Ministro reacende debate sobre estudo em casa
Em Goiás são pelo menos 99 famílias que decidiram educar seus filhos em casa, o chamado ‘homeschooling’. Tema possui controvérsia após decisão contrária STF
Raphael Bezerra
Uma das prioridades do Governo de Jair Bolsonaro (PSL) para a educação é a regulamentação do ensino em casa, cujo termo em inglês é homeschooling. A permissão para pais substituir a escola regular pelo ensino em casa dos filhos foi adotada pelo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos por influência da Associação Nacional de Educação Domiciliar (Aned). Além disso, em abril o presidente assinou decreto que regulamenta o tema. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em setembro do ano passado que, de acordo com a atual legislação, os pais não têm o direito de tirar filhos da escola para ensiná-los exclusivamente em casa. Para a maioria dos ministros, educação domiciliar exige a aprovação de uma lei que assegure avaliação de aprendizado e socialização.
Mas a luta no Brasil por educar os filhos em casa movimenta grupos para a prática seja um direito legal. Em Goiás, o Instituto Liberdade e Justiça (ILJ) é um dos defensores do movimento. O presidente do ILJ, GiuliannoMiotto, acredita que a permissão para que os pais eduquem os filhos em casa é um direito legítimo e que o Estado não poderia intervir na escolha.
O grupo inclusive lidera o projeto “Turminha da liberdade”, uma série de livros com temas e autores liberais e conservadores como a escritora Russa, AynRand. “Os livros seguem eixos como a importância do empreendedorismo, das liberdades individuais, do livre mercado, da responsabilidade individual, da ética e da educação com valores”, afirma Miotto.
O grupo conta ainda com outro livro que traça a importância do contato dos pais na educação dos filhos além de uma repulsa ao modelo estatal de ensino. O Educar e Libertar conta com a participação de diversos especialistas em educação que complementam o debate e sublinha as perspectivas positivas e negativas do assunto.
Homescholing em Goiás
Segundo dados da Associação Nacional de Ensino a Distância (Aned) de 2016, há em Goiás pelo menos 99 famílias que optaram, mesmo diante da desregulamentas ação, educar seus filhos em casa. O número, no entanto, pode ser ainda maior. Segundo a Aned, diversas famílias têm medo de assumir que educam os filhos em casa por receio de sofrerem sansões ou punições.
No Brasil, segundo o mesmo levantamento da associação, já são mais de 7.5 mil famílias praticando a educação em casa. Os estudantes têm entre 4 e 17 anos e estão presentes em todas os entes federativos. A taxa de crescimento anual de famílias que educam em casa é de 55% aa.
Panorama geral
São Paulo (583), Santa Catarina (336) e Minas Gerais (308) são os estados com os maiores números de famílias que optaram por não mais enviar seus filhos à escola e estão formando-os em casa. Goiás e Distrito Federal não ficam atrás, juntos, somam 198 famílias.
A Constituição Federal de 1988 é explícita “a educação é direito de todos e dever do Estado e da família”, diz o Art. 205. Seguindo o que diz a constituição, pais buscam formas alternativas de promover a formação acadêmicas em casa, a prática é conhecida como homeschooling. Apesar de ser um direito garantido às famílias pela constituição, as mesmas esbarram diante do Estatuto da Criança e do Adolescente que obriga que os filhos sejam matriculados em rede regular de ensino.
Na irregularidade
Apesar da grande adesão por parte dos pais, o tema é ainda bastante polêmico e é pauta para discussões legais, tendo em vista que a legislação brasileira não é clara em relação à educação domiciliar. A prática não é proibida, mas segundo o Artigo 55 do Estatuto da criança e do Adolescente “Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.”, isso faz com que a retirar os filhos da escola para formá-los em casa, possa ser considerado negligência por parte dos pais podendo ainda ser punido pelo art. 246 do Código Penal como crime de abandono.
O advogado e coordenador da Aned (Associação Nacional da Educação Domiciliar), Alexandre Magno, desmistifica um dos principais argumentos de quem é contra a educação domiciliar. “Trata-se da socialização. Normalmente, quem utiliza-se deste argumento para defender a falta de liberdade das famílias em educar seus filhos em casa, não apresentam nenhum argumento fundamentado em empírico que possa mostrar que a socialização no perímetro escolar é de fato a melhor. Do outro lado da moeda, temos diversas pesquisas empíricas que mostram que não somente nas salas de aulas que as crianças irão desenvolver-se socialmente”, argumenta.
Uma das pesquisas na qual Alexandre se refere é a feita em 2003 pela Associação para a Defesa da Educação Domiciliar, conhecida como “Homeschooling GrowsUp” e levava em conta como as pessoas que foram educadas em casa estavam se saindo como adultas. Ponto positivo para a educação domiciliar, foi descoberto que em todas as áreas da vida, desde a obtenção de emprego, a estar satisfeito com sua educação em casa, a participar das atividades da comunidade, a votar, os adultos que haviam sido educados em casa eram mais ativos e envolvidos que seus colegas que haviam estudado nas escolas públicas.
Pedagoga relata os benefícios de educar em casa
Há três a pedagoga Viviane Canello decidiu por alfabetizar seu filho de 6 anos que chegou a estudar em uma escola durante um ano. “Optei, pois meu filho precisava da minha presença com ele, como acho que toda criança pequena precisa. Pela minha experiência profissional, a criança necessita desta segurança, principalmente na educação infantil, a importância da família, a referência de pai e mãe presentes na vida dos filhos, é fundamental”, explica Viviane.
Viviane destaca que a ideia de educar os filhos em casa não é apenas fugir dos parâmetros curriculares da educação nacional, segundo ela, os filhos devem receber a mesma formação, porém, no conforto dos lares. “O fantástico disso tudo às famílias homeschoolers, é ver a progressão e poder promover, ter os resultados do seu filho. É sim, maravilhoso e de uma satisfação sem igual”, assegura.
“Estou estudando gramática para ensiná-lo da melhor forma, quero seguir o método de estudo clássico. Ensiná-lo a ler e interpretar os diferentes textos. Conhecer um poema, uma matéria de jornal, um livro de história, mitologia, estudamos o catecismo da Igreja Católica, estudos bíblicos. Somos católicos, rezamos o terço todos os dias, sim, isso faz parte da nossa rotina de aprendizado. Ele reza, pensando no que está falando, meditando os mistérios do Santo Terço, não é repetição. Tem as aulas normais do currículo escolar, tem as aulas de matemática, ciências, inglês também, que é o que ele mais gosta”, explica.
O filho de Viviane Canello, de apenas 8 anos, adora estudar inglês. Segundo a mãe, ele sabe que há uma diferença entre ele e outras crianças que frequentam a escola, para compensar o tempo em casa, ele participa de encontro semanais para desenvolver atividades físicas e ficar com brincar com outras crianças. “Ele entende que é diferente de ser educado na escola, hoje ele não quer mais ver falar de escola. Em casa ele aprende muito mais e em muito menos tempo. Aqui na nossa cidade há muitas famílias optando por ficarem mais tempo com as crianças e outras já fazendo o Homeschooling. Então, sempre têm crianças para ele brincar e um encontro ou outro, com outras crianças para a socialização”, explica.