Morre D’Angelo, pioneiro do neo soul, aos 51 anos
Cantor transformou o R&B dos anos 1990 com fusão de soul, jazz e hip hop; artista lançou apenas três discos, mas deixou legado determinante para a música contemporânea
O músico norte-americano D’Angelo, nome central do neo soul e referência da música negra contemporânea, morreu na última terça-feira (14), aos 51 anos, em decorrência de um câncer de pâncreas. A informação foi confirmada por sua família à revista Variety.
“A estrela brilhante da nossa família apagou sua luz para nós nesta vida… Após uma batalha prolongada e corajosa contra o câncer, estamos com o coração partido em anunciar que Michael D’Angelo Archer foi chamado para casa”, diz a nota oficial.
Nascido em Richmond, na Virgínia, em 1974, D’Angelo aprendeu piano ainda criança em uma igreja batista, ambiente que moldou tanto seu fraseado quanto a densidade emocional de sua obra. Sua estreia fonográfica ocorreu em 1995, com Brown Sugar, álbum que uniu melodias de R&B à cadência do hip hop e elementos harmônicos do jazz. O disco foi saudado como um marco da música negra da década, colocando D’Angelo ao lado de nomes como Erykah Badu e Lauryn Hill no grupo de pioneiros de um gênero batizado de neo soul.
Cinco anos depois, em 2000, o cantor consolidaria sua posição com Voodoo, trabalho que lhe rendeu dois Grammys, incluindo o de Melhor Álbum de R&B. A obra, construída em estúdio com a presença de Questlove e Raphael Saadiq, tornou-se referência para uma geração de músicos e cimentou seu prestígio como criador exigente e de talento singular.
Entretanto, o sucesso trouxe consigo um isolamento crescente. O artista passou mais de uma década afastado da indústria fonográfica, marcado por batalhas pessoais com alcoolismo e dificuldades com a exposição midiática. Sua ausência só aumentou a mística em torno da figura de voz grave, timbre aveludado e presença enigmática.
O retorno ocorreu em 2014 com Black Messiah, álbum lançado de surpresa após os protestos de Ferguson, que estreou em quinto lugar na Billboard e ganhou o Grammy de Melhor Álbum de R&B. A obra foi celebrada como resposta política e estética a um país em convulsão racial. Suas letras, entre o lirismo amoroso e o comentário social, apontaram caminhos explorados depois por Beyoncé, em Lemonade (2016), e por Kendrick Lamar, em To Pimp a Butterfly (2015).
Ao todo, D’Angelo lançou três discos de inéditas, espaçados por intervalos longos. “Estou apenas começando”, disse em 2015 à Rolling Stone, numa rara entrevista em que prometia nova safra de composições. Em 2024, Raphael Saadiq reiterou que o músico trabalhava no sucessor de Black Messiah, acrescentando que “música boa envelhece bem”. O projeto, contudo, não se concretizou.
Mesmo com uma discografia enxuta, sua influência se impôs como fio condutor entre o soul clássico e a produção experimental do século 21. A habilidade ao piano, herdada da formação religiosa, e o fraseado rítmico ancorado no hip hop permitiram-lhe expandir fronteiras e converter a introspecção em estética sonora de alcance global.
D’Angelo venceu quatro Grammys ao longo da carreira e se tornou nome incontornável para compreender a evolução do R&B moderno. Sua obra é estudada como exemplo de conciliação entre tradição e ruptura, devoção e contestação, intimidade e política.
O cantor deixa dois filhos e uma filha. A mãe de seu primogênito, a também cantora Angie Stone, morreu em um acidente de carro no início deste ano.

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