Ocorrências de linhas de pipas com cerol aumentam mais de 100% em Goiânia
Até o momento já foram registradas 162 infrações ocorridas em todas as regiões da cidade – Foto: Wesley Costa
Pedro Moura
As pipas usadas por crianças e adultos com linha contendo cerol voltaram a ser um problema nos bairros da Capital. A atividade é normalmente praticada em julho, mas inúmeras ocorrências já foram registradas pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), que calcula um aumento de 122% comparado ao mesmo período do ano passado. Somente em abril foram 22 ocorrências. Já em maio houve uma marca de 114 registros. Em junho, até o momento, foram registradas 25 ocorrências em todas as regiões da cidade, contabilizando 162 infrações contra 73 em 2019.
Segundo o porta-voz da GCM, Janilson Saldanha, a pandemia do Coronavírus e o isolamento social podem estar contribuindo para o aumento nas ocorrências. “O que a gente consegue observar é que o aumento acontece em função da Covid-19. O decreto tanto estadual quanto municipal e o fato das escolas não estarem funcionando. Por causa disso, essas crianças provavelmente estão saindo aos montes para soltar pipa, mesmo não sendo período de férias”, informou.
Janilson explica que desde a implantação do Programa Pipa Sem Cerol, há mais de 10 anos, os casos na Capital foram reduzidos exponencialmente. “Nos anos iniciais houve mortes e outros muitos acidentes. A partir de 2016, com a conscientização da população e também o trabalho da GCM, não tivemos acidentes fatais. No decorrer dos anos tivemos leis que proibiram a comercialização, confecção, transporte e armazenamento de toda a linha de cerol, o próprio cerol, a linha chilena e a linha indonésia”, disse.
Ainda de acordo com Janilson, menores de idade que fazem uso do cerol podem ser encaminhados à polícia por seus atos, já que o crime pode causar desde acidentes gravíssimos até a morte de pessoas. “Os mecanismos de flagrante, tanto das pessoas que são pegas fabricando, comercializando ou utilizando, em caso de crianças, podem ser conduzidas para o Delegacia de Polícia de Apuração de Atos Infracionais (Depai), e no caso de adultos, conduzidos à Central de Flagrantes. Então o delegado vai determinar a punição baseada na lei”, concluiu.
Prática comum
Apesar de ser uma prática comum, as crianças conhecem os perigos de usar o cerol nas linhas. Eduardo Arantes, de 11 anos, garante que não usa cerol. “Minha linha é branca, algumas vezes soltei pipa com cerol até mesmo com linha chilena, mas parei, não quis mais usar cerol depois que descobri que posso machucar outras pessoas, desde então só solto pipa com linha branca, dependendo da pipa com linha de costura”, disse.
Eduardo diz que já se feriu durante a brincadeira. “Me machuquei algumas vezes soltando pipa com cerol, cortei alguns dedos. Uma vez me machuquei sem estar soltando pipa, somente com a linha, então comecei a perceber o quanto era perigoso. A minha mãe também sempre falava para não brincar com pipa usando cerol”.
Já Enzo Gabriel, de 12 anos, explica que nunca usou cerol. “Eu gosto muito de soltar pipa, mas nunca usei cerol, sempre soltei com meu pai e meus irmãos. Além deles me explicarem que era perigoso e poderia ferir outras pessoas sem querer, eu nunca achei legal. Até porque cortar a pipa é para nos divertimos, não para cortar a pipa de outras pessoas”, explicou o garoto.
Pipa Sem Cerol
No último fim de semana cerca de 50 agentes da GCM realizaram, ações de combate ao uso cerol nas regiões Sul e Norte de Goiânia. As equipes das Unidades de Comando Regional (UCRs), do Grupo de Operações com Cães (GOC) e a ROMU realizaram orientação e apreensão de materiais cortantes utilizados para empinar pipas.
A campanha Pipa sem Cerol é realizada pela Prefeitura de Goiânia há 11 anos e tem como objetivo, conscientizar crianças, adolescentes e adultos sobre o perigo do cerol e orientar a todos sobre a brincadeira de forma saudável. De acordo com a prefeitura, na ação foram utilizadas 18 viaturas com 54 agentes GCMs, onde foram apreendidos 200 carretéis com cerol comum e linha chilena, 145 pipas com materiais cortantes, uma abordagem e liberação no local.
Além de uma faca (arma branca), dois cigarros de substância aparentemente sendo maconha e um menor de 16 anos que foi entregue aos responsáveis. Uma vez que se alterou com a equipe da GCM, que havia apreendido a sua pipa, o menor já tinha uma passagem por assalto.
O comando da GCM pede que os pais observem o material utilizado na linha das pipas desses jovens, quando os mesmos saírem para a prática da brincadeira, ou mesmo deem uma observada nos locais onde eles soltam as pipas para se certificarem que não estão usando acessórios inadequados. A corporação pede, ainda, que em caso de irregularidades, a população denuncie através do telefone institucional 153.
Linhas cortantes provocam acidentes graves
No começo do mês o auxiliar de confecção Felipe Alves, de 20 anos, sofreu um corte profundo no braço ao ser atingido por uma linha usada para soltar pipa que estava com cerol. Ele precisou fazer uma cirurgia para reconstrução do músculo, no Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo). A cunhada de Felipe, Annathália Pereira, de 25 anos, explicou que ele caminhava nas proximidades da GO-040, no bairro Jardim das Esmeraldas, em Goiânia.
O auxiliar estava indo para a casa de uma tia, quando um carro arrastando uma linha de pipa passou ao lado dele. A linha se prendeu ao braço e cortou profundamente o músculo. “A linha ficou presa em um carro que passava no local e acabou cortando o braço dele na hora. Foi muito profundo o corte, tanto que ele fez cirurgia e vai precisar de fisioterapia para recuperar o movimento completo do braço”, explica a cunhada.
Felipe fez um apelo para que as pessoas tenham mais consciência e não usem cerol. “Gostaria de deixar um apelo para esses jovens que gostam de soltar pipa com linha de cerol. Não façam mais isso. A linha passou no meu braço, cortou meu músculo no meio, tive que fazer uma cirurgia. Você está colocando sua vida em risco e a vida de outras pessoas”, concluiu.
Fora o poder de causar sérias lesões, se o resgate de uma pessoa ferida por linha chilena, cerol ou qualquer subtipo destas não acontecer de forma rápida, é possível que o sangramento excessivo leve à morte. As regiões do corpo em que as vítimas costumam ser atingidas são pescoço e pernas, áreas onde há bastante circulação de sangue.
Linhas cortantes
As linhas cortantes são usadas para cortas a pipas de outras pessoas. Para muitos, a diversão de soltar a pipa consiste exatamente no fato de derrubar a pipa dos adversários e isso talvez explique o aumento na procura por linhas cada vez mais cortantes.
A linha chilena, por exemplo, tem um poder de corte quatro vezes maior que o cerol. Enquanto o cerol é fabricado com uma mistura que pode ser feita com cola e pó de vidro ou cola e pó de ferro, a linha chilena é feita industrialmente e seu poder de corte é tão elevado, pois à linha original são adicionados pó de quartzo e óxido de alumínio.
Facilmente encontrada em mercadinhos de bairro, linhas usadas para cortar outras pipas durante a prática de empinar também podem ser rapidamente achadas por preços bastante baixos em sites de venda online e grupos nas redes sociais. O preço de uma carretilha com 1.000 metros da linha chilena varia entre R$ 20 e R$ 35, 100 jardas costumam ser comercializadas com valores inferiores a R$ 7. (Pedro Moura é estagiário do Jornal O Hoje sob orientação do editor de Cidades Rhudy Crysthian)