Jornada 4×3 vai quebrar empresas, causar desemprego e atrasar o País
Reduzir horas trabalhadas mantendo o salário é o sonho de quem paga e de quem recebe, mas existe a realidade
Nilson Gomes-Carneiro
O Congresso Nacional vai votar uma proposta de emenda à Constituição apresentada em fevereiro deste ano pela deputada federal Erika Hilton (PSol-SP) para modificar a jornada de trabalho no Brasil. É a PEC 8/2025, que limita em 36 por semana o número de horas de serviço do empregado e adota o sistema 4×3. Atualmente, são 44 e 6×1. O projeto triplica o número de dias de descanso. Agora, o funcionário tem direito a no mínimo um dia de descanso a cada sete no batente. Não está previsto de onde vão sair os recursos para suprir os 2/3 a mais de folga.
É originária da França (leia texto nesta página) a experiência elogiada pelos defensores da ideia, que vão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu vice Geraldo Alckmin às centrais sindicais e uma profusão de representantes classistas. Não está na exposição de motivos da PEC o efeito de mudança tão drástica. Quanto menor o empreendimento, maior será o prejuízo. Quanto mais pobre o trabalhador, maior a possibilidade de ficar sem emprego. São diversos os motivos, da queda na competitividade dos produtos brasileiros no exterior ao tombo na arrecadação de impostos.
300% a mais de descanso
É um sonho para patrões e empregados trabalhar menos sem reduzir a produção nem os salários. O problema é a tal da matemática financeira que mostra a rigidez da realidade. A tecnologia se aprimora a cada segundo não para substituir as pessoas em seus afazeres, mas para que elas se aprimorem em tudo o que executam. Umas profissões acabam, outras surgem, a economia absorve as modificações e o mundo evolui. É diferente de, numa canetada, aumentar em 300% os dias de descanso.
O brasileiro, por vocação, não deseja ficar parado dentro de casa durante quase metade da semana, toda semana, o ano inteiro, todo ano. Uma consequência da redução da jornada é que o brasileiro vai fazer o que já se discute na internet, aumentar o número de atividades. Existe uma frase que, de tão famosa, se tornou lugar-comum: para subir na vida, é preciso ter no mínimo três fontes de renda. A PEC anda na contramão de um lugar incomum, o bom senso. Se para crescer é vital triplicar os negócios, por que a solução vinda do Legislativo, com apoio de Executivo e Judiciário, é exatamente o oposto, numa canetada, aumentar em 300% os dias de descanso?
Deve incrementar bastante a abertura de vagas em no mínimo uma categoria, a de ilusionistas, pois é preciso mágica para remunerar mais cada hora trabalhada sem acrescentar o custo à mercadoria ou ao serviço prestado. Os argumentos são diversos e um dos favoráveis à PEC é que as famílias serão muito mais felizes com as pessoas em casa durante a maior parte da vida economicamente ativa. Na pandemia, gente demais o dia inteiro dentro do lar resultou em separação de casais, doença mental, obesidade e outras heranças ruins.
Caso o tempo diminuído na lida seja reprogramado para ir ao cinema, viajar, frequentar parques, ler livros, bater perna nos shoppings, comer em restaurantes, entrarão em cena os mágicos lembrando que os rendimentos mensais podem até não cair proporcionalmente ao número de horas, mas é certo que não vão subir. Numa canetada, o eventual beneficiário foi presenteado com aumento de 300% de dias de descanso, mas foi de 0% o acréscimo no contracheque. Não tem mágica que dê jeito em ingresso de cinema, passagens aéreas e terrestres, lanchinho nos parques, exemplares nas livrarias e nos sebos, praça de alimentação dos shoppings, refeições em restaurantes.
França sofre com trabalho a menos
Patrick Martin, presidente do Movimento das Empresas da França, maior entidade representativa daquele país, escreveu nesta semana em “O Globo” o artigo “Redução da jornada é erro”. Em resumo, “na prática, o que aconteceu depois que a medida foi implementada?”.
1) “O custo por hora trabalhada aumentou 10% (pagavam 35 horas como se fosse 39, a duração legal anterior)”. Deve ocorrer o mesmo no Brasil, com índice ainda maior.
2) “A produção caiu proporcionalmente.” A brasileira só é acima da média no campo, pois a agropecuária esbanja tecnologia. Portanto, será um estrago.
3) “O Estado precisou ajudar as empresas”. Atualmente, a ajuda na França é de 20 bilhões de euros por ano ou R$ 130 bilhões e 800 milhões de reais. É o que falta prever na PEC: quem vai pagar a conta? A iniciativa privada não está querendo isso, então, a dívida não é dela. E o governo não tem nem 1 mísero centavo para essa invenção.
4) Desorganizou empresas.
5) Degradou os serviços de saúde.
6) A indústria, o comércio, os serviços e a construção civil perderam eficiência e autonomia.
7) Desequilibrou a balança comercial.
8) A competitividade caiu.
9) Perdeu mercado internacional.
10) Intensificou-se a desindustrialização.
11) Adivinhe quem mais perdeu? “Os mais afetados foram justamente os trabalhadores, principalmente os mais pobres”.
12) “Com jornada reduzida e custo maior, as empresas pressionaram por produtividade onde ela era limitada, gerando mais cobrança sobre os trabalhadores, escalas otimizadas com menos pausas, tarefas múltiplas e horários inflexíveis”.
13) Adotar jornada menor, como a semana de quatro dias, “não é só risco econômico: é renunciar ao crescimento, emprego, poder de compra e financiamento de seguro social”.
14) Ele pergunta: “Qual a lição?”. E responde: “É perigoso contar com ganhos de produtividade antes de gerá-los. A França perdeu essa aposta e ainda busca uma saída”.
Governo se esforçar para implantar a jornada 0x7
Um órgão oficial, o IBGE, estarreceu o Brasil no mês passado ao confirmar que em 12 Estados o número de pessoas no Bolsa Família é maior que com carteira assinada. Os números seriam ainda mais apavorantes se o apanhado incluísse os demais programas, como o Benefício de Prestação Continuada, a aposentadoria a quem não contribuiu para a previdência e a recém-implantada gratuidade de energia elétrica para 60 milhões de inscritos. E ainda há os projetos sociais de governadores, prefeitos e líderes religiosos. É um esforço conjunto para a jornada de zero dia trabalhado a cada sete sem fazer nada.
Ao longo do tempo, as novas gerações vão se convencendo de que o certo mesmo é ficar à toa. O mesmo IBGE informa que 10 milhões e 300 mil jovens (de 15 a 29 anos) não estudam nem trabalham. Empreender, aprender uma profissão, ir atrás de emprego e outras tentativas de melhorar de vida são desestimuladas pelo péssimo exemplo das pessoas que nada precisam fazer para sobreviver. Para elas, a deputada Erika Hilton exagerou no número de dias, não nos de folga, mas nos de serviço.
Fã de Hitler fez a CLT e ditador militar criou o FGTS
Quando estimulou o projeto da Consolidação das Leis do Trabalho, o então presidente Getúlio Vargas estava em sua fase de maior fanatismo por Benito Mussolini, o déspota da Itália, e Adolf Hitler, o monstro da Alemanha. Vargas queria aderir a seus ídolos, fez todos os preparativos para o Brasil lutar ao lado do Eixo, que incluía ainda o Japão. As circunstâncias da guerra impuseram a adesão aos Aliados, grupo de Estados Unidos, Inglaterra e Rússia. A França, que agora posa de libertária, estava sob controle dos nazistas, aos quais se rende quase sem lutar.
Eis o cenário em que um facínora, chefe do regime de exceção Estado Novo, criou mecanismos de domínio das massas pelo populismo. Cada artigo da CLT foi pensado para paralisar as reivindicações por democracia, como ensinou Mussolini. Assim, se universalizou um mês de férias a cada 11 de trabalho. Depois, vieram os 30% a mais, para comprovar que o Brasil premia a sonolência, pois no mês em que está parado o sujeito aumenta os ganhos. E foram acrescentando direitos na CLT e outras leis, mesmo depois da morte de Getúlio, como o 13º salário assinado por João Goulart. A pessoa trabalha 11 meses de semanas de 4 dias e recebe 13 salários + 1/3.
O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, o FGTS, é obra de outra ditadura, a dos generais. Ou marechal, pois quem promulgou a Lei 5.107 foi Humberto Castelo Branco. Os seguidos diplomas legais conseguiram uma proeza: em um hipotético salário de R$ 8 mil por mês, o patrão paga R$ 15 mil e o trabalhador recebe R$ 5 mil.