Erros na economia, seca, alta das commodities explicam inflação

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 11 de agosto de 2021

Um grupo restrito de produtos, mas com peso considerável no orçamento das famílias, vem determinando o comportamento recente da inflação aferida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) por meio do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A constatação, a partir de dados brutos divulgados pelo instituto, não alivia em nada a situação daquelas famílias de renda mais baixa, mais penalizadas pela carestia, mas permite identificar que os principais focos de alta estão relacionados a produtos agrícolas exportáveis, energia, incluindo o gás de cozinha, e combustíveis.

O IPCA atingiu 0,96% nos 30 dias de julho, a mais taxa para o mês desde 2002, saindo de 0,53% em junho e de 0,72% nas quatro semanas encerradas no dia 13 de julho. Uma dezena de itens respondeu por pouco mais de 78,0% da taxa registrada no mês passado, a saber, energia residencial (que sozinha foi responsável por 36,9% da inflação de julho), gás de cozinha e gás encanado, aluguel, gasolina, passagens aéreas, tomate, frango em pedaços, leite longa vida e carnes. Os itens restantes registraram uma “inflação” em torno de 0,21%, em estabilidade em relação à taxa medida pelo IPCA-15 de julho (que cobriu o período entre 14 de junho e 13 de julho).

O ponto em comum entre esses grupos de produtos está principalmente na influência da desvalorização do dólar, concentrada (até aqui) nos primeiros meses do ano, assim como da alta dos preços das commodities no mercado internacional (grãos e petróleo). A energia tem sofrido com a crise hídrica gerada pelos níveis muito reduzidos de precipitação especialmente a partir do ano passado, o que acabou drenando os reservatórios das usinas hidrelétricas, ressuscitando o fantasma de uma crise também no suprimento de energia.

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Choque duplo

A atuação do Banco Central (BC) no mercado do dólar, ao permitir que toda a pressão inflacionária observada no mercado mundial contaminasse os preços aqui dentro, a política de preços da Petrobrás e as políticas supostamente liberalizantes implantadas nas últimas décadas, que simplesmente levaram a zero os estoques reguladores de grãos, compõem o cenário restante por trás do foco inflacionário enfrentado pelo País neste momento. Para compensar seu imobilismo na área do câmbio, o BC recorre ao instrumento único sempre sacado pelas sucessivas equipes econômicas desde sempre no País: um choque de juros, delineado pela perspectiva de que a taxa básica alcance e mesmo supere 7,0% ano até dezembro próximo, com estragos duplos, ao abortar a perspectiva de crescimento econômico mais vigoroso e ao gerar novos rombos para o setor público, causados pelo aumento das despesas com juros.

Balanço

  • Com o índice de julho, o IPCA acumulado em 12 meses atingiu 8,99% e tende a continuar sua escalada pelo menos até agosto, a se considerar as projeções mais recentes. O Itaú BBA espera que o índice alcance 0,55% no mês em curso, recuando para 0,47% em setembro e para 0,41% em outubro. Para comparar, a inflação havia sido bem mais baixa em agosto do ano passado, chegando a 0,24%. Mas subiria para 0,64% já em setembro, atingindo 0,86% em outubro, 0,89% em novembro e 1,35% em dezembro.
  • A depender do comportamento dos preços no curtíssimo prazo, a taxa anual acumulada pelo IPCA pode vir a anotar algum refluxo até o final do ano, como sugerem as expectativas de mercado, que espera uma inflação ao redor de 7,0% ou pouco menos do que isso nos 12 meses deste ano, o que significaria um recuo de praticamente dois pontos de porcentagem.
  • Além das incertezas geradas pelo clima político efervescente, estimulado pelos desequilíbrios irracionais do tresloucado no poder, a possibilidade de novas correções na tarifa de energia em função da crise hídrica poderá desestabilizar aquelas previsões, terminando por consolidar um cenário de inflação mais elevada do que se espera.
  • As economistas Julia Passabom e Luciana Rabelo, do Itaú BBA, trabalham com a expectativa de mais um reajuste sobre o valor adicionado à tarifa da energia elétrica residencial pela bandeira vermelha nível dois. Desde 1º de julho, esse valor saltou de R$ 6,243 para R$ 9,492 a cada 100 quilowatts/hora consumidos. Segundo Julia e Luciana, a bandeira tarifária vermelha 2 poderá avançar até R$ 11,50 em setembro, representando elevação de 21,2%.
  • Neste caso e se mantida até dezembro, a bandeira vermelha poderia representar um impacto adicional de 0,40 a 0,50 pontos de porcentagem sobre a taxa acumulada em 12 meses pelo IPCA.
  • As pressões de alta nos mercados atacadistas ressurgiram em julho, depois do suspiro observado no mês anterior, quando a Fundação Getúlio Vargas (FGV) chegou a registrar recuo de 0,26% após meses de elevação. O índice de preços no atacado chegou a 1,65% em julho, passando a acumular salto de 43,85% no ano, pressionado principalmente pelos preços das matérias primas brutas, que subiram 1,79% em julho (depois de queda de 2,40% em junho) e 60,27% nos 12 meses encerrados no mês passado.
  • O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), igualmente calculado pela FGV, por meio do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), abriu setembro com ligeiro incremento, saindo de 0,92% nas quatro semanas de agosto para 0,97% nos 30 dias terminados no dia 7 de agosto. Assim como no IPCA de julho, as pressões vieram principalmente da tarifa de energia, gasolina, passagem aérea (que desacelerou, no entanto, de 13,11% em agosto para 6,75%), tomate e gás de botijão.