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sexta-feira, 5 de dezembro de 2025
Projeto de lei

A beleza não pode mais ser sustentada à custa do sofrimento

Projeto de lei aprovado pela Câmara aguarda sanção de Lula até 31 de julho. Nova legislação prevê multas para empresas que venderem produtos testados em animais

Luana Avelarpor Luana Avelar em 25 de julho de 2025
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Foto: Divulgação

O Brasil pode estar prestes a virar a página sobre uma das práticas mais controversas da indústria cosmética. O Projeto de Lei nº 3.062, de 2022, que proíbe testes em animais para a produção e comercialização de cosméticos, foi aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 9 de julho e agora aguarda a sanção presidencial. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem até o dia 31 deste mês para decidir se transforma a proposta em lei. Caso assine, o país passará a integrar um grupo de mais de 40 nações que já baniram esse tipo de experimento.

A iniciativa legislativa chega para preencher uma lacuna deixada pela Resolução Normativa nº 58, do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea), publicada em 2023. O texto da resolução proibia testes em animais quando já existirem métodos alternativos validados, mas não estabelecia punições para empresas que descumprissem a diretriz. Com a nova lei, essa brecha deve ser fechada com a previsão de sanções concretas: empresas que fabricarem ou venderem cosméticos testados em animais – mesmo que os testes tenham sido feitos no exterior, estarão sujeitas a multas.

O projeto aprovado altera a Lei nº 11.794/2008, que regulamenta a utilização de animais em atividades científicas no país. A nova norma vai além do uso em laboratórios nacionais. Ela prevê a responsabilização de marcas que importam produtos com histórico de testes em animais, o que pressiona empresas multinacionais a se adequarem aos padrões brasileiros. Segundo o texto, estarão proibidos tanto os testes de ingredientes quanto os de produtos acabados.

Na prática, a proposta é um reflexo de mudanças culturais e de mercado que vêm ganhando força nas últimas décadas. A demanda por cosméticos éticos, veganos e cruelty-free (livres de crueldade animal) cresceu junto com o movimento de consumo sustentável. De acordo com estudo publicado em 2015 pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds), a maioria dos brasileiros já demonstrava preferência por comprar menos, mas com mais qualidade e responsabilidade socioambiental. Essa tendência se intensificou nos anos seguintes, especialmente entre jovens consumidores urbanos.

A busca por alternativas aos testes em animais, por sua vez, também avançou em laboratórios e centros de pesquisa. Entre os métodos substitutivos mais utilizados estão os tecidos sintéticos que simulam a pele humana, culturas de células em 3D e sistemas computacionais de modelagem toxicológica. Em países como Alemanha, Reino Unido e Holanda, essas soluções já substituem completamente os testes em animais na indústria de higiene pessoal e perfumaria.

No Brasil, instituições como o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), a Fiocruz e universidades públicas têm investido no desenvolvimento de técnicas alternativas. Apesar dos avanços, especialistas alertam para a necessidade de ampliar o financiamento e a validação regulatória desses métodos, para que possam ser aplicados em larga escala por empresas de diferentes portes.

A sanção do projeto também toca em debates éticos mais amplos. Por trás da aparência limpa e suave de um shampoo ou batom, escondem-se muitas vezes práticas que envolvem sofrimento animal prolongado. Cegueiras induzidas, intoxicações e até mortes são efeitos colaterais de procedimentos feitos em coelhos, camundongos e porquinhos-da-índia. Organizações como a Humane Society International e o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, que participaram da articulação do PL, argumentam que tais métodos são não apenas cruéis, mas ultrapassados.

Caso Lula sancione a lei, o Brasil se juntará a países como Índia, Austrália, Colômbia e todos os membros da União Europeia, que já baniram testes cosméticos em animais. Também sinalizará para o mercado global uma posição mais clara sobre o compromisso com o bem-estar animal e a sustentabilidade. O desafio seguinte será garantir a efetividade da norma, a fiscalização do comércio e a educação do consumidor.

Num mercado em que imagem e reputação carregam tanto peso quanto a fórmula do produto, a transparência deixou de ser um diferencial simbólico e passou a integrar as exigências regulatórias e comerciais. Embora nem todos os consumidores priorizem critérios éticos ao consumir, cresce o número daqueles que demonstram interesse por práticas sustentáveis, produção responsável e respeito ao bem-estar animal. Nesse contexto, adaptar-se às novas normas pode representar, para muitas empresas, não apenas o cumprimento de uma obrigação legal, mas também uma estratégia de alinhamento com um perfil de consumo cada vez mais atento ao impacto moral e ambiental dos bens que adquire.

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