Dívida das famílias chega a novo recorde, sob juros muito mais altos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 28 de julho de 2022

A dívida total das famílias continuou a avançar ao longo dos quatro primeiros meses deste ano, no dado mais recente divulgado pelo Banco Central (BC), e atingiu níveis históricos como proporção do total de riquezas produzidas pelo País, retratada pelo Produto Interno Bruto (PIB).  Turbinada pela escalada dos juros desde março do ano passado, no conceito de “crédito ampliado”, na classificação do BC, o saldo daquela dívida experimentou crescimento nominal de 20,3%, passando de R$ 2,541 trilhões para R$ 3,058 trilhões – ou seja, R$ 517,1 bilhões a mais. Na comparação com o PIB, os níveis de endividamento elevaram-se de 32,4% para 34,1% entre abril do ano passado e o mesmo mês deste ano.

A maior parcela dessa dívida, em torno de 92,6% frente a 91,4% em abril do ano passado, está relacionada a empréstimos e financiamentos contratados pelas famílias a bancos e outras instituições financeiras, que cresceram 21,9% na mesma comparação, saindo de R$ 2,323 trilhões para R$ 2,832 trilhões. Os juros médios dessa parte da dívida das famílias, que inclui empréstimos tomados no chamado segmento livre do mercado financeiro e financiamentos contratados com base em recursos direcionados a áreas específicas, a juros mais baixos (imóveis, crédito rural e outras formas de crédito), avançaram de 25,3% para 32,1% ao ano, numa variação de 6,8 pontos de porcentagem. No segmento de livre contratação – que de livre tem quase nada, a não ser a liberdade de os bancos imporem as taxas que bem entenderem –, as taxas cobradas das famílias aumentaram novo pontos, subindo de 41,3% para 50,3%.

Custo salgado

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Mesmo essa taxa média não reflete integralmente os custos a que as famílias estão submetidas quando conseguem acessar o sistema financeiro de alguma forma. Proporcionalmente, o crédito pessoal não consignado foi a modalidade que apresentou a maior taxa de crescimento entre abril de 2021 e igual mês deste ano, avançando 39,6%, de R$ 164,969 bilhões para R$ 230,301 bilhões. Os juros cobrados pelos bancos, nesta área, foram elevados de 86,3% para 87,0% ao ano. O saldo do cheque especial, a despeito de sua representatividade menor (1,73% do crédito com juros livres), registrou crescimento de 32,2% em igual período, saindo de R$ 20,859 bilhões para R$ 27,576 bilhões (mais R$ 6,717 bilhões). Nessa faixa de empréstimos, os juros já eram estratosféricos, atingindo 124,3% ao ano em abril do ano passado, e subiram ainda mais, para 132,7% no mesmo mês deste ano.

Balanço

  • O crédito contratado a juros livres pelas famílias foi responsável pela maior parcela do crescimento da dívida total ao atingir R$ 1,597 trilhão, o que representou incremento de 25,6% frente ao saldo de R$ 1,272 trilhão registrado pelo mesmo segmento em abril do ano passado. Sua participação na dívida total das famílias saiu de quase 50,1% para 52,2%. O estoque dos créditos livres aumentou praticamente R$ 325,26 bilhões, o que representou uma contribuição de 62,9% para o incremento da dívida total.
  • A dívida das empresas, também no conceito de crédito ampliado, que inclui outras modalidades de empréstimos e financiamentos (como fundos constitucionais, dívida externa e lançamento de títulos pelas empresas no mercado doméstico), registrou variação de apenas 7,7% – quer dizer, muito menos do que o aumento registrado pela dívida das famílias. No caso das pessoas jurídicas, o estoque da dívida passou de R$ 4,317 trilhões para R$ 4,648 trilhões, recuando de 55,0% para 51,9% do PIB.
  • Os níveis de endividamento e de comprometimento da renda das famílias com o pagamento de juros e amortizações, aferido até março, não registraram alterações notáveis desde o final do ano passado, mas encontravam-se bem acima daqueles observados em março do ano passado. O endividamento é definido pela relação entre o tamanho da dívida contratada pelas famílias e a renda nacional disponível bruta acumulada em 12 meses, enquanto o comprometimento considera os valores pagos na média trimestral para fazer frente ao chamado serviço da dívida (juros e prestações) frente a renda média de igual intervalo.
  • O endividamento passou de 52,6% para 52,7% entre dezembro de 2021 e março deste ano, mas havia sido de apenas 45,0% em março do ano passado, indicando elevação de 7,7 pontos de porcentagem. O comprometimento da renda, por sua vez, oscilou entre 27,9% e 28,5% de dezembro para janeiro, chegando a 27,7% em março deste ano, partindo de 24,5% no terceiro mês do ano passado, num avanço de 3,2 pontos.
  • A inadimplência das pessoas físicas no segmento de crédito livre avançou mais fortemente a partir de janeiro deste ano, saindo de 4,4% em dezembro para 5,0% em março. Os atrasos no pagamento de dívidas contratadas dentro do sistema financeiro já acumulam elevação de um ponto de porcentagem, diante de 4,0% em março de 2021. Um movimento alimentado pelo encarecimento do crédito, com a alta dos juros, e pela inflação elevada, que tem ajudado a comprimir os salários e, portanto, a capacidade de pagamento das famílias.
  • Entre as empresas, as taxas de inadimplência têm se mantido virtualmente inalteradas, na faixa de 1,7% desde março do ano passado, também no segmento de crédito livre.