Dividendos pagos pelas empresas aos muito ricos quadriplicou em 10 anos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 23 de abril de 2022

Totalmente isentos de impostos, os dividendos e juros sobre o capital próprio distribuídos pelas empresas de capital aberto bateram recorde no ano passado, ajudando a engordar os ganhos dos muito ricos no País e a concentrar ainda mais a renda nacional. Segundo levantamento da consultoria Economática, a parcela dos lucros distribuídos aos acionistas daquelas empresas cresceu praticamente 170% em relação a 2021 e mais do que quadruplicou em uma década.

Incluindo a mineradora Vale, a Petrobrás e mais 226 empresas com ações negociadas em bolsa, a distribuição de dividendos e juros sobre o capital próprio – mais uma “jabuticaba” brasileira, que permite às empresas abateremdos impostos as despesas com juros que superam a taxa básica regulada pelo Banco Central (BC), engordando seus lucros – atingiu R$ 291,187 bilhões no ano passado, diante de R$ 107,879 bilhões em 2020. Comparados aos R$ 64,388 bilhões distribuídos aos acionistas em 2011, os dados levantados pela consultoria mostram um salto de 352,2% em termos nominais, correspondendo a uma variação real, depois de descontada a inflação, de 150,3% aproximadamente. Desde 2010, as empresas acompanhadas pela Economática distribuíram um total superior a R$ 1,237 trilhão aos donos de suas ações.

Sem Petrobrás e Vale, o crescimento foi menos expressivo, mas nada modesto. As 226 empresas com dados disponíveis para 2020 e 2021 elevaram a parcela dos lucros distribuída aos donos de ações de R$ 82,509 bilhões para R$ 145,177 bilhões, num aumento de quase 76,0%. No espaço de uma década, o crescimento nominal chegou a 125,5%, em alta real muito próxima de 25,0%, considerando o total de R$ 64,388 bilhões distribuídos em 2011.

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Escalada

As taxas para Vale e Petrobrás foram assombrosas. No primeiro caso, sob efeito da escalada dos preços do minério de ferro, o valor de dividendos e juros distribuídos pela Vale aumentou 291,7% entre 2020 e 2021, passando de R$ 18,709 bilhões para R$ 73,287 bilhões. Na década iniciada em 2011, quando os lucros distribuídos pela mineradora haviam somado R$ 15,130 bilhões, em valores arredondados, o crescimento atingiu 384,4%. A Petrobrás, que haviam repassado a seus acionistas “apenas” R$ 6,660 bilhões em 2020, distribuiu R$ 72,718 bilhões no ano seguinte, ou quase 11 vezes mais. O valor corresponde ao que a estatal já havia pago ao longo do ano passado, lembrando que o valor total dos dividendos anunciados para o exercício fiscal de 2021 aproximou-se de R$ 101,4 bilhões, equivalentes a pouco mais de 95% de todo o lucro realizado pela companhia no ano passado, em torno de R$ 106,0 bilhões. O valor dos dividendos passou a ser calculado com base no fluxo de caixa da Petrobrás, engordando os recursos destinados aos acionistas no curtíssimo prazo. No longo prazo, esse tipo de política tende a comprometer o crescimento futuro da empresa, reduzindo seus investimentos e acelerando o desmonte programado da principal empresa do País.

Balanço

  • A melhora nos dados de contágio e de mortes pelo Sars-CoV-2 trouxe boas notícias para a economia também, embora centenas de pessoas continuem ainda morrendo todos os dias por conta da Covid-19. Mas há outros problemas adiante, como alerta o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (Iedi). “Com o avanço da vacinação contra a Covid-19 e sua eficácia frente às ondas de contágio por novas variantes, neste início de 2022 os efeitos diretos da pandemia sobre o nível de atividade econômica se amenizaram, dando consistência à normalização de empresas e setores. Outros obstáculos, contudo, surgiram e não devem sair de tela muito rapidamente”, diz o instituto.
  • Na análise do Iedi, alta nos custos e preços na economia, desemprego, juros altos e em alta estão entre os focos de preocupação. A “forte aceleração da inflação”, observa a equipe de analistas do instituto, “acabou ensejando elevação dos patamares de taxas de juros no País”, o que tende a encarecer o custo do crédito e inibir principalmente os investimentos.
  • O “grande desemprego” é outra preocupação, assim como, entre as pessoas ocupadas, a elevada “subutilização (da mão de obra) por insuficiência de horas trabalhadas”, que termina por inibir decisões de consumo das famílias. Esses fatores vêm acompanhados por uma “renovação dos gargalos das cadeias produtivas com a guerra na Ucrânia e novos focos de Covid-19 na China”, o que poderá afetar o crescimento da economia chinesa esperado para este ano.
  • Tudo somado, observa o Iedi, “o poder de compra da população foi restringido, retirando fôlego da retomada do consumo das famílias, que representa algo como 60% do Produto Interno Bruto (PIB) do País”.  Ainda na avaliação do instituto, “em relação à situação de um ano atrás, este movimento tem prejudicado sobretudo o consumo e a produção de bens”, enquanto os serviços, “mais demandados por famílias de maior renda e pelas empresas, preservam certo dinamismo, ajudados por bases de comparação muito baixas em alguns de seus ramos”.
  • A produção industrial, prossegue o instituto, acumulou declínio de 5,8% no primeiro bimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado, numa queda de igual intensidade àquela registrada no trimestre final de 2021, “sinalizando nenhum progresso recente”. Para o Iedi, “a dificuldade de se obter partes e peças segue prejudicando um desempenho superior” na indústria.
  • No comércio varejista, em seu conceito mais amplo, incluindo as vendas de veículos, motos, autopeças e materiais de construção, houve ligeiro recuo de 0,6% também na comparação entre aqueles dois primeiros bimestres.
  • Conforme o Iedi, tomando dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), “apenas o setor de serviços se saiu bem em comparação com o início do ano passado, acumulando alta de 8,5% em seu faturamento real no período de janeiro-fevereiro de 2022, sem grande arrefecimento diante do resultado do terceiro trimestre de 2021” (quando havia crescido 9,4%). “A depender de serviços prestados às famílias e do transporte aéreo, muito distantes do pré-pandemia, ainda há espaço para o setor crescer mais”, sugere o instituto.