Governo anuncia novo modelo de crédito imobiliário para ampliar acesso à habitação
Nova regra reformula uso da poupança, reduz depósitos compulsórios e aumenta teto do SFH para R$ 2,25 milhões, com foco na classe média
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, nesta sexta-feira (10), o novo modelo de crédito imobiliário do País, que reformula o uso dos recursos da poupança e elimina os depósitos compulsórios no Banco Central (BC). A medida busca aumentar a liquidez e ampliar o acesso ao financiamento habitacional, especialmente para a classe média. O anúncio foi feito durante o Incorpora 2025, evento do setor da construção civil realizado em São Paulo.
Crédito habitacional passa a ter novo modelo baseado na poupança
Após um período de transição, o total dos recursos depositados na caderneta de poupança passará a ser referência para uso no crédito habitacional, que substitui o modelo atual de direcionamento obrigatório. Com isso, o governo estima um aumento na capacidade de financiamento da Caixa Econômica Federal, que deve viabilizar mais 80 mil novas moradias até 2026.
Além disso, o teto do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) — que define o valor máximo dos imóveis financiáveis com juros controlados – subirá de R$ 1,5 milhão para R$ 2,25 milhões. A mudança amplia o alcance do programa para famílias da classe média, público que o governo busca atender desde o início do atual mandato.
Atualmente, famílias com renda de até R$ 12 mil mensais são atendidas pelo programa Minha Casa, Minha Vida com juros reduzidos. A nova política pretende preencher o espaço acima dessa faixa de renda, com oferta de condições mais previsíveis de crédito para o segmento intermediário.
Segundo o governo, a reforma moderniza o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) e visa maximizar a poupança como fonte de recursos. “Na medida em que mais valores são depositados em poupança, mais crédito será disponibilizado para financiamento imobiliário”, informou o Ministério da Fazenda, ao citar também o uso de instrumentos de mercado como Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs).
Especialista avalia impacto gradual do novo crédito imobiliário
O especialista em mercado imobiliário Daniel Claudino avalia que o novo modelo tende a ampliar a oferta de crédito, embora o impacto deva ser gradual.
“Menos travas na poupança e o mecanismo de matching aumentam a liquidez e reabrem caixas de crédito, com prazos mais longos e mais aprovações. Em cenário de juros altos, o primeiro ganho é de disponibilidade, não de redução imediata da taxa”, explica.
Para Claudino, a ampliação do teto do SFH cumpre papel duplo: “O novo limite evita expulsar famílias do SFH em cidades caras e amplia a elegibilidade da classe média. Na prática, facilita o acesso para parte dos compradores e atualiza o sistema ao patamar atual de preços dos imóveis”.
A iniciativa ocorre em um contexto de forte saída de recursos da poupança. Somente em 2023 e 2024, as retiradas líquidas somaram R$ 87,8 bilhões e R$ 15,5 bilhões, respectivamente. Em 2025, os resgates já superam R$ 78 bilhões. Parte desse movimento é explicada pela manutenção da Selic em patamar elevado, o que torna outros investimentos mais atrativos.
Claudino pondera que essa dinâmica pode limitar os efeitos do novo modelo. “Saques e juros altos reduzem a base barata de funding e pressionam spreads. O novo desenho ajuda ao flexibilizar regras e permitir captação casada ao crédito imobiliário, mas não neutraliza totalmente o problema enquanto o juro seguir elevado e a poupança continuar com resgates líquidos”, avalia.
Crédito habitacional ganha reforço com ajustes no FGTS
O especialista também destaca o papel do FGTS, que passa por ajustes nas regras de saque-aniversário e antecipações. “As alterações recentes limitam antecipações, introduzem carências e regras sobre a quantidade de operações, tornando o fluxo do FGTS mais previsível para habitação popular. Isso estabiliza o funding dessa ponta do mercado e complementa o reforço de liquidez via poupança, criando um corredor mais estável entre produção e compra”, explica.
A transição para o novo regime será gradual, com plena vigência prevista para janeiro de 2027. Até lá, continua a valer o direcionamento obrigatório de 65% dos depósitos da poupança para crédito habitacional. O volume dos compulsórios será reduzido de 20% para 15%, e 5% serão aplicados já sob as novas regras.
Mais concorrência no mercado de crédito imobiliário
Outra mudança relevante é a abertura para que instituições que não captam poupança também possam conceder crédito habitacional, ampliando a concorrência no setor. “Ao permitir que players sem poupança acessem instrumentos de funding ligados ao crédito imobiliário, entram novos ofertantes, inclusive digitais. Mais concorrência tende a pressionar spreads e melhorar as condições para o tomador”, completa Claudino.
Com a reforma, o governo aposta em um modelo mais dinâmico e competitivo de crédito imobiliário, capaz de sustentar o crescimento do setor da construção civil e atender a uma faixa de consumidores até então pouco contemplada pelas políticas públicas de habitação.