“Hoje é dia de rock, bebê!”
Há mais de 60 anos o Rock começava a atrair fãs no mundo todo. Conheça a história do gênero, celebrado mundialmente nesta data
Guilherme Araujo
Abra um livro de história. Talvez a primeira coisa que você fará ao folhear páginas da década de 1950 seja resgatar na memória os avanços científicos, tecnológicos e comportamentais que transformaram uma era. Agora olhe atentamente. Não seria absurdo dizer que as pessoas daquela época comungavam também o desabrochar de ideias que em tempos duros, de muita carga moralista e reconstrução pós-guerra, faziam o ambiente gritar sedento por transformações e sucumbir ao cheiro da rebeldia.
Refletindo tudo isso, foi em um desses dias da chamada década de ouro, mais precisamente em outubro de 1954, que a canção “Rock Around the Clock”, de Bill Hayley and his Comets, alcançou o número 1 das paradas norte-americanas, tornando-se campeã em pedidos nas rádios e junkeboxes e dando um ponta-pé inicial na era do rock.
Gênero que já dava as caras discretamente desde a década de 1930 por meio de riffs dramáticos do músico americano Robert Johnson, não demorou muito para que grandes vozes começassem a aparecer e contribuir para que o rock se consolidasse como um dos mais populares até os dias atuais. Neste flerte com os mais variados elementos que logo mais converteria jovens insurgentes em verdadeiros ícones – e os fariam servir como referência para gerações futuras – criou-se dentro a partir dessa nova forma de fazer música uma atmosfera que servia a todos os gostos.
Muito bem recebido pelo público jovem, que buscava se dissociar de um marasmo impregnado na cultura da época, causou furor em todas as esferas, sendo amado e odiado. Foi massacrado pela Igreja católica, fruto da ambição publicitária, dissecado pelos historiadores, tido como aliado da moda e exaltado por mentes brilhantes donas de clássicos, como Bob Dylan, Jimi Hendrix, Jim Morrison e os caras do The Who – nomes tatuados na história e considerados símbolos tão importantes à época quanto o movimento hippie ou o polêmico rosto de Ernesto Che Guevara.
Nos anos que viriam, a efervescência do movimento lançou luz sobre a poesia punk de Patti Smith, a crueza escancarada de Janis Joplin, a genialidade de David Bowie e a sensualidade embriagante de Elvis Presley, responsável por apresentar esse novo tipo de música ao mundo. O resultado de tamanho estardalhaço não poderia ser outro: brotaram filmes, livros, revistas, calendários e todo tipo imaginável de bugiganga que pudesse ser voltada para os novos consumidores. Todavia, algumas delas marcaram época, como as guitarras e os discos de vinil, que seriam verdadeiros marcos, consolidados até o dia de hoje, como artigos vintage de alta procura.
Com data para desaparecer do mapa e se tornar apenas um
modismo, os Beatles trouxeram novas direções ao rock, estabelecendo
parâmetros e modelos para toda a música pop do futuro e fazendo reviver a
música. Suas experimentações abriram novas possibilidades sonoras e ampliaram
os horizontes musicais. Caras cheios de atitude como Ozzy Osbourne e seus
companheiros do Black Sabbath; e Mick Jagger e sua trupe de garotos londrinos
apareceriam logo em seguida, convertendo os Rolling Stones em sinônimo de
energia, sex-appeal e letras provocativas, mudando para sempre as configurações
do que seria fazer rock.
No Brasil
Houve mesmo quem esperneasse dizendo que rock não era
sinônimo de coisas boas – para a moral e os bons costumes, não passava de ultraje.
Um claro exemplo disso foi a proibição do show dos Rolling Stones no Brasil em
pleno auge da Ditadura Militar. Por outro lado, não demorou muito para que se percebesse
que ninguém poderia barrar essa mania.
Os primeiros acordes do disco homônimo d’Os Mutantes, com a ousada Panis Et Circences, regida por uma jovem Rita Lee, foram prova viva
disso. Não muito distante dali, apareceriam ainda obras primas como o primeiro
álbum homônimo dos Secos e Molhados, enraizado pela figura enigmática e as
letras revolucionárias de Ney Matogrosso, e logo mais a “maluquice” de Raul
Seixas e seu clássico “Gita”. Os discos dos cinco tocaram à exaustão e
continuam vivos nas prateleiras até os dias atuais.
Ainda que a regra parecesse ser justamente não ter regras e
a repetição pudesse parecer inevitável, dois movimentos surgiram nesse
desembarque musical: a Jovem Guarda e a Tropicália. Diferentes e ao mesmo tempo
complementares, por não quererem assumir um caráter político, o primeiro desses
grupos teve seu nome originado a partir de um um texto de Lenin, revolucionário
e líder do Partido Comunista. “O futuro pertence à jovem guarda porque a velha
está ultrapassada”.
O segundo, eternizado pelos Novos Baianos e nomes como
Gilberto Gil e Caetano Veloso, assumiu um caráter mais autoral e crítico em que
se prezava o desenvolvimento de uma consciência social, política e econômica,
combinada a estéticas inéditas até então que mesclavam o rock tradicional
norte-americano com um sabor e letras genuinamente brasileiras.
Nas décadas que se seguiram, bandas como RPM, Titãs e
Paralalamas do Sucesso arrastaram multidões. Mas foi com as letras inteligentes de
Cazuza e o Barão Vermelho que o rock, que parecia estar morto, renasceu. Outras
bandas e artistas da época, como Engenheiros do Hawaii e Legião Urbana ficaram imortalizadas, criando não só no imaginário do público, bem como
nas paradas musicais, a massificação de uma receita de sucesso.
Nos dias atuais, a cena regional dá frutos. Uma série de artistas fazem o gênero
despontar com cada vez mais criatividade, mostrando que o rock goiano tem muito
sangue quente nas veias. Bandas como Luziluzia, Carne Doce e Boogarins tem feito
história ao levar seu estilo para fora do Estado. Foi-se o tempo em que Goiás era sinônimo de sertanejo. Nada mais justo hoje, para celebrar a data, do
que dar play em algum clássico, seja resgatando os velhos LPs ou encontrando
alguma playlist por aí.