Quinta-feira, 28 de março de 2024

Cenário para empresas de menor porte ainda preocupa, afirma Iedi

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 10 de julho de 2021

Se o ano que passou terminou não sendo tão negativo para as maiores companhias do País, o cenário para as empresas de menor porte ainda gera preocupação em função do maior endividamento assumido ao longo da pandemia e das possibilidades ainda minguadas de uma “recuperação forte e consistente”, avalia o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Além de participarem das cadeias produtivas de todos os setores na economia, acrescenta ele, as empresas menores, que operam nos setores de tecidos, confecções, calçados e alimentos, entre outros, são grandes empregadoras e estão distribuídas por todo o interior do País, com impactos importantes para as economias locais.

Por estes e outros motivos, as “cicatrizes” deixadas pela Covid-19 nos pequenos negócios, conforme descreve o economista, “continuam no radar”. Os programas especiais de crédito lançados durante a pandemia ajudaram parte das pequenas empresas a enfrentar a paralisação dos negócios e a consequente falta de liquidez, mas criaram passivos novos para aquele segmento, especialmente na área do comércio, que viu seu endividamento saltar quase 40,0% entre 2019 e 2020, saindo de R$ 45,365 bilhões para R$ 63,407 bilhões no levantamento realizado pelo Iedi. Comparado a 2018, a dívida bancária das empresas do comércio avançou perto de 73,0%.

“Justamente por isso seria necessário termos uma recuperação forte e consistente, com uma sequência de taxas mensais positivas e substanciais de crescimento para facilitar a digestão desses passivos”, avalia Cagnin. De acordo com ele, os aumentosno custo da tarifa de energia tendem de fato a desacelerar o consumo de eletricidade, dentro de certos limites. Mas o efeito dessas altas será “uma corrosão inesperada da demanda”, reforçada pelas altas já ocorridas dos combustíveis e do gás de cozinha. As altas de custos nesta área, observa Cagnin, deixam os orçamentos familiares ainda mais pressionados porque são despesas “difíceis de serem comprimidas”. E terminam “retirando dinamismo” da demanda geral e, portanto, da atividade econômica em seu conjunto.

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Dissonâncias

A questão é que o aumento das despesas com energia não é um ponto isolado no cenário econômico. Ele vem num momento de desemprego ainda muito elevado, perdas de renda para as famílias de trabalhadores e de elevação dos juros, com a atividade industrial ainda “andando de lado”. De um lado, as possibilidades de a economia “engrenar algum dinamismo”, sugere Cagnin, estão associadas à “redução das medidas restritivas” (adotadas no enfrentamento da pandemia), ao novo auxílio emergencial (que teve sua duração estendida até outubro) e ao esperado avanço da vacinação. De outro, as pressões de custos ainda persistem, com impactos sobre as receitas e as dívidas das empresas, que enfrentam dificuldades para repassar as altas para os preços finais.

Balanço

  • O Índice de Preços ao Produtor (IPP), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que acompanha a variação dos preços pagos pela indústria, acumulava alta de 35,86% nos 12 meses encerrados em maio deste ano, embora tenha apresentado certa desaceleração nos últimos meses, saindo de 4,63% em março para 1,0% em maio, comparado ao mês imediatamente anterior.
  • As complicações são evidentemente maiores para os negócios de menor porte, que estão não apenas diante de um endividamento mais elevado, refletindo as estratégias adotadas nos últimos meses para gerenciar a falta de liquidez e atender a compromissos inadiáveis, via maior contratação de créditos, mas igualmente encontram “muito pouco espaço para repassar adiante os aumentos de custos”.
  • As empresas menores que conseguirem sobreviver provavelmente terão que lidar com o problema do endividamento mais elevado num cenário de taxas de juros mais elevadas. “Se conseguirem rolar suas dívidas mais à frente, isso certamente ocorrerá num ambiente de juros mais altos”, reforça o economista do Iedi.
  • Ainda de acordo com Cagnin, seria relevante neste momento evitar que empresas antes saudáveis “acabem descarrilhando”, o que ajudaria a tirar fôlego de projetos de expansão de capacidade e poderia mesmo adiar a perspectiva de um novo ciclo de investimentos.
  • Num momento em que as principais economias globais – Estados Unidos, Japão, China e União Europeia – adotam programas ambiciosos de investimento para relançar a atividade econômica no curto prazo e assegurar um crescimento de longo prazo social e ambientalmente mais equilibrado e baseado em tecnologias na fronteira do conhecimento, o Brasil corre sério risco de ser deixado para trás.
  • “O mundo tem acelerado a transformação estrutural e tecnológica da economia, acumulando novas competências produtivas com foco na indústria 4.0 e, neste cenário, o País deveria costurar um programa econômico de curto prazo para acelerar o PIB (Produto Interno Bruto) e promover a transformação de sua estrutura produtiva em direção à sustentabilidade ambiental e à digitalização”, sustenta Cagnin.
  • Isso exigiria, entre outros pontos, um forte programa de investimentos em infraestrutura, pelo seu potencial para reduzir custos e alavancar a competitividade sistêmica na economia, e ainda uma política robusta de investimentos em pesquisa e desenvolvimento na fronteira tecnológica.
  • Retornando ao curto prazo, numa referência ao debate em torno das propostas de reforma tributária apresentadas (e seguidamente revisadas) pela equipe econômica, Cagnin observa ainda uma paralisia nas decisões de investimento pelas empresas. De uma forma geral, os investimentos estariam travados pela insegurança em relação à carga tributária futura. Mas, olhando a expectativa em relação ao investimento estrangeiro, o economista argumenta que a desvalorização do real frente ao dólar a partir de 2018 tornou mais baratos os ativos aqui dentro, o que poderá servir como atrativo a investidores de fora.