Bancada Evangélica cresce no Congresso Nacional
A base de apoio, hoje com 150 congressistas, a partir
de 2019 deve subir a 180
dos 513 deputados
Rafael Oliveira*
O resultado das eleições de domingo (7) reduziu várias bancadas significativas no Congresso Nacional e deixou de fora do cenário político muitos cardeais da política, como a família Sarney no Maranhão, Romero Jucá (MDB-RR), Eunício Oliveira (MDB-CE), a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e outros.
Entre os 82 dos chamados “membros ativos” da bancada evangélica no Congresso, 42 não se reelegeram. Mas a presença evangélica no Congresso deve se expandir, segundo projeção da coordenadora jurídica do bloco religioso, Lia Noleto. “O que houve foi uma mudança de nomes. A onda da renovação atingiu todos os segmentos.”
Somando senadores e deputados, são 82 parlamentares evangélicos na linha de frente, que inclusive costumam frequentar cultos realizados nas manhãs de quarta-feira num dos plenários da Câmara.
Já a base de apoio, hoje com 150 congressistas, a partir de 2019 deve subir a 180 dos 513 deputados, diz Noleto. O futuro da bancada religiosa ainda não foi definida. Mas dá para estimar que o segmento mais que dobrou no Senado: hoje são três, e no ano que vem serão oito, 10% da Casa. Recém-eleitos no Rio, Flávio Bolsonaro (PSL), da linha batista, e Arolde de Oliveira (PSD) eram rivais na teoria, mas fizeram dobradinha, pedindo voto um para o outro.
A vitória de Arolde comprovou a força do pastor Silas Malafaia como cabo eleitoral, que o apoiou e ainda emplacou a reeleição de seu aliado Sóstenes Cavalcante na Câmara dos Deputados e do irmão Samuel Malafaia na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Outro senador eleito,Mecias de Jesus (PRB), desbancou o ex-líder do governo Temer, Romero Jucá (MDB), em Roraima.
O bloco evangélico unirá forças com os parceiros, como a frente católica e os dois outros terços da chamada “bancada BBB” —de Boi (ruralistas), Bíblia e Bala (segurança pública).
Em 13 anos de governos petistas,a bancada evangélica servia como um zagueiro das “causas morais”, tentando frear avanços progressistas indesejados, o núcleo evangélico espera partir para o ataque num eventual país presidido por Jair Bolsonaro (PSL).
“Com a onda conservadora, de uma forma geral estamos esperançosos de termos mais tranquilidades nos debates das pautas pró-vida e de família”, afirma Lia Noleto.
Um dos calouros na Câmara será Cezinha da Madureira (DEM-SP), atualmente deputado estadual. Carrega a igreja que representa no nome: ele é do Ministério Madureira da Assembleia de Deus, sob guarda do bispo Samuel Ferreira.
O capital político do bispo, que tinha como aliado o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (MDB-RJ), pode ser medido pela lista de RSVP para a convenção nacional de sua denominação em 2017: lá estiveram Geraldo Alckmin e João Doria, então governador e prefeito, mais os chefes da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal de São Paulo.
A Igreja Universal perde um deputado de peso na próxima legislação, o bispo licenciado Antonio Bulhões, e ganha outro: Marcos Pereira, ex-ministro de Michel Temer e presidente do PRB, braço partidário da igreja de Edir Macedo – que apoia Bolsonaro.
Dos que ficaram de fora da Câmara, nomes com quilometragem na política, como Missionário José Olímpio (DEM-SP). Três vezes vereador e no segundo mandato em Brasília, ele é filiado à Igreja Mundial do Poder de Deus do apóstolo Valdemiro Santiago.
A baixa mais sentida no Senado é do senador Magno Malta (PR-ES). Bolsonaro chegou a dizer em junho, na Marcha para Jesus, que enviou uma “cartinha de amor” para convencer seu “vice dos sonhos” a ficar do seu lado. Magno, contudo, tinha dois motivos para declinar a investida do capitão reformado: seu partido não queria a aliança e ele mesmo preferia não arriscar uma reeleição que dava como certa.
Irmão Lázaro (PSC) —que, como Magno, divide a atividade parlamentar com o cancioneiro gospel— foi o terceiro deputado mais votado na Bahia em 2014. Tentou saltar da Câmara ao Senado, mas perdeu a eleição.
Presidente da atual bancada evangélica, o pastor HidekazuTakayama (PSC-PR) tem um punhado de hipóteses para a derrota que não só ele, como os outros “irmãos” sofreram.
Para ele, os “radicais de esquerda” foram bem-sucedidos contra parlamentares cristãos que apoiaram o impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Colaram neles a pecha de escudeiros de um governante altamente impopular, Michel Temer (MDB). “Os evangélicos eram gratos a Temer por tirar a Dilma. Não imaginávamos tantas situações pendentes jurídicas [de Temer]. A oposição soube usar bem esse argumento, dizendo que éramos corruptos.”
Viram “vícios” no emedebista, mas por ele oraram. Acumularam vitórias em sua gestão. Celebram como uma das maiores a remoção das expressões “identidade de gênero” e “orientação sexual” da base nacional curricular, que define o que alunos aprendem da creche ao ensino médio.
No mesmo dia, o grupo entregou a Temer um ofício para convencê-lo do quão “absurda” era “a pedagogia que busca impor uma teoria com base sociológica que desconsidera a realidade biológica das crianças e adolescentes”.
Também criticaram uma resolução que combate a homofobia –há particular incômodo com escolas que deixam o aluno usar o banheiro de sua preferência, como a transexual que vai ao toalete feminino (“isso é um atentado violento ao pudor e a moral, no qual teremos homens e mulheres dividindo espaços íntimos e que deveriam ser protegidos daqueles que não compartilham da mesma anatomia”).
Reeleito em São Paulo, o pastor Marco Feliciano (Podemos) tem outra explicação para o malogro de colegas não reeleitos. “No afã de aumentar a bancada, evangélicos lançaram tantos, mas tantos nomes, que dividiram os votos. E voto não multiplica, ele migra”, afirma.
Para a assessora jurídica Lia Noleto, “não houve necessariamente um cansaço, mas uma fase de transição com os novos instrumentos de fazer política”. E muitos pastores que, na política, funcionavam à moda antiga não souberam lidar com o novo mundo. “Nomes tradicionais tiveram alguma dificuldade no trato com a mídias sociais. A forma de fazer política mudou.
“Takayama diz que não importa quem estiver na bancada, e sim o poder que os evangélicos terão de levar suas agendas adiante, e num ambiente muito mais amigável, caso Jair Bolsonaro vista a faixa presidencial em janeiro. “Não adianta a esquerda achar que pode nos derrubar. A gente é que nem bolo, quanto mais bate, mais cresce.”
O presidenciável do PT, Fernando Haddad, é o adversário ideal, segundo Malafaia. “Haddad foi o autor do ‘kit gay’, e aí nós deitamos e rolamos, jantamos o Haddad no mundo evangélico.” Refere-se ao pacote encomendado em 2011 pelo Ministério da Educação, então chefiado pelo petista, para orientar professores a combater a homofobia.
Bolsonaro teve seu terceiro e atual casamento celebrado por Malafaia, tem filhos evangélicos e chegou a ser batizado nas águas do rio Jordão (Israel), em 2016, por Pastor Everaldo, presidente do seu partido à época, o PSC. Mas, apesar de forte aliado do segmento, ele se declara católico. (*Especial para O Hoje)