ano passado, mostrou um
aumento de 14% no vocabulário e de 27% na memória de trabalho de crianças cujos
pais leem para elas pelo menos dois livros por semana.
O estudo revelou ainda que a leitura frequente para as
crianças leva à maior estimulação fonológica, o que é importante para a
alfabetização, à maior estimulação cognitiva e a um aumento de 25% de crianças sem
problemas de comportamento.
O estudo foi feito com base na experiência de Boa Vista
(Acre), com o programa Família que Acolhe, voltado para a primeira infância,
que acompanha as crianças desde a gravidez até os 6 anos de idade.
A leitura é um dos carro-chefe do programa, segundo a
gestora das Casas Mães no município – espécie de escolas de educação infantil de
tempo integral – do Núcleo Senador Helio Campos, Maria de Lourdes Vieira dos
Santos. Cada criança escolhe, na escola, dois livros para levar para casa e
ficar com eles pelos próximos 15 dias. Nesse período, devem elas mesmas
manuseá-los e pedir que pais ou responsáveis leiam para elas. “A leitura é
importante porque, além de aproximar os pais da criança, que têm esse tempo
proveitoso junto ao filho, ajuda a criança a desenvolver a oralidade, a mudar o
repertório de palavras. Trabalha também o imaginário e a fantasia por meio das
histórias que são contadas”, diz.
Faltam livros
Dados do último Censo Escolar, de 2016, mostram que 50,5%
das escolas de educação básica têm biblioteca e/ou sala de leitura (esse
percentual é de 53,7% para as que oferecem ensino fundamental e de 88,3% no
ensino médio). O Brasil tem até 2020 para cumprir a meta de universalizar esses
espaços, prevista na Lei 12.244. A legislação, sancionada em 24 de maio de
2010, obriga todos os gestores a providenciar um acervo de, no mínimo, um livro
para cada aluno matriculado, tanto na rede pública quanto privada.
A realidade do ensino fundamental e médio se estende ao
ensino infantil público, segundo a vice-presidente da União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Manuelina Martins da Silva Arantes
Cabral, dirigente municipal de Costa Rica (MS). Ela estima que metade das
escolas tenha pelo menos o mínimo de um livro por estudante. “E um livro
ainda é pouco, porque os livros, se utilizados, vão se gastando. Além disso,
para as escolas envolverem as famílias, precisam que os estudantes levem livros
para casa, o que vai demandar mais de um livro”.
Segundo ela, muitos municípios não têm condições de
investir em livros e dependem de parcerias com o Ministério da Educação (MEC).
Essa parceria se dá, principalmente, pelo Programa Nacional Biblioteca da
Escola, que investiu, até 2014, R$ 50,5 milhões em mais de 12 milhões de livros
para mais de 5 milhões de crianças da creche e pré-escola. Depois, o
investimento passou a ser feito no âmbito do Pacto Nacional pela Alfabetização
na Idade Certa (Pnaic), programa criado em 2013 para alfabetizar as crianças até
os 8 anos de idade. “O Brasil é imenso, tem localidade que tem condição de
fazer um investimento, mas ainda temos municípios que não têm condição, porque
livro no Brasil ainda é caro. A gente precisa dessa parceria com o MEC”.
Atualmente, o Brasil tem 64,5 mil creches, sendo a maior
parte pública, da rede municipal (58,8%), enquanto 41% são privadas e 105,3 mil
unidades com pré-escola, sendo 72,8% municipais e 26,3%, privadas. São mais de
8 milhões de matrículas até os 5 anos de idade.
(Agência Brasil)