Brasil faz história ao colocar pobreza e desigualdade no centro das discussões do G20
Pela primeira vez, temas são tratados como prioridade por líderes das nações mais ricas do mundo; Brasil tem o que celebrar
A cúpula do G20 começou nesta segunda-feira (18/11) no Rio de Janeiro, colocando a cidade como o centro das atenções globais. Representantes das 19 maiores economias do mundo, além da União Africana, União Europeia e países convidados, se reúnem para debater questões temas nunca antes tratados como prioridade pelo grupo como o combate à fome e à pobreza e a taxação de super-ricos.
O evento recebe políticos importantes como o presidente americano Joe Biden, o chinês Xi Jinping e o argentino Javier Milei. Com a presença de mais de 3 mil jornalistas de 80 países, a imprensa mundial volta seus olhares para o Rio, em busca de captar os embates que vão definir o futuro da governança global.
G20 discute combate à pobreza
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inaugurou os trabalhos com sua principal bandeira, que é histórica – o enfrentamento da fome e pobreza. Ele propôs a criação de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e defendeu que a escassez de alimentos não é natural, mas resultado de decisões políticas que não enxerga os mais vulneráveis no mundo.
Com base em sua experiência no Brasil — onde o programa Fome Zero, implementado durante seu primeiro mandato, retirou o país do mapa da fome em 2014 —, Lula destacou a necessidade de ações globais para enfrentar o problema. Dados da ONU revelam que, em 2023, mais de 700 milhões de pessoas enfrentavam insegurança alimentar severa no mundo. Para Lula, é inadmissível que ainda hoje países ricos ignorem a situação e não atuem para mitigar este problema.
Apesar de 82 países já terem aderido à iniciativa – a expectativa é que chegue a 100, o presidente argentino Javier Milei tem tido uma postura polêmica durante o evento. Inicialmente resistiu, provocando críticas em meio à alarmante taxa de pobreza em seu país, que afeta 50% da população. Mas, pressionado pela opinião pública, Milei voltou atrás e confirmou sua adesão.
“A fome é uma vergonha moral e uma falha política. Não podemos ignorar a responsabilidade coletiva de mudar essa realidade”, afirmou Lula, defendendo que a meta da aliança é alcançar 500 milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade até 2030.
Taxação dos super-ricos
Outro tema que incendiou os debates foi a proposta de taxação de super-ricos, mencionada pela primeira vez, na história, no documento final do G20. A medida prevê uma taxa de 2% sobre grandes fortunas, com a estimativa de arrecadar 250 bilhões de dólares. Esses recursos seriam destinados a ações climáticas e sociais, promovendo maior justiça econômica pelo mundo.
Embora a proposta tenha recebido apoio de diversos países, incluindo o Brasil, foi alvo de críticas ferrenhas de Milei. O argentino se opôs, alinhando-se à postura do recém-eleito presidente americano Donald Trump, que defende cortes de impostos para os mais ricos. Se a proposta avança, Trump, que é bilionário, será um dos primeiros impactados pelo projeto.
Assim, no G20, Milei tem refletido sua visão libertária, que rejeita a intervenção estatal na economia e articula pelos interesses do seu colega americano. Em setembro, ele já havia criticado o presidente espanhol Pedro Sánchez por defender tributos progressivos. “O socialismo é uma aberração da alma, uma combinação de inveja e ignorância econômica”, disparou Milei em uma rede social, deixando clara sua oposição à redistribuição de riqueza.
Apesar disso, a Argentina havia concordado anteriormente com uma declaração sobre o tema durante a reunião de Ministros de Finanças do G20, realizada em julho.
Tensões
Além das questões econômicas, o encontro revelou tensões entre os líderes. O encontro frio entre Lula e Milei repercutiu em todo o mundo. Nenhum dos dois esboçou qualquer reação ao se encontrar no início da cúpula – nenhum sorriso ou cordialidade nos cumprimentos, simbolismo que reforça a polarização entre a direita e esquerda pelo mundo. No entanto, isso contrasta com o tom colaborativo buscado por outros chefes de Estado, como o americano Joe Biden e o francês, Emmanuel Macron – estes esbanjaram sorrisos ao lado do brasileiro.
Mas, categoricamente, uma coisa pode ser dita: Lula promove uma agenda de justiça social e climática, enquanto Milei reforça uma visão de mercado livre e mínima intervenção estatal, criando atritos que podem dificultar a formação de consensos.
A proposta de taxação, que visa redistribuir riqueza em escala global, também expõe um dilema central: como equilibrar justiça social e crescimento econômico? Para muitos, o G20 é uma plataforma fundamental para debater esses temas, no entanto, a falta de unidade ameaça comprometer os resultados práticos.
Mas há o que celebrar: pela primeira vez, os olhares dos poderosos estão voltados para a pobreza que assola milhares de pessoas. Se as propostas do presidente Lula avançarem, será uma grande vitória para o Brasil que ficará reconhecido como a nação que lançou luz ao problema. Mas, de qualquer forma, já deixou seu legado à frente do G20: a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza no mundo.