Desemprego deve continuar alto até 2026, causando impactos políticos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 13 de outubro de 2021

A pandemia desabou sobre o Brasil e os brasileiros na sequência de uma recessão, entre 2014 e 2016, e três anos de crescimento irrelevante. Trouxe mais de 600,0 mil mortes, até aqui, e deixou ainda uma multidão de desempregados e de desassistidos de toda sorte, agravando o cenário de fome, miséria e desigualdades. No mercado de trabalho, o desemprego elevado veio acompanhado de uma precarização das condições de emprego, com avanço da informalidade, da subutilização dos trabalhadores dispostos a trabalhar e de um aumento no tempo para conseguir uma recolocação, além de redução na população economicamente ativa, seja por conta do desalento ou pelo efeito combinado das medidas de distanciamento social e das políticas de transferência de renda a famílias vulneráveis.

O desemprego prolongado traz outras consequências, igualmente de prazo mais longo, ao afetar drasticamente a capacitação e a capacidade de acompanhar as mudanças ocorridas no setor por aqueles que continuam sem trabalho, o que tende a minar as possibilidades de uma retomada mais vigorosa nos anos seguintes e ainda trazer implicações políticas. Nas projeções da equipe de economistas responsável pelo Boletim de Macroeconomia do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), a taxa de desemprego tenderia a retomar níveis anteriores à pandemia apenas no início da segunda metade da próxima década, conforme registra o diretor da casa e doutor em economia pela mesma FGV Luiz Guilherme Schymura, no Blog do Ibre.

“Há indicações de que a volta da taxa de desemprego para o padrão anterior ao difícil período iniciado em 2015 pode levar alguns anos, mesmo em cenários de crescimento econômico bastante otimistas. Essa constatação (…) tem implicações importantes para as eleições de 2022 e para a política econômica a ser conduzida até lá, assim como para o próximo governo a partir de 2023”, observa Schymura.Ele lembra que a taxa de desemprego girou ao redor de 5,0% na média entre 1981 e 1994, elevando-se para uma média de 9,3% entre 1995 e 2014 e atingindo 11,4% entre 2014 e 2019 em função da crise. “Tomando-se o período de 1995 a 2019, a taxa média foi de 9,7%”, aponta ainda.

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Longe da média

A desaceleração da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) entre este ano e o próximo, saindo de 4,9% em 2021 para algo próximo a 1,5% em 2022, na estimativa do Ibre, levaria a uma redução muito lenta da taxa média de desemprego anual, de 14,1% para 13,0%. “Uma das razões para a baixa velocidade da queda da taxa de desemprego é que a recuperação da população ocupada será acompanhada pela retomada em paralelo da população economicamente ativa (base para o cálculo da taxa de desocupação)”, sugere Schymura. O retorno ao desemprego médio observado entre 1995 e 2019, na faixa de 9,7%, dependerá de “uma aceleração muito forte da economia brasileira em relação ao padrão de crescimento recente”, acrescenta o economista. Nas projeções do Boletim Macro do Ibre, seria preciso que a economia avançasse a um ritmo anual médio de 3,5% entre 2023 e 2026 – “ritmo difícil de imaginar dado o pobre desempenho recente” – para que a taxa de desemprego recuasse para 9,8%.

Balanço

  • Caso o PIB avance a um ritmo mais próximo de 1,5% ao ano, a taxa de desemprego, já ajustada sazonalmente, chegaria a 11,6% em 2026. Para um crescimento de 2,5%, detalha Schymura, a desocupação recuaria para 10,8%. Quer dizer, será preciso um esforço maior e um novo arranjo de políticas econômicas para destravar o crescimento e a geração de empregos.
  • Numa avaliação da velocidade da retomada, se é que se pode considerar assim, o diretor do Ibre lembra que a população ocupada caiu praticamente 15,0% entre fevereiro e julho do ano passado, passando a apresentar “recuperação bastante gradual em seguida”. De fato, em julho deste ano, dado mais recente disponível, o total de pessoas ocupadas ainda estava 4,4% mais baixo do que os níveis anotados antes da pandemia.
  • Também em consequência da crise sanitária causada pelo Sars-CoV-2, a força de trabalho (ou população economicamente ativa, a soma de empregados e desempregados) sofreu “queda sem precedentes”, num tombo de 12,0% entre fevereiro e julho de 2020, ainda de acordo com Schymura. Em julho deste ano, persistia uma redução de 2,8% em relação a fevereiro do ano passado. “De forma congruente, a taxa de participação caiu de 62% em fevereiro de 2020 para um mínimo de 54% em junho do ano passado, recuperando-se apenas parcialmente, para próximo de 58%, em julho de 2021”, acrescenta ele.
  • Essa combinação (queda na força de trabalho e na taxa de participação) ajudou a camuflar o desemprego. “Caso a força de trabalho tivesse se mantido constante em 2020, a taxa de desemprego média do ano passado teria sido de 18,8%, em vez do nível de 13,5% oficialmente divulgado”, pondera Schymura.
  • O emprego para trabalhadores informais despencou 12,6% no ano passado, com retrocesso de 4,2% para os formais. Nos dois casos, o emprego não retomou seus níveis anteriores à pandemia, permanecendo queda de 5,4% e de 4,8% para informais e formais, pela ordem, na comparação entre julho deste ano e fevereiro de 2020.
  • Os trabalhadores sem instrução foram atingidos mais severamente pela pandemia, com retração de 17,1% no emprego, perda que chegou a 14,8% para o contingente com fundamental completo e ensino médio incompleto. Os trabalhadores com ensino médio completo e superior incompleto enfrentaram redução de 6,4% no emprego, ainda no ano passado, com recuo de 5,5% para aqueles com ensino superior completo.
  • Por setores, os serviços industriais de utilidade pública (saneamento básico, energia), a construção civil e os chamados “outros serviços” sofreram quedas de 14,1%, de 12,5% e de 12,1%, respectivamente.
  • “A taxa de desemprego responde muito mais, em módulo, a quedas do PIB do que a variações positivas de mesma magnitude dessa variável”, anota o economista Bráulio Borges, pesquisador associado do Ibre/FGV. Numa tradução muito aproximada e talvez menos precisa do que poderia considerar Borges, as demissões têm ocorrido no Brasil com maior velocidade, ao longo dos períodos de crise. Mas a recontratação do pessoal demitido ocorre – quando ocorre – em ritmo muito mais lento do que poderiam supor o novo ritmo assumido pela atividade econômica. O fato de esse ritmo vir se demonstrando bastante claudicante igualmente ajuda a manter o desemprego muito elevado.
  • Em resumo, parece ser fantasiosa a ideia, bastante estabelecida por aqui, segundo a qual a reforma trabalhista, ao trazer mais “flexibilidade” para demissões e contratações (quer dizer, ao abolir direitos dos trabalhadores), faria brotar empregos aos borbotões. As previsões sugeriam a abertura de 6,0 milhões de vagas no mercado formal a partir da entrada em vigor da reforma, em novembro de 2016.