Trecho do BRT Norte-Sul na Avenida Goiás está parado há seis meses
Iphan suspendeu as obras do corredor entre a Rua 1 e a Praça CÃvica para evitar danos ao acervo Art Déco| Foto: Wesley Costa
Igor Caldas
A paralisação da obra do BRT na Avenida Goiás foi feita pelo Instituto de Patrimônio Histórico ArtÃstico Nacional (Iphan), por considerar que o método de construção da via causaria riscos aos patrimônios na proximidade do trecho entre a Avenida Independência e a Praça CÃvica. O Ministério Público Federal (MPF) recomenda que o Iphan revise ou se abstenha da suspensão das obras do BRT na Avenida Goiás por considerar que os motivos apresentados pelo Instituto ao órgão fiscalizador não justificam a suspensão dos serviços.
Ainda no primeiro semestre deste ano o Iphan pediu a suspensão as obras do corredor exclusivo entre a Rua 1 e a Praça CÃvica, para evitar danos à Torre do Relógio, parte integrante do acervo de Art Déco da Capital, tombado pelo Instituto. Em março deste ano a Secretaria Municipal de Infraestruturas e Serviços Públicos de Goiânia (Seinfra) cumpriu a medida e suspendeu as obras no referido texto.
No mês seguinte, em abril, o Iphan oficiou a ampliação do trecho com obras suspensas na Avenida Goiás, no trecho entre o cruzamento com a Avenida Independência até a Praça CÃvica. As obras do BRT neste trecho continuam interditadas. Após recomendação do Iphan, a Prefeitura de Goiânia tem expectativa de que os trabalhos devem ser retomados hoje (24).
A Seinfra informou ao MPF no dia 10 de agosto sobre a determinação do Iphan em paralisar as obras do BRT na Avenida Goiás no trecho entre a Rua 1 e a Praça CÃvica, no dia 16 de janeiro deste ano, para evitar danos à Torre do Relógio, causado por trepidações dos maquinários pesados utilizados nos trabalhos.
No documento oficiado ao órgão de fiscalização, a Seinfra afirma que foi realizada reunião entre a equipe técnica da Secretaria de Obras, a direção do Iphan e representantes da empresa contratada para tentarem encontrar alguma alternativa para a execução da base do corredor sem causar riscos ao monumento. Em resposta ao documento enviado ao MPF, o órgão federal pediu que o Instituto revise ou se abstivesse da decisão de suspensão da obra.
Além disso, o MPF afirmou que apesar de o municÃpio já possuir o licenciamento ambiental e de patrimônio histórico para a obra desde 2015, em janeiro deste ano o Iphan insistiu em determinar a paralisação total dos serviços na Avenida Goiás, com a justificativa de suposta necessidade de observância de medidas de natureza cultural e arqueológica.
Licenciamento ambiental
Desta vez, o órgão demandou a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta que determinou a Seinfra a adotar uma medida compensatória por ter supostamente descumprido uma exigência que não estava prevista no licenciamento ambiental concedido. Por isso, a Secretaria de Obras Públicas da Capital pediu providências ao MPF para que as obras pudessem ser retomadas.
O procurador da República Helio Telho, responsável pelo caso, pediu informações ao Iphan, que encaminhou ao MPF uma nota técnica apontando a existência de danos à Torre do Relógio causados por falta de manutenção do monumento. A nota técnica enviada pelo Instituto também aponta que o avanço das obras do BRT poderia agravar os problemas do bem tombado. O documento, no entanto, não especificou relação causal entre as obras e os danos na Torre do Relógio.
De acordo com o MPF, a única parte da nota técnica enviada pelo Iphan que indica um fato da obra constatado não cita a obra de arte ou o projeto. Ela se refere apenas ao método construtivo usado na execução da obra e cita um determinado compactador do solo que causaria vibrações no terreno e nas edificações próximas. Esse fato não justificaria a paralisação da obra, segundo o órgão federal. No entanto, outras estruturas que compõem acervo de Arte Déco, como o Coreto, também estão na proximidade da obra do BRT.
MPF sugere substituição de método de construção do BRT
O método construtivo apontado como potencial causador de danos à obra na nota-técnica enviada pelo Iphan é o único problema na obra. Portanto, para o MPF, bastaria a proibição do uso do método construtivo e a substituição por outro modelo, sem impacto ao patrimônio histórico. Em relação aos possÃveis impactos culturais ou arqueológicos, o Instituto já reconheceu que não há dano ou risco à obra a ser evitado.
O projeto do corredor BRT, no trecho apontado, não prevê abertura ou alargamento de vias públicas. Nele, consta somente a substituição do pavimento existente e que, se houve danos arqueológicos, eles aconteceram na época da abertura da Avenida Goiás, ocorrida há mais de oito décadas, o que justificaria a paralisação da obra. O MPF aponta que mesmo se houvesse algum dano arqueológico a ser compensada, ela não dependeria da paralisação da obra.
Para o procurador Helio Telho, não há risco de dano que justifique a medida administrativa adotada pelo Iphan. Por outro lado, a paralisação da obra pública, além de inadequada para os fins a que se propõe, por si só causa prejuÃzos ao erário, que já investiu quase R$ 200 milhões aos usuários dos logradouros afetados; à empresa contratada; à s empresas estabelecidas na região, que perdem vendas; à arrecadação tributária, dependente do faturamento dos contribuintes ali estabelecidos, além do prolongamento os transtornos ao já caótico trânsito da Capital.
A reportagem tentou contato com o Iphan para questionar se a decisão de paralisação das obras da Torre do Relógio no Centro de Goiânia será revista, mas o instituto não respondeu até o fechamento da reportagem.
Centro Histórico
O Coreto da Praça CÃvica foi inaugurado em 1942, mesma ocasião quando foi feito o Batismo Cultural de Goiânia e faz parte da construção da paisagem do Centro Histórico da cidade. A obra do Coreto tem riqueza de detalhes no acabamento, com composição simétrica, laje plana e elementos geométricos caracterÃsticos da Art Déco. De acordo com o Iphan em Goiás, a revitalização do Coreto da Praça CÃvica buscou valorizar o estilo arquitetônico com a recuperação integral da laje, dos pisos, bancos em granitina e revestimentos de pedra portuguesa na área externa.
Também foi feita a restauração do reboco, dos adornos e elementos decorativos, da recomposição de luminárias, paisagismo, execução de calçada acessÃvel e, por fim, a pintura. Segundo o Iphan, a intervenção foi executada de forma a garantir a integridade e arquitetura do edifÃcio histórico. O Instituto fez uma série de investimentos no Estado em obras de reforma em edifÃcios e espaços públicos nos últimos. Foram R$ 48 milhões investidos em oito obras em Goiás, sendo seis na cidade de Goiás e duas na Capital: a restauração da Estação Ferroviária e a requalificação urbana da Praça CÃvica com custo total de R$ 18,3 milhões.
22 bens tombados
Goiânia reúne um acervo Art Déco com 22 bens tombados desde 2003. Eles são o conjunto de edifÃcios e demais elementos que formam a Praça CÃvica (Coreto, Fontes Luminosas, Fórum e Tribunal de Justiça, Residência Pedro Ludovico, Departamento Estadual de Informação, Obeliscos com luminárias, Palácio das Esmeraldas, Antiga Delegacia Fiscal, Antiga Chefatura da PolÃcia, Secretaria Geral, Torre do Relógio e Tribunal Regional Eleitoral), Liceu de Goiânia, Grande Hotel, Teatro Goiânia, Escola Técnica de Goiânia, Estação Ferroviária, Trampolim e Mureta do Lago das Rosas, Palace Hotel, Subprefeitura e Fórum de Campinas e traçado viário dos núcleos pioneiros de Goiânia e Campinas. (Especial para O Hoje)