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sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
indústria da moda

Chile vira destino global do lixo têxtil e acumula montanhas de roupas no deserto

Descarte de peças usadas no Atacama expõe crise ambiental provocada pelo fast fashion e desafia políticas de reciclagem

Luana Avelarpor Luana Avelar em 27 de junho de 2025
Foto: Nicolás Vargas
Foto: Nicolás Vargas

No norte do Chile, o deserto do Atacama abriga um dos maiores cemitérios de roupas usadas do mundo. Em meio ao solo árido, montanhas de peças descartadas — muitas ainda com etiquetas — formam um cenário que revela o impacto invisível da indústria da moda. O país, maior importador de roupas de segunda mão da América do Sul, recebe toneladas de peças anualmente, a maioria proveniente de doações e excedentes dos Estados Unidos e da Europa.

Cerca de 60% desse volume é considerado lixo têxtil, sem condições de revenda. As peças que não se encaixam nos padrões de reutilização acabam descartadas em terrenos clandestinos, especialmente em localidades como Alto Hospicio, próxima ao porto de Iquique. A seleção é feita por empresas locais, que dividem as peças em categorias e distribuem as melhores em brechós e comércios populares. O restante segue para lixões improvisados.

O problema se agrava devido à composição sintética da maioria das roupas. Tecidos como o poliéster, amplamente utilizado pela indústria de fast fashion, podem levar até dois séculos para se decompor. Com o tempo, fragmentam-se em microplásticos que contaminam o solo e se dispersam pelo ar, agravando os riscos à saúde pública e à biodiversidade local.

Incêndios frequentes nos depósitos ilegais pioram o quadro. A queima irregular libera fumaça tóxica, afetando a qualidade do ar e expondo comunidades a doenças respiratórias. Em regiões sem infraestrutura adequada para fiscalização ambiental, a prática se repete sem controle.

Autoridades chilenas discutem medidas para conter o avanço do problema, como a inclusão das roupas usadas nas leis de responsabilidade estendida do produtor. No entanto, a falta de orçamento e a ausência de logística para reciclagem efetiva dificultam a aplicação de políticas públicas mais rígidas.

O avanço da crise ambiental no Atacama escancara as consequências do consumo acelerado e da descaracterização do ato de doar. Muitos itens enviados como doação são, na prática, resíduos industriais. Sem condições de reciclagem no país de origem, acabam redirecionados para o Sul global, transformando o Chile em destino final de um fluxo de lixo disfarçado de solidariedade.

Enquanto não há soluções efetivas, o deserto segue acumulando restos de uma cadeia de consumo que produz mais do que o planeta pode suportar.

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