Gestão privada pode ser a solução para Marginal Botafogo
Possibilidade de concessão da Marginal, que sofre efeitos do tempo e da má conservação, divide especialistas
Mardem Costa Jr.
A Marginal Botafogo vem sofrendo inúmeras interdições nos últimos anos, por conta de desmoronamentos das pistas de rolamento. O problema é causado pela fissura das paredes que revestem o canal do córrego de mesmo nome e a drenagem insuficiente das águas da chuva. Ao mesmo tempo, uma simples batida entre veículos provoca longos engarrafamentos, gerando, assim, ainda mais transtornos e prejuízos para os motoristas que passam por ali.
Neste cenário, a ideia de concessão pode ser uma saída para a requalificação da Marginal que enfrenta problemas estruturais agravados pela ação do tempo e falta de manutenção adequada. A opção não é totalmente novidade.
As marginais Tietê e Pinheiros, na capital paulista, foram recentemente cogitadas a ser entregues à iniciativa privada, opção depois descartada pelo prefeito de São Paulo, João Dória (PSDB).
Em Goiânia, especialistas em mobilidade urbana ouvidos pelo O HOJE, se dividem sobre a questão. O economista e doutorando em Transportes pela Universidade de Brasília (UnB), Adriano Paranaíba, defende que a via seja concedida dentro de uma Parceria Público-Privada (PPP) e que o tributo advindo da tarifa paga pelos usuários seja uma das fontes de financiamento do transporte coletivo. “A prefeitura não dá conta sozinha de suprir as demandas da cidade e precisa sim partir para soluções privadas, mas desde que isso [a concessão] seja feito de um modo transparente, sem privilégios para entidades de alguma forma simpáticas ao governo, como costuma acontecer”, assevera.
Por sua vez, o professor Marcos Rothen, engenheiro de transportes, acredita ser inviável a concessão de vias urbanas no Brasil. “Não há uma prática comum por aqui, e no caso da Marginal Botafogo, se compararmos, por exemplo, com a Ponte Rio-Niterói, não há espaço para a implantação de praças de pedágio e [a marginal] nem é uma rota sem opções de escape”, aponta.
Rothen lembra ainda que um dos casos de cobrança de tarifa afora pontes e viadutos é o chamado pedágio urbano, em Londres. Para adentrar ao centro expandido da capital da Inglaterra com um veículo privado das 7h às 18h, o motorista paga uma taxa diária de 11,50 libras (cerca de R$ 50) até à meia-noite do dia referente através da internet, telefone ou postos de atendimento. Em caso de não pagamento, a multa é de 195 libras (cerca de R$ 800).
Na visão de Antenor Pinheiro, coordenador regional da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), o próprio ordenamento territorial da cidade impede iniciativas como a concessão. “No caso das marginais Pinheiros e Tietê, isso é possível por que elas são rodovias estaduais e não vias urbanas. O sistema viário urbano é público, e uma medida nesse sentido é a privatização de uma parte da cidade, algo incompatível”, pontua.
Ex-gestor da Secretaria Municipal de Trânsito – à época Superintendência – na gestão Pedro Wilson (2001-2004), Pinheiro, porém, avalia ser correta uma cobrança de uso por parte do veículo individual da via pública, nos moldes do pedágio urbano londrino. O perito também sugere que a Marginal Botafogo tenha o tráfego interrompido e passe por um processo de revitalização do córrego e da supressão da infraestrutura viária. “Grandes cidades mundiais estão revendo seus traçados viários dentro de uma política de reconquista do espaço urbano”, finaliza.
Legalidade
A possibilidade de cobrança de uma via pública naturalmente é polêmica, principalmente quanto aos argumentos que possam ser utilizados para justificar uma ação do tipo. Para o advogado Rogério Paz Lima, membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico (Cdiu) da seccional goiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-GO), não há empecilho, do ponto de vista jurídico, quanto à concessão de vias públicas para entidades privadas.
“O Município pode conceder um bem dessa natureza, desde que seguidos trâmites de acordo com a legislação vigente. É preciso haver processo de licitação e concorrência devidamente regulares”, assinala. Lima, todavia, também concorda com Rothen que não há viabilidade técnica para uma praça de pedágio na Marginal Botafogo.
Via começou a ser construída no final dos anos 1980
A Marginal Botafogo foi iniciada no final dos anos 1980, no segundo mandato de Nion Albernaz como prefeito de Goiânia. O primeiro trecho, entre a Avenida Fued José Sebba, no Jardim Goiás, e a Avenida Independência, no Centro, foi entregue em 1991. Os demais trechos foram construídos por Darci Accorsi (1945-2014) e Pedro Wilson. Ao todo, são 6,5 quilômetros de extensão, ligando as regiões Sul e Norte de Goiânia.
No entanto, a via não foi totalmente concluída em relação ao projeto original, restando um trecho de 2,2 quilômentros entre as avenidas Deputado Jamel Cecílio e Segunda Radial. A última ação expressiva foi a inauguração da ponte da rua 1.018 sobre a Marginal no apagar das luzes da gestão Paulo Garcia (PT).
Problemas estruturais
Técnicos da própria prefeitura admitem, sob anonimato, que a Marginal Botafogo, especialmente o trecho pioneiro, possui problemas estruturais antigos e que é necessária uma profunda requalificação da via. Eles alegam que a vida útil do equipamento, de 20 anos em condições normais de conservação, se esgotou.
Para amenizar o problema, a Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinfra) deve realizar em junho uma ação emergencial de reforma do canal do Córrego Botafogo e das paredes do local que cederam e fará, paralelamente, uma licitação para contratar uma empresa para mapear toda a via expressa e identificar uma possível solução, ainda que a própria gestão de Iris Rezende (PMDB) tenha sinalizado falta de recursos para uma ação definitiva.