Coluna Econômica
Banco Central assume a frente e dispara as primeiras medidas reais contra crise
Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 17 de março de 2020Enquanto
o superministro Paulo Guedes, que deveria comandar a economia, se debate entre
dilemas ideológicos e continua a demonstrar uma capacidade bastante limitada
para gerir a crise agravada agora pelo coronavírus (apelidado de Covid-19 pelos
cientistas), o Banco Central (BC) se move. Lenta e gradualmente, mas pelo menos
não parece imobilizado. Em reunião extraordinária realizada ontem, o Conselho
Monetário Nacional (CMN) aprovou duas medidas para tentar aliviar dificuldades
que empresas e famílias possam estar enfrentando desde que a pandemia passou a
paralisar os negócios em diversos setores e regiões do globo (Brasil incluído).
Diante
das incertezas ainda enormes em relação ao que ainda poderá acontecer e do
risco de que a pandemia demore semanas (ou meses) para ser contida, o Brasil
foi um dos últimos a tomar medidas preventivas na área econômica (que, a esta
altura, nem poderiam mais ser consideradas “preventivas” diante da demora da
equipe econômica para se mover). O imobilismo da área econômica do governo e as
manifestações de desprezo pela pandemia detonadas a partir do Palácio do
Planalto contrastam com as ações que o Ministério da Saúde vem tomando para
enfrentar o vírus e suas manifestações (no caso, manifestações virais, bem
entendido).
As
medidas anunciadas pelo BC, depois de sancionadas pelo CMN (conselho formado,
por sua vez, pela alta direção do mesmo BC), ficaram limitadas à área do
crédito e, ainda que possam contribuir para amenizar o peso das prestações de
empréstimos e financiamentos sobre os balanços das empresas e sobre o orçamento
das famílias, não trouxeram uma atuação mais forte sobre o custo do dinheiro.
A reação nos EUA
Os
mercados esperam que o BC, a exemplo de outros bancos centrais, atue de forma
igualmente extraordinária e anuncie em breve mais um corte nas taxas básicas de
juros. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (FED, o banco central deles)
voltou a reduzir os juros, que passaram a flutuar entre zero e 0,25% ao ano
desde domingo, 15, num corte de 1,25 pontos de porcentagem. Além disso, antecipou
ainda a decisão de recomprar algo como US$ 700 bilhões (algo como R$ 3,5
trilhões) em títulos do Tesouro e hipotecas em circulação no mercado, injetando
mais dinheiro no setor financeiro. O FED levou em conta em sua decisão a
ruptura de cadeias de suprimento de peças, acessórios, componentes eletrônicos
e outros insumos, com consequente paralisação de setores inteiros da indústria,
os impactos do vírus sobre a atividade econômica em vários países, incluindo os
EUA, e ainda o fato de a inflação por lá continuar navegando abaixo de 2,0% ao
ano, refletindo a debilidade recente demonstrada pela economia.
Balanço
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O
CMN autorizou os bancos a renegociar empréstimos e financiamentos concedidos a
pessoas jurídicas e físicas, desde que estejam pagando em dia suas dívidas
bancárias e disponham de “boa capacidade financeira”. A ideia é alongar os
prazos de vencimento daquelas operações de crédito e reduzir o valor das
parcelas, o que faria, em teoria, sobrar mais dinheiro para empresas e famílias
fazerem frente a despesas inesperadas causadas pelo ataque do coronavírus.
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Para
“estimular” o engajamento dos bancos, o BC dispensou o setor de constituir
“reservas” (provisionar recursos, no jargão financeiro) para se prevenir de
perdas que eventualmente possam ocorrer ao longo do prazo dos empréstimos e
financiamentos. Na prática, isso deixa mais dinheiro nos bancos, facilitando a
repactuação autorizada e mesmo a contratação de novas operações de crédito.
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Na
estimativa do CMN, segundo comunicado divulgado logo após a reunião, perto de
R$ 3,2 trilhões em créditos tomados pelas empresas e por pessoas físicas
poderão ser beneficiados pela medida. O conselho, no entanto, sequer toca na
questão do custo desse dinheiro (quer dizer, dos juros cobrados pelos bancos).
Sem uma redução mais expressiva dos juros, o efeito real da medida poderá ser
limitado.
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Numa
segunda providência, o CMN permitiu que os bancos utilizem um percentual maior
de seu capital para realizar novas operações de crédito. O sistema financeiro
terá uma folga de capital de R$ 56,0 bilhões, que servirão como lastro
(garantia) para novos empréstimos, que poderão atingir R$ 637,0 bilhões. Apenas
como referência, o valor corresponde a quase 32,0% do saldo das operações de
crédito livremente contratadas entre bancos, empresas e pessoas físicas.
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“Ambas
as medidas são proativas e facilitarão uma atuação contracíclica do Sistema
Financeiro Nacional, que ajudará as empresas e as famílias a enfrentar os
efeitos decorrentes do Covid-19”, anotou o CMN.
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Enquanto
o BC se movimenta, a equipe do ministro Guedes ainda debate se deve ou não
permitir que empresas adiem o pagamento de impostos federais por dois ou três
meses, desde que o imposto seja efetivamente recolhido ainda em 2020, para não
afetar a meta estabelecida para o déficit primário (receitas menos despesas,
excluídos os gastos com juros). A questão é que o neoliberalismo exacerbado do
ministro, que pretende instaurar o Estado mínimo no Brasil, impede a tomada
célere de decisões na área econômica, o que apenas agrava os problemas que o
vírus já vem causando.