União cobra do Estado R$ 100 mi de obra parada há 18 anos
Obra de irrigação, que deveria ser modelo, se tornou sinônimo de dinheiro jogado fora
Higor Santana
Faltando pouco menos de 7% para ser concluída a obra de construção do Projeto de Irrigação do Assentamento Três Barras, na cidade de Cristalina, entorno do Distrito Federal, nunca foi entregue e gerou um desperdício de mais de R$ 100 milhões. Isso porque, de acordo com uma análise do Tribunal de Contas da União (TCU), como o projeto nem chegou a entrar em funcionamento, as estruturas ficaram abandonadas e foram se deteriorando. A obra começou há mais de 20 anos, mas foi paralisada em 2001.
Ainda de acordo com o TCU, em 1997 o Ministério do Meio Ambiente e o Governo de Goiás firmaram um contrato para a construção do sistema de irrigação, que previa o repasse de R$ 35,8 milhões pela União e R$ 2,6 do Estado de Goiás, que finalizaria a obra. Entretanto, segundo o presidente do Sindicato Rural de Cristalina, Alécio Maróstica, isso nunca aconteceu.
“O Governo Federal realizou o repasse e a obra foi iniciada. Então, cabia ao Estado finalizar e entregar. O que nunca aconteceu. Desde que foi paralisada, as estruturas começaram a se deteriorar e alguns equipamentos como canos, fios e bombas de água foram até furtados. Hoje, ali se tornou um amontoado de lixo. Nem adianta tentar reiniciar ou continuar a construção do projeto porque da para ver que as estruturas acabaram. As bombas que restaram e iriam ser usadas para jogar a água nos lotes estão travadas, fora o terreno que acabou”, explica.
Ainda de acordo com Alécio, o sistema de irrigação seria construído na região em que 180 famílias receberam terras da reforma agrária, no fim dos anos 1980. A proposta, segundo ele, era que os moradores do assentamento produzissem frutas, verduras e legumes durante todo o ano, por meio da irrigação. Para isto, os governos federal e estadual decidiram montar três pontos de captação d’água.
Projeto de irrigação
Ainda conforme o projeto, a água dos rios seria puxada pelas bombas, passaria por 89 quilômetros de tubulações e seria distribuída em canos mais finos para molhar 8 hectares de terra de cada assentado. Chegaram a ser construídas casas de máquinas com motores instalados e redes de energia, mas como a obra nunca entrou em funcionamento e as estruturas ficaram abandonadas, o governo de Goiás decidiu deixar de lado o esqueleto milionário.
Assentados
Segundo o presidente da Associação dos Assentados, Luiz Carlos Pagani, na sede do Assentamento Três Barras, em Cristalina, estão amontoados quase 10 mil canos que seriam usados na obra. Para substituir o sistema de irrigação, os moradores colocaram quase cinco mil mangueiras pela horta, com vários vazamentos. “É um improviso. Uma gambiarra aproveitando o que tem”, disse.
Tribunal de Contas determina devolução R$ 110 milhões
Por conta do abandono e descaso do dinheiro público, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou que o Governo de Goiás devolva R$ 110 milhões repassado ao Estado para a construção do projeto de irrigação em Cristalina. De acordo com o TCU, o contrato assinado em 1997, previa o repasse de R$ 35,8 milhões pela União para a construção do sistema. Então, segundo o órgão, como não chegou a ser finalizado, o valor investido na época precisou ser atualizado. Assim, pelo cálculo do Tribunal, a quantia equivale a R$ 110 milhões.
A decisão foi tomada em 28 de maio pela 2ª Câmara do TCU. De acordo com o órgão, 93% da obra já estavam concluídas em outubro de 2001, mas o governo do Estado não fez a retomada de finalização. O restante deveria ser entregue em 60 dias, o que não aconteceu. O Governo de Goiás informou que apresentou recurso administrativo contra a decisão e poderá recorrer judicialmente, por entender que a condenação é injusta, tanto que foi afastada inicialmente pelo próprio TCU.
Irrigação
O município de Cristalina tem a maior área irrigada da América Latina, com mais de 50 mil hectares. O sucesso da técnica na região, de acordo com o Presidente do Sindicato Rural de Cristalina, Alécio Maróstica, se deve muito ao armazenamento de água da chuva, que seria perdida sem a presença de pequenas barragens construídas pelos agricultores. (Higor Santana é estagiário do Jornal O Hoje sob orientação do editor de cidades Rhudy Crysthian)