Mulheres que ganham mais que os maridos enfrentam maior tensão conjugal, aponta estudo
Pesquisa revela que casais em que esposas são as principais provedoras sofrem com estigmas sociais e insatisfação relacional
Enquanto avança a presença feminina como principal fonte de renda nos lares, a equação financeira do casamento ainda parece não ter superado os estigmas de gênero. Um novo estudo internacional indica que casamentos heterossexuais em que a mulher ganha mais que o marido enfrentam maior tensão emocional e risco de ruptura.
Segundo os dados, homens que recebem menos que suas esposas tendem a relatar níveis mais baixos de satisfação no relacionamento e sensações de inadequação, o que afeta diretamente sua percepção de masculinidade. As conclusões estão em artigo publicado na revista científica Sex Roles, voltada a estudos sobre gênero.
A pesquisa envolveu mais de 2.000 entrevistas e análises de conteúdo em mídia impressa. Em um dos experimentos, casais fictícios foram apresentados a participantes com apenas uma diferença: em um grupo, o homem ganhava mais; em outro, a mulher era a provedora principal. Quando informados de que a mulher possuía renda superior, os entrevistados classificaram o relacionamento como menos estável e mais propenso ao divórcio.
A percepção também afeta a vivência dos próprios casais. As mulheres provedoras expressam desconforto ao romperem com o papel tradicional de cuidadoras, embora esse impacto seja menos acentuado que o relatado por seus parceiros. Para os homens, o abalo na identidade social é mais evidente.
A análise de 94 reportagens sobre casais com mulheres provedoras mostra que a mídia frequentemente enquadra essas relações como excepcionais ou problemáticas. Homens nessas situações costumam ser descritos como “menos masculinos”, enquanto as mulheres são tratadas como transgressoras da ordem tradicional.
Apesar disso, dados mostram um movimento crescente. No Brasil, mulheres sustentam sozinhas 49,1% dos lares, segundo dados de 2022 — em 2012, o índice era de 38,7%. No Reino Unido, uma em cada três mulheres já ganha mais que o marido. Nos EUA, o percentual está entre 31% e 37%.
A desigualdade salarial, porém, persiste: no Brasil, elas ganham em média 20,9% a menos que os homens, segundo o Ministério do Trabalho. Nos Estados Unidos, a proporção é de 82,7 centavos por cada dólar ganho por eles.
Especialistas apontam que o modelo do “homem provedor” é historicamente recente. Em sociedades de caçadores-coletores, mulheres desempenhavam papel igual ou superior na provisão de alimentos. Pesquisas indicam que a coleta — liderada por mulheres — era a principal fonte de subsistência desses grupos. No período neolítico, elas tiveram protagonismo na agricultura. Ainda assim, o estereótipo persiste.
A expectativa de que homens sejam os principais provedores continua influenciando tanto as dinâmicas conjugais quanto a forma como a sociedade enxerga os casais. A tendência é que, à medida que as mulheres avancem na equiparação salarial, mais casamentos desafiem esse modelo — e o confronto entre realidade econômica e normas sociais se torne ainda mais visível.