TCE suspende aluguel de ônibus elétricos para a linha do Eixo
TCE aponta planejamento deficiente, com erro metodológico na comparação dos custos de veículos a combustão e os elétricos
A licitação para a contratação de 114 ônibus elétricos para substituir parte da frota já sucateada do Eixo Anhanguera foi suspensa pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-GO) após o corpo técnico do órgão encontrar diversas irregularidades no processo. O Tribunal questiona a falta de um estudo de viabilidade financeira para a substituição da frota convencional por veículos elétricos. Apesar da redução do gasto com o Diesel, que sofre constantes altas no preço, não é possível determinar uma queda nos custos com manutenção e o aluguel de R$ 69 mil para cada um dos veículos.
A decisão de suspender a licitação foi do conselheiro Helder Valin. A licitação, que supera o valor de R$ 1,4 bilhão, coloca em risco o caixa do estado. A Metrobus, empresa que administra a linha do Eixo, já entrou com recursos contra a medida cautelar para apresentar sua defesa. A defesa deve ser apreciada por outro relator após sorteio. A empresa de sociedade mista não respondeu às solicitações de informações da reportagem.
Entre os argumentos que embasaram a medida cautelar o conselheiro mencionou planejamento deficiente, com erro metodológico na comparação dos custos de veículos a combustão e os elétricos, ausência de detalhamento mínimo dos serviços envolvidos e seus custos, parcela do objeto que representa 40% do total.
“A instrução técnica também apontou que o edital tem riscos financeiros não considerados, inexistência de parâmetros para eventuais pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro (reajustes), imprecisão no cálculo do valor total e regra de habilitação potencialmente restritiva. Também há falta de documento que comprove atendimento de artigo da Lei de Responsabilidade Fiscal, no que tange aos impactos da contratação nos aspectos orçamentários do Estado e ao Plano de Recuperação Fiscal de Goiás”, afirma o TCE.
Outra falha diz respeito ao prazo da delegação da Metrobus no sistema de transporte coletivo metropolitano, que vai até abril de 2031, enquanto o eventual contrato decorrente do edital ora suspenso vigoraria até 2038, “havendo descompasso e risco de segurança jurídica na continuidade dos serviços.”
Veículos são mais caros, mas não poluem
O professor do Instituto Federal de Goiás (IFG) e engenheiro de transportes, Marcos Rothen, explica que os ônibus elétricos são bem mais confortáveis, silenciosos e não poluem o meio ambiente. “A poluição dele praticamente não existe. É uma opção que ainda não está tão próxima da realidade em Goiânia”, diz. Isto porque os veículos ainda são bem mais caros em comparação aos ônibus convencionais. Portanto, segundo ele, seria necessário o investimento em qualidade e não na economia.
A cidade de São José dos Campos (SP) deve ser a primeira a operar com frota 100% elétrica. A expectativa é que os novos modelos comecem a operar em outubro deste ano. A frota será composta por até 437 ônibus no modelo padron 0 km, 100% elétrico, com ar condicionado e carregador USB. “São José Dos Campos é uma cidade bem rica e está investindo nesse tipo de veículo para oferecer melhor qualidade aos usuários”, afirma Marcos.
Argumentos fáceis de serem rebatidos
Para o governador Ronaldo Caiado, a decisão foi feita baseada em argumentos fáceis de serem rebatidos. Segundo ele, o processo foi discutido de forma ampla com a população. “A decisão é algo que não tem a menor consistência, agride a inteligência de qualquer pessoa”, afirma.
Como exemplo ele cita que, caso a Metrobus perca a delegação sobre o eixo, outro órgão do governo cuidaria do contrato sem prejuízo algum. “Está lá no contrato que qualquer órgão que venha amanhã a substituir a Metrobus será responsável pelos contratos que foram feitos anteriormente.” Ele também negou qualquer problema de previsão orçamentária. “Sempre cuidei muito disso, nunca fiz disso uma peça de ficção.” A reportagem entrou em contato com a Metrobus, mas não houve resposta antes do fechamento desta edição.
Pregão
O processo examina o edital de pregão eletrônico da Metrobus nº 45/2022, do tipo menor preço, para contratação de empresa especializada na prestação de serviços de locação de ônibus elétricos articulados, incluindo manutenção integral dos veículos, implantação e instalação da infraestrutura de recarga e suporte, adaptação da estrutura da oficina e garagem.
O valor mensal de cada um dos 114 ônibus foi orçado em R$ 69,5 mil, pelo prazo de 16 anos, chegando ao total de R$ 1,4 bilhão. O Tribunal de Contas requisitou o edital para exame em razão da matriz de risco do projeto. Em seu despacho o conselheiro relator assinala que os técnicos encontraram “inúmeras fragilidades, desde a execução do Procedimento de Manifestação de Interesse – PMI, que impactaram na etapa do planejamento da licitação, a qual revelou outros riscos, levando a crer, nos dizeres da unidade técnica, que o modelo de negócio não está suficientemente amadurecido.”
MP já havia recomendado que pregão fosse suspenso
No último mês, o Ministério Público de Goiás (MPGO) havia recomendado a suspensão do pregão eletrônico até a conclusão de estudo de viabilidade econômico-financeira pelo TCE-GO dos serviços a serem licitados. Em sua decisão, a promotora de Justiça Leila Maria de Oliveira, alertou que ainda precisava ser verificados vários aspectos da questão, como a vantajosidade para a empresa em locar os veículos e instalar estrutura transitória alugada, ao invés de adquirir a própria frota, e ter a possibilidade de vendê-la no futuro.
Ao expedir a recomendação, a promotora de Justiça observou que o valor global do contrato é de R$ 1.460.726.096,76 e que não há estudo técnico ou planilha de custos comparativos entre a viabilidade de comprar ou locar os ônibus elétricos. Segundo ela, isto impossibilita verificar a vantajosidade e a economicidade da adoção de uma ou de outra medida.
Foram solicitadas informações sobre os fundamentos que embasaram a escolha do modelo específico de ônibus elétrico, sobre o estudo da viabilidade econômico-financeira realizado para fundamentar a locação dos 114 ônibus e qual é a facilidade de serem encontradas peças de reposição, material e mão de obra qualificada para executar a manutenção, bem como o quanto isso pode impactar nos cofres e nas despesas.
Critérios
Os veículos propostos para operarem no eixo Anhanguera e suas extensões, conforme descrito o documento, deverão ser do tipo M3 – veículo leve sobre pneus, 100% elétrico, piso alto, articulado, com comunicação entre os vagões, sendo que pelo menos uma unidade deverá estar dotada de tração, e, com capacidade nominal mínima de 170 passageiros.
A acessibilidade deverá propiciar a condição de utilização por qualquer pessoa, com segurança e autonomia, total ou assistida. “Trata-se de um fator determinante para a aplicação operacional no sistema de transporte público e, portanto, todos os veículos definidos neste item deverão ser acessíveis”, aponta o documento da Metrobus. (Especial para O Hoje).