Déficit comercial da indústria atinge maior valor desde 2014

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 08 de setembro de 2022

O crescimento vigoroso das exportações, sustentado principalmente pela alta das commodities minerais e agrícolas, não foi suficiente para evitar mais um aumento no déficit comercial da indústria de transformação na primeira metade deste ano, segundo análise recente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Numa área central para as pretensões de desenvolvimento de qualquer economia, as importações continuam superando as exportações por uma diferença crescente, liquidando empresas e mercados, transferindo renda e empregos para fora do Brasil, além de esmorecer a capacidade do setor industrial brasileiro como um todo de produzir inovações e avanços tecnológicos.

Os dados computados pelo Iedi, ainda referentes aos seis primeiros meses deste ano, mostram um aumento de 12,5% no déficit comercial da indústria de transformação na comparação com o primeiro semestre do ano passado, elevando-se de US$ 24,410 bilhões para US$ 27,466 bilhões – o mais elevado para o período desde 2014, quando havia rondado a casa dos US$ 34,8 bilhões. O trabalho do instituto considera ainda o nível de intensidade tecnológica nos grandes setores da indústria de transformação, ou seja, o tamanho do investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação, segundo classificação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Sob aquele ponto de vista, o Iedi aponta duas tendências opostas a definir o desempenho da balança comercial do setor de transformação, com “deterioração dos grupos de maior intensidade e reforço do superávit dos grupos de menor intensidade tecnológica”. A combinação dessas variantes sugere um processo mais grave de perdas para setores que são mais intensivos em tecnologia, levando a um decréscimo da capacidade de agregar valor não apenas à balança comercial, mas à produção industrial em seu conjunto.

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Crescimento e distorção

A indústria conseguiu de fato ampliar suas vendas externas, num ritmo de crescimento até mais acelerado do que aquele verificado no primeiro semestre do ano passado, quando as exportações haviam avançado 22,1% em relação ao mesmo período de 2020, conforme observa o Iedi. A pandemia pode ter distorcido esse tipo de comparação, diante de seus impactos negativos sobre o comércio mundial. De toda forma, nos seis meses iniciais deste ano, a indústria brasileira de transformação exportou US$ 86,633 bilhões, correspondendo a um incremento de 32,46% em relação aos US$ 65,401 bilhões exportados em igual período de 2021. Mas esse avanço veio sustentado principalmente pela indústria de média-baixa intensidade tecnológica.

Balanço

  • As vendas externas de bens de média-baixa intensidade (têxteis e vestuário; couros, calçados e acessórios; celulose e papel; derivados de petróleo e biocombustíveis; móveis e produtos de madeira; alimentos e bebidas; e produtos de metal) cresceram 36,6% no primeiro semestre, passando de US$ 33,635 bilhões para US$ 45,957 bilhões.
  • A participação desse segmento nas exportações totais do setor de transformação industrial avançou de 51,4% para praticamente 53,1%. Mas a variação das vendas externas naquele setor contribuiu com 58,1% para o aumento das exportações totais da indústria. A liderança, na área de média-baixa tecnologia, ficou por conta das exportações de celulose, carnes, farelo de soja e óleos combustíveis.
  • Na mesma ordem, as vendas externas cresceram 21,9% (de US$ 3,150 bilhões para US$ 3,841 bilhões); 38,2% (de US$ 7,921 bilhões para US$ 10,948 bilhões); 45,7% (de US$ 3,770 bilhões para US$ 5,493 bilhões); e 92,6% (de US$ 3,261 bilhões para US$ 6,278 bilhões). Também neste último caso, considerando as vendas de óleos combustíveis, os volumes embarcados avançaram 14,37% diante de um salto de 69,3% nos preços médios lá fora.
  • As importações cresceram até em ritmo mais lento, avançando 27,0% no primeiro semestre, saindo de US$ 89,809 bilhões para US$ 119,098 bilhões. A questão é que a variação incide sobre uma base já mais elevada do que na ponta das exportações, o que explica o crescimento persistente do déficit no setor. Nesta área, no entanto, a principal influência veio do setor de média-alta, que elevou suas compras no exterior de US$ 44,065 bilhões para US$ 58,682 bilhões, numa alta de 33,17% (ou seja, mais US$ 14,617 bilhões, o que representou 60,18% do acréscimo anotado pelas importações totais da indústria).
  • Naquela categoria, as importações da indústria de fabricação de produtos químicos (com exclusão de produtos farmacêuticos) experimentaram elevação de 64,63%, saltando de US$ 19,788 bilhões para US$ 32,576 bilhões (mais US$ 12,788 bilhões).
  • O resultado final da balança comercial (exportações menos importações) por segmento mostra avanços de 28,3% e de 34,8% para o déficit nas indústrias de alta e média-alta intensidade tecnológica, com o rombo saindo de US$ 16,433 bilhões para US$ 21,091 bilhões no primeiro segmento e de US$ 28,573 bilhões para US$ 38,505 bilhões no segundo.
  • Como contraponto, o superávit da indústria de média-baixa intensidade cresceu 37,80%, de US$ 17,845 bilhões para US$ 24,590 bilhões. O aumento foi várias vezes mais forte no setor de média tecnologia, mas aqui os valores absolutos são mais modestos, com o saldo positivo saltando de US$ 2,751 bilhões para US$ 7,540 bilhões – um aumento de 174,08%.