Reclamações cotidianas podem prejudicar o cérebro e a saúde mental
Hábito comum no dia a dia de muitas pessoas, reclamar o tempo todo pode impactar a saúde emocional e física
Quem nunca começou uma conversa reclamando do trânsito ou do calor? Essa prática, tão comum, vai além de um hábito social inofensivo e pode trazer impactos à saúde mental e emocional, principalmente quando se torna uma constante. Segundo María J. García-Rubio, professora da Universidade Internacional de Valência (Espanha), a prática de reclamar constantemente, embora pareça inofensiva, pode ter efeitos negativos profundos na saúde mental, emocional e até física.
Reclamar ocasionalmente faz parte da experiência humana. É um mecanismo usado para aliviar tensões, compartilhar frustrações ou buscar empatia. Contudo, o problema começa quando esse hábito se torna crônico, estendendo-se a diversas áreas da vida, como o trabalho, o trânsito, o clima ou questões econômicas.
O estudo realizado por García indica que o ato constante de se queixar pode gerar alterações estruturais no cérebro, comprometendo habilidades cognitivas essenciais, como a resolução de problemas, o planejamento e a tomada de decisões. Esse ciclo acaba criando um ambiente propício para mais frustrações e insatisfações, alimentando um padrão difícil de ser interrompido.
O impacto desse comportamento não se restringe ao cérebro. Pessoas queixosas frequentemente apresentam sinais de ansiedade e depressão, além de sintomas físicos como fadiga, cansaço mental e até baixa imunidade.
A repetição constante de pensamentos negativos também afeta a autoestima e reduz a capacidade de resiliência diante de adversidades. Assim, aquilo que parecia ser apenas uma prática rotineira pode evoluir para um problema maior, que afeta tanto o indivíduo quanto aqueles ao seu redor.
Redes sociais e o aumento das queixas
As redes sociais intensificaram ainda mais esse cenário. O ambiente digital, com seu alcance e anonimato, tornou-se um palco ideal para reclamações de todos os tipos. Muitas pessoas, incluindo influenciadores digitais, utilizam as queixas como estratégia para atrair atenção ou engajar seguidores.
No entanto, isso contribui para a criação de um ambiente virtual carregado de negatividade, que pode amplificar os efeitos nocivos da reclamação tanto para quem produz quanto para quem consome esse conteúdo. O ciclo de críticas e insatisfações na internet reforça padrões comportamentais que extrapolam o ambiente digital e se refletem na vida cotidiana.
Mas por que reclamamos tanto?
O estudo aponta que, em muitos casos, o hábito de reclamar funciona como um mecanismo de enfrentamento. Ao vocalizar insatisfações, buscamos aliviar tensões ou encontrar validação para nossos sentimentos e opiniões. No entanto, essa prática também pode se transformar em um “loop” de negatividade, no qual o indivíduo se acostuma a enxergar o mundo por uma perspectiva pessimista, dificultando a identificação de soluções e momentos positivos.
Como interromper o ciclo da reclamação
Para María J. García-Rubio, algumas estratégias podem ajudar a reduzir o impacto negativo desse hábito, como praticar a gratidão. Concentrar-se no momento presente e valorizar aquilo que já se possui pode ajudar a mudar o foco da insatisfação para o reconhecimento. Registrar, por exemplo, aspectos positivos do dia em um diário é uma técnica simples, mas eficaz, para promover essa mudança de perspectiva. Outra abordagem envolve a busca ativa por soluções. Diante de um problema, fazer uma lista de possíveis ações para enfrentá-lo pode reduzir a sensação de impotência e gerar uma sensação de controle, aliviando parte da frustração.
Além disso, prestar atenção à linguagem utilizada no dia a dia é crucial. A psiconeurolinguística sugere que modificar palavras negativas para termos mais neutros ou positivos pode reprogramar padrões de pensamento, ajudando a reduzir a tendência a reclamar. Também é importante estabelecer limites com os outros, especialmente em conversas que tendem a ser excessivamente negativas. Sugerir enfoques construtivos ou, em alguns casos, evitar interações focadas apenas em reclamações pode proteger o bem-estar emocional.
Embora reclamar seja parte natural do comportamento humano, entender os impactos dessa prática e adotar estratégias para reduzir sua frequência pode trazer benefícios significativos para a qualidade de vida. A consciência desse hábito e o esforço para transformá-lo não são apenas formas de melhorar a saúde mental, mas também um passo importante para fortalecer relações pessoais e profissionais.
Afinal, uma abordagem mais positiva diante dos desafios pode abrir espaço para novas oportunidades, mais resiliência e maior satisfação pessoal.
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