Comurg investiga 60 pagamentos de supersalários que ultrapassam mais de R$ 800 mil
A suspeita é que esses pagamentos beneficiaram pessoas ligadas ao grupo político que controlava a estatal na gestão anterior
A Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) identificou 60 ações extrajudiciais suspeitas de superfaturamento e pagamento acelerado a empregados que reivindicavam gratificações retroativas. Entre os casos analisados, há valores de R$ 100 mil, quatro de R$ 250 mil, um de R$ 336 mil, um de R$ 662 mil e outro que ultrapassa R$ 800 mil.
A suspeita é que esses pagamentos beneficiaram pessoas ligadas ao grupo político que controlava a estatal na gestão anterior.
Diante das irregularidades, a nova administração afastou preventivamente o advogado Márcio Antunes Porfírio, então chefe da assessoria jurídica da estatal, e exonerou o diretor administrativo-financeiro Adriano Renato Gouveia. Porfírio era responsável pelo respaldo jurídico dos acordos, enquanto Gouveia aprovava os pagamentos.
Entre os beneficiados está Edimar Ferreira da Silva, sogro do ex-presidente da Comurg, Alisson Borges. Em 8 de julho de 2024, a assessoria jurídica da companhia autorizou o pagamento de R$ 336 mil a Edimar em uma única parcela, com vencimento até o dia 30 do mesmo mês. Ele trabalha na estatal desde 2006, já ocupou cargos de direção e, em outubro de 2023, foi nomeado vice-presidente pelo então prefeito Rogério Cruz (SD). O cargo foi extinto pela nova gestão.
Para apurar as possíveis fraudes, uma força-tarefa foi criada dentro da Comurg. O grupo enfrenta dificuldades, pois os documentos não estão organizados nem digitalizados, o que impede um levantamento preciso do número total de acordos feitos.
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As ações extrajudiciais chamaram atenção pela rapidez no processo de pagamento. Em alguns casos, o intervalo entre a solicitação e o depósito foi de apenas três dias. Outro ponto que gerou desconfiança foi a semelhança nos textos dos pedidos, sempre analisados pelas mesmas pessoas e envolvendo dois tipos principais de reivindicações: gratificações não pagas a ocupantes de cargos de chefia e diferenças salariais de funcionários que exerceram funções de liderança.
A investigação apura se os beneficiados realmente ocuparam cargos de comando. Há indícios de que diversas funções comissionadas foram criadas apenas para conceder gratificações a aliados da antiga administração. Além disso, os valores pagos extrajudicialmente seriam muito superiores aos que os servidores receberiam caso buscassem seus direitos na Justiça.
Outra linha de investigação analisa se os acordos foram usados para driblar a ordem cronológica de pagamento de precatórios. A atual gestão argumenta que o correto seria os empregados entrarem na fila de pagamento do Judiciário, sem recorrer a acordos administrativos.
Ex-servidores da gestão anterior alegam que os pagamentos tinham respaldo legal e eram necessários para evitar novas ações judiciais, pois durante o mandato do ex-prefeito Iris Rezende (2017-2020), as gratificações foram suspensas e só voltaram a ser pagas em 2021, já na administração de Rogério Cruz. Porém, há relatos de funcionários que não conseguiram receber os valores retroativos, o que levanta dúvidas sobre critérios adotados para as liberações financeiras.
Além das gratificações investigadas, a força-tarefa também encontrou outros pedidos administrativos de pagamentos, como ressarcimentos, auxílio-funeral e indenizações por danos. No entanto, os valores mais altos envolvem as ações trabalhistas, o que reforça a suspeita de irregularidades.
A Comurg afirmou, por meio de nota, que afastou preventivamente o servidor citado nas denúncias sobre pagamentos irregulares e que a corregedoria interna acompanha o caso. O afastamento será de 60 dias e, caso sejam confirmadas irregularidades, novas medidas serão adotadas. A companhia garantiu que todo o material coletado será enviado ao Ministério Público para investigação.
A nomeação do coronel da Polícia Militar Giuliano de Eustáquio Borges para a corregedoria da Comurg foi confirmada no último fim de semana. Ele é o quinto coronel e o sexto oficial a ocupar um cargo na cúpula da estatal desde a mudança na administração.
Enquanto a investigação avança, a atual gestão busca identificar funcionários remanescentes da antiga administração que ainda ocupam cargos estratégicos e podem estar interferindo nos trabalhos internos, especialmente nos setores responsáveis pelos pagamentos.
O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) acompanha o caso e já se prepara para ouvir depoimentos. Nos últimos meses, a Comurg esteve no centro de polêmicas envolvendo os chamados supersalários, com valores superiores ao recebido pelo prefeito de Goiânia. Agora, as ações extrajudiciais elevam as suspeitas sobre o uso dos recursos da estatal.