Bioenergia da cana avança 7,1% até julho, mas setor perde espaço

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 20 de setembro de 2023

A energia gerada a partir da queima de palha e bagaço da cana pelas usinas experimentou crescimento de 7,14% na comparação entre os sete primeiros meses deste ano e idêntico período do ano passado, saindo de 9.113 para aproximadamente 9.763 megawatts/hora, num acréscimo de pouco mais de 651,0 MWh. O setor retoma o crescimento depois de dois anos de quedas, acompanhando a curva de crescimento da moagem de cana ao longo dos primeiros meses da safra 2023/24, iniciada em abril deste ano. Entre abril e 1º de setembro deste ano, as usinas instaladas na região Centro-Sul moeram um total de 406,645 milhões de toneladas de cana, em alta de 10,9% em relação a 366,690 milhões de toneladas moídas em igual intervalo do ano passado.

Entre 2020 e 2022, conforme dados levantados pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), com base em estatísticas da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), a energia gerada para o Sistema Integrado Nacional (SIN) pelas usinas de etanol e açúcar havia caído de 22.604 para 18.397 gigawatts/hora. A expectativa do setor sugere que a geração poderá retomar, neste ano, os níveis observados no início da década, quando as usinas chegaram a atingir o maior volume de energia colocada no sistema em sua série histórica, ou ao menos se aproximar daqueles números.

A despeito da retomada aparente, a geração de bioeletricidade de biomassa em geral, incluindo cana, licor negro (resíduo da produção de celulose e papel), biogás, lenha e outros resíduos da produção agrícola e de bens florestais, tem perdido espaço na geração de eletricidade. No ano passado, a fonte respondia por quase 4,4% de toda a energia fornecida ao sistema elétrico, mas teve sua participação reduzida para 3,9% em julho deste ano, atingindo em torno de 13.819 gigawatts/hora. Considerando a matriz elétrica brasileira, a participação da biomassa da cana pouco avançou, chegando mesmo a recuar entre 2020 e julho deste ano, baixando de alguma coisa em torno de 7,0% para 6,3%. A potência instalada no setor registrou elevação de apenas 4,0% no período, saindo de 11.952 para 12.431 MW, mas outras fontes, com destaque para a geração eólica e solar fotovoltaica, anotaram crescimento mais relevante no período.

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Transição energética

Segundo a Unica, em conjunto, o setor de biomassa somou uma capacidade total de 17.323 MW ao final de julho deste ano, correspondendo a 8,8% de toda a potência fiscalizada pela Aneel. Considerada isoladamente, a biomassa em geral ocupa a quarta posição na matriz elétrica, atrás das fontes hidráulica, que concentra 55,7% da potência total do sistema, com 109.836 MW; da eólica, com 13,7% do total (27.074 MW); e gás natural, que responde por 9,3% da capacidade, com potência instalada de 18.324 MW. As fontes renováveis contribuem, em grandes números, por 83,5% da potência do sistema, o que assegura ao País uma posição de partida já vantajosa nas iniciativas de transição energética em curso em todo o mundo. Mais claramente, em um ambiente de regulação desejável, com reconhecimento de suas externalidades ambientais, o avanço das fontes renováveis poderia acelerar o processo de transição, atraindo investimentos e gerando empregos.

Balanço

  • Ainda de acordo com a Unica, a venda de energia para a rede nacional pelas usinas de etanol e açúcar entre janeiro e julho deste ano correspondeu ao consumo de 5,0 milhões de residências, numa geração equivalente a 26,3% de toda a energia produzida pela usina de Belo Monte no ano passado, sem os impactos ambientais gerados ao longo dos meses de construção da hidrelétrica e durante sua operação.
  • Apenas para comparação, os 9.762 GWh gerados pelas usinas entre janeiro e julho deste ano, sempre de acordo com a Unica, seriam suficientes para atender a 20% do consumo de um país do tamanho de Portugal, com perto de 10,5 milhões de habitantes, durante um ano, equivalendo ainda a 14% da energia produzida por Itaipu em 2022.
  • De acordo com Zilmar Souza, gerente de bioeletricidade da Unica, conforme nota divulgada ontem pela entidade, “a cana – bagaço e palha – é a principal fonte de geração de energia elétrica com biomassa no País, representando 71% de toda energia gerada a partir de biomassa, num total de 13,8 milhões de MWh entre janeiro e julho deste ano”.
  • O cenário hostil enfrentado pelo setor na segunda metade da década passada, problemas climáticos enfrentados pelo setor nas últimas duas safras e, mais recentemente, a sobrecontratação de energia pelo mercado de distribuição têm afetado a disposição de investimento do setor, reduzindo, em consequência, o ritmo de crescimento da geração de bioeletricidade. Neste ano, a biomassa deverá responder pela instalação de 475 MW de capacidade nova, o que deverá representar 4,3% do aumento total de potência esperado para a matriz elétrica total, algo em torno de 10.730 MW adicionais. Para comparação, com 2009, quando a indústria experimentava franco crescimento, as usinas responderam por 32% de toda a capacidade nova instalada no sistema elétrico.
  • Entre 2023 e 2026, o segmento de biomassa deverá instalar 1.692 MW de capacidade nova, considerando “31 projetos de outorga que têm viabilidade alta ou média de entrada em operação comercial até lá”, acrescenta Souza. Aquele volume corresponderá, no entanto, a apenas 3,1% dos 54.658 MW que deverão ser implantados ao longo daqueles quatro anos. A tendência é de que o setor de biomassa mantenha uma participação em torno de 8% na matriz ou pouco menos do que isso.
  • Em torno de 90% do crescimento da capacidade deverão ser assegurados por fontes renováveis até 2026, com destaque para a solar, com participação de 62,8% (mais 34.330 MW), e eólica, que deverá receber 12.566 MW novos, contribuindo com 23,0% para o avanço da matriz.
  • Na visão de Souza, a biomassa representa “uma solução de energia sustentável e segura para a matriz elétrica, que esperamos seja cada vez mais bem-vinda e estimulada”, já que ajuda a reduzir emissões de gases do efeito estufa, reforça a segurança do sistema, já que não tem as características de intermitência das fontes solar e eólica, além de entrar na rede nos meses de baixa dos reservatórios, o que ajudaria a preservar sua capacidade.