Poeta Antonio Cicero, da ABL, morre aos 79 anos
Em carta emocionante, Cicero relata sua luta contra o Alzheimer e sua escolha pela eutanásia como forma de “morrer com dignidade” após anos de sofrimento
O poeta Antonio Cicero, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), faleceu na última quarta-feira (23), aos 79 anos, após optar por um procedimento de morte assistida na Suíça, onde residia. Cicero, que lutava contra o Alzheimer, deixou uma carta que revela sua difícil jornada com a doença, na qual descreve a perda progressiva de memória e a incapacidade de reconhecer pessoas próximas.
Na carta, Cicero expressa sua escolha pela eutanásia como uma forma de “morrer com dignidade”, refletindo sobre a insuportabilidade de sua vida sob o impacto da doença. Ele escreve:
“Queridos amigos,
Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação. A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas – senão a coisa – mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade. Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!”
A morte assistida, procedimento legal na Suíça, permite que pacientes com doenças terminais escolham o momento de sua morte. Nesse processo, a equipe médica fornece os medicamentos, mas é o próprio paciente quem administra a dose fatal. Em contraste, a eutanásia, que envolve a administração da dose fatal pela equipe médica, continua a ser ilegal no país.