Economia no Sul e no Nordeste tende a demorar mais para repor perdas
Taxa de desemprego no Nordeste chegou a 16,1% no segundo trimestre deste ano, sendo a mais elevada entre regiões – Foto: Reprodução
Lauro Veiga
As
características peculiares de cada região, a extrema disparidade e desigualdade
entre elas tendem a impor caminhos e ritmos diferentes para cada uma das
economias neste e no próximo ano. Sul e Nordeste, por exemplo, tendem a retomar
níveis anteriores à crise atual por volta de 2023, com a economia do Sudeste do
País recompondo-se até 2022, nas projeções da economista Camila Saito, da Tendências
Consultoria. O mercado de trabalho continua sendo um obstáculo relevante para qualquer
possibilidade de recuperação, especialmente na região nordestina.
A
taxa de desemprego no Nordeste chegou a 16,1% no segundo trimestre deste ano, a
mais elevada entre as regiões, saindo de 14,6% em igual período do ano passado,
de acordo com os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua
(PNADC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao mesmo
tempo, o número de ocupados sofreu corte de 14,5% na mesma comparação, passando
de 21,286 milhões para 18,209 milhões de pessoas. O dado reforça a percepção de
que o mercado de trabalho nordestino foi o mais sacrificado na crise produzida
pelo Sars-CoV-2, constata Sílvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
Os
números da informalidade, mais elevados entre os nordestinos, e a retração
vigorosa dos serviços e, nesta área, especialmente dos serviços prestados às
famílias e atividades turísticas, estariam por trás desse comportamento mais
negativo, apontam Sílvia e Camila. Apenas os serviços de turismo acumulavam
perdas de 41,0% nos sete primeiros meses deste ano, destaca Camila. Adicionalmente,
mais da metade da população ocupada não têm carteira assinada, nem registro no
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) ou estão a serviço de familiares,
sem remuneração. “Acho que podemos esperar o Nordeste sofrendo mais em termos
de emprego neste final de ano e com dificuldades no começo de 2021”, afirma Sílvia.
Nas
projeções da Tendências, adianta Camila, o Produto Interno Bruto (PIB) poderá
sofrer contração de 5,0% neste ano naquela região, com avanço ao redor de 2,4% em
2021, taxas que se comparam com redução de 5,6% esperada na média para o País em
2020 e com a elevação de 2,9% projetada para 2021. Luka Machado Barbosa, do Itaú
Unibanco, acredita também que o PIB nordestino tende a registrar queda menos
severa, mas estima um recuo pouco abaixo de 4,5% para este ano.
Massa
ampliada
Essa
tendência diz respeito muito mais ao auxílio emergencial recebido pelos mais
vulneráveis ao longo da pandemia. A massa ampliada de rendimentos, que
incluindo salários, transferências de renda do setor público, aluguéis e outras
formas de rendimento recebido pelas famílias, aponta Camila, tende a crescer
13,6% neste ano no Nordeste, diante de um avanço médio de 4,5% para o restante
do País. Mas o cenário deve se complicar em 2021, a despeito da recuperação esboçada
nas projeções. O fim do auxílio emergencial deverá impor um tombo de 12,3% na
massa ampliada de renda. A redução, acrescenta a economista, será influenciada também
pelo congelamento dos salários de servidores no próximo ano, parte dos compromissos
fiscais assumidos pelos governos estaduais em troca do socorro bancado pela
União neste ano. A folha de pessoal do setor público na região responde por
28,0% da massa de rendimentos do trabalho.
Balanço
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Depois
de trilhar uma trajetória notoriamente irregular desde os anos de recessão, o
setor de serviços entrou em forte baixa neste ano, por conta da pandemia, o que
afetou diretamente o nível de ocupação do Sudeste. “O impacto foi muito forte,
até porque a atividade, na região, está muito associada à informalidade”,
constata o economista chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves. O
resultado foi uma queda de 11,5% no número total de ocupados no segundo
trimestre deste ano, acrescenta Silvia Matos.
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O
comportamento dos serviços ganha relevância na análise da economia na região
porque o setor responde por uma fatia de 76,0% do PIB, acima da participação
média de 73,0% observada em todo o país, anota Camila. As projeções da
consultoria sugerem uma retração de 5,7% para o PIB do Sudeste neste ano, muito
próxima da redução de 5,6% esperada para a economia brasileira.
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Olhando
setores de forma mais desagregada, além dos serviços, aponta Camila, as
indústrias de veículos e de máquinas e equipamentos encontram-se entre os
setores mais afetados pela crise, num desempenho compensado parcialmente pelo
setor de fabricação de bens alimentícios e ainda pela indústria extrativa do
Rio de Janeiro. “Não fosse a indústria do petróleo, o cenário seria ainda
pior”, pontua.
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Segundo
ela, o processo de maturação de uma série de plataformas que haviam entrado em
operação nos últimos anos produziu um salto de 21,0% no setor extrativo carioca
no acumulado até julho deste ano, em relação aos primeiros sete meses de 2019,
dado mais recente conhecido até então. Ainda assim, o PIB da indústria tende a
recuar 5,5% neste ano, enquanto espera-se uma redução de 6,6% para as vendas do
varejo ampliado frente a 2019.
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A
reação esperada para 2021, na faixa de 3,0%, lembra Camila, não deverá repor
toda a perda estimada para este ano e a volta da economia no Sudeste aos níveis
de 2019 está prevista para 2022. “No próximo ano, o PIB industrial tende a
avançar 4,0%, com elevação de 2,9% para os serviços, mas a agropecuária deverá
apresentar redução de 3,6%”, antecipa.
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A
massa total de rendimentos poderá encolher 2,1% em 2021, depois de avançar
perto de 1,8% neste ano em função justamente dos recursos injetados pelo
governo para socorrer famílias mais vulneráveis durante a pandemia.
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A
economia no Sul do País, mais penalizada neste ano, tenderá a apresentar
números relativamente mais animadores em 2021, na comparação com as demais
regiões. De acordo com Camila, o PIB deverá experimentar queda de 7,3% em 2020,
puxada pelo tombo de 9,0% antecipado para o PIB da indústria, com maior
influência dos setores de máquinas e equipamentos, veículos, produtos de couro,
calçados e vestuário.
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Diante
de uma base muito retraída, adianta Camila, o PIB poderá apresentar alta de
4,2% em 2021 e, ainda assim, a economia regional somente retomaria os mesmos
níveis de 2019 por volta de 2023, a se confirmar o cenário básico trabalhado
pela consultoria.