Estado renunciou a receitas de R$ 40,8 bilhões em cinco anos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 16 de junho de 2021

Na soma de todos os benefícios, incentivos, créditos outorgados e perdões fiscais conferidos a empresas do setor privado entre 2016 e 2020, o Estado deixou de arrecadar ou abriu mão de receitas equivalentes a R$ 40,821 bilhões em valores nominais, segundo mostra relatório sobre renúncias fiscais produzido pelo Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (IMB). Numa comparação feita pela coluna com base em dados oficiais, o valor das renúncias seria suficiente para pagar duas vezes e um pouco mais toda a dívida líquida do setor público goiano, que atingiu R$ 19,210 bilhões em abril deste ano. O Estado quitaria a dívida e ainda sobrariam perto de R$ 21,610 bilhões em caixa, hipoteticamente.

Considerando a receita corrente líquida acumulada naqueles mesmos cinco anos, num total de R$ 111,869 bilhões, as renúncias fiscais representaram em torno de 36,5%, ou seja, mais de um terço das receitas foram destinadas a empresas de setores diversos, reduzindo a capacidade de o Estado realizar investimentos e gastos em serviços públicos essenciais para a população. A proporção entre renúncias e receita líquida foi reduzida entre 2016 e o ano passado, saindo de 38,04% para 34,86%, mas houve crescimento em termos reais durante o período.

Em 2016, o governo deixou de arrecadar R$ 7,334 bilhões em impostos, valor que saltou para quase R$ 8,967 bilhões no ano passado, demonstrando uma elevação nominal de 22,26%. Descontada a inflação do período, a perda de receitas causada pelos programas de incentivos fiscais e pelas diversas medidas adotadas pelo governo para reduzir a carga de impostos das empresas experimentou variação próxima de 4,70%. A receita corrente líquida avançou mais rapidamente, saindo de praticamente R$ 19,280 bilhões em 2016 para R$ 25,718 bilhões no ano passado, com alta de 33,40% (em torno de 14,2% em termos reias), o que poderia sugerir que, ao abrir mão de receitas, o governo conseguiu gerar mais receitas. Não foi exatamente o que aconteceu. No mesmo intervalo, a cada R$ 100 acrescidos às receitas, um quarto deixou de ser arrecadado em função de benefícios fiscais fruídos pelas empresas.

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Concentração

O trabalho do IMB recorre à literatura disponível sobre a questão dos incentivos fiscais, defendidos ferrenhamente pelo setor empresarial, como não poderia ser diferente, para apontar alguns pontos críticos naquele tipo de política, calibrada supostamente para atrair investimentos e corrigir desequilíbrios regionais. “Em relação aos programas fiscais do Estado de Goiás, diversos estudos sugerem que há uma concentração na concessão dos benefícios em poucas regiões, o que pode ampliar as desigualdades regionais”, aponta o trabalho. “Adicionalmente”, prossegue o IMB, “estudos da literatura evidenciam a baixa aderência dos objetivos propostos pelos principais programas de renúncia fiscal com a sua prática, o que implica em baixos resultados na geração de empregos e renda, bem como em um custo do emprego elevado”.

Balanço

  • O trabalho aponta uma concentração muito elevada na distribuição dos incentivos, favorecendo mais fortemente regiões mais desenvolvidas, “tanto em número de beneficiários, bem como em valores monetários. Destaca-se a concentração nas regiões: Metropolitana de Goiânia, Centro Goiano, Entorno do Distrito Federal e Sudoeste Goiano”.
  • Considerandoa concessão de crédito outorgados, outros créditos e deduções do Imposto sobre a Circulação de Bens e Serviços (ICMS), os municípios da região metropolitana de Goiânia e as regiões administrativas do Centro Goiano e do Sudoeste concentraram no ano passado 68,0% dos benefícios, levemente abaixo dos 69,3% registrados em 2016.
  • Conforme o IMB, no caso dos programas Fomentar e Produzir, adotados, respectivamente, em meados dos anos 1980 e em 1999,“destaca-se a concentração nos municípios de Anápolis, Rio Verde e Catalão”. Em relação às concessões de crédito outorgado (uma forma de reduzir a base de cálculo e, portanto, o imposto a ser pago), “destacam-se os municípios de Goiânia, Anápolis e Rio Verde” – precisamente aqueles que já concentravam maior desenvolvimento e renda no Estado.
  • Ainda de acordo com o trabalho do instituto, somados, Fomentar e Produzir, que têm foco no setor industrial, distribuíram incentivos no valor de R$ 1,742 bilhão em 2016, valor que experimentou salto de 59,76% até o ano passado, alcançando R$ 2,783 bilhões. Em cinco anos, ou seja, entre 2016 e 2020, os dois programas distribuíram incentivos num total de R$ 29,777 bilhões, representando 72,95% do total de benefícios concedidos pelo Estado,“confirmando que tais programas são o carro chefe da política de atração industrial do governo”, observa o relatório.
  • O trabalho apresenta ainda dados da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite), mostrando que, em 2019, proporcionalmente, Goiás foi o segundo Estado mais agressivo na concessão de benefícios fiscais, ficando atrás apenas do Amazonas. A comparação leva em conta a relação entre renúncias fiscais relacionadas ao ICMS e a arrecadação daquele imposto. Goiás distribuiu incentivos equivalentes a 44,10% da receita do ICMS (o dobro da média nacional), diante de 70,3% no Amazonas. Mato Grosso surge em terceiro lugar, com 34,75%. Na média total do País, os incentivos lastreados no ICMS corresponderam a 21,75% da arrecadação.
  • Há problemas de governança e controle por parte do Estado em relação aos incentivos distribuídos fartamente e, ainda, a “manutenção de renúncias tributárias em volumes consideráveis aos segmentos que, ao longo do tempo, vêm perdendo dinamismo e participação na indústria goiana”.