Indicador da FGV também sugere perda de fôlego do PIB em agosto

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 21 de outubro de 2022

Mais um indicador sugere tendência de enfraquecimento da economia no segundo mês do semestre, embora em intensidade menor do que aquela apontada pelo Banco Central (BC). Construído pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o “monitor do PIB” (Produto Interno Bruto, soma das riquezas produzidas pela economia) apontou baixa de 0,8% na saída de julho para agosto, depois dos devidos ajustes sazonais. Para rememorar, o indicador de atividade do BC chegou a registrar contração de 1,13% na mesma comparação.

Coordenadora da pesquisa da FGV, a economista Juliana Trece associa a queda na atividade econômica às “retrações na indústria e nos serviços”, destacando a ocorrência de “recuos na maior parte das atividades que compõem” aqueles dois setores. A redução no consumo das famílias, que responde por alguma coisa em torno de 60% na formação do PIB, igualmente ajudou a derrubar o PIB em agosto. Comparado a julho, as famílias reduziram seu consumo em 0,5%.

Na comparação com igual período do ano passado, registra a publicação da FGV, o consumo das famílias cresceu 4,4% no trimestre encerrado em agosto deste ano, num desempenho novamente explicado pelo avanço no consumo de serviços e também de bens não duráveis, destacadamente combustíveis e lubrificantes. “Dada a importância que o consumo tem apresentado em 2022, sendo considerado o principal responsável pelo bom desempenho da economia no primeiro semestre, sua retração em agosto sinaliza provável dificuldade de manutenção do crescimento na economia na segunda metade do ano”, analisa Juliana, segundo comunicado divulgado ontem à imprensa.

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A economista acrescenta ainda, conforme já anotado nas edições anteriores do monitor do PIB, diante da elevação recente dos juros e de sua permanência em níveis muito elevados, “era esperado que a economia se enfraqueceria no segundo semestre”. Na sua avaliação, “a retração registrada na atividade econômica em agosto pode ser uma sinalização que a esperada desaceleração da economia chegou”.

Crescimento excludente

Além disso, consideradas as características dos setores que têm apresentado melhorias em seus resultados, o crescimento da atividade econômica na comparação com 2021 parece muito mais influenciado pela maior demanda de famílias de renda média mais elevada, o que explicaria a alta dos serviços (principalmente bares, restaurantes, hotéis, pousadas e outras opções de custo médio mais alto) e ainda o avanço na área dos combustíveis. Ainda numa hipótese a ser confirmada pela realidade, o crescimento de curto fôlego registrado mais recentemente ganha caráter excludente quando observados aqueles fatores e parece favorecer um avanço na concentração de renda e de riquezas, num momento em que o alto custo dos alimentos surge como um obstáculo ao aumento do consumo de outros bens nas faixas de renda mais baixa.

Balanço

  • Em análise assinada pelos economistas Armando Castelar, coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) e professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), e Silvia Matos, coordenadora do Boletim de Conjuntura do Ibre/FGV, o cenário à frente para a economia prenuncia-se “bastante desafiador”.
  • “Em especial, há a expectativa de forte desaceleração do crescimento econômico, com reversão parcial dos ganhos também inesperados que se observaram no mercado de trabalho”, num desaquecimento relacionado a três “elementos principais”, avaliam ambos.
  • O primeiro daqueles “elementos” diz respeito à deterioração já em marcha do cenário externo, com desaquecimento de economias centrais, dólar mais forte, “menor liquidez e preços de commodities mais baixos”. Um dos efeitos desse quadro, sobretudo em função do dólar valorizado e da queda nos preços das commodities, tende a penalizar países emergentes como o Brasil, afetando suas exportações num momento de demanda global em desaceleração.
  • Adicionalmente, prosseguem Castelar e Silvia, a inflação continua “persistentemente alta”, em especial nas economias desenvolvidas, “a despeito da desaceleração na demanda global por bens”. Uma das consequências desse quadro está nas políticas de arrocho monetário (alta de juros e aperto na oferta de crédito) perseguidas pelos bancos centrais e destacadamente, na visão dos dois, pelo Federal Reserve (Fed) – o banco central dos Estados Unidos.
  • As ações assumidas pelos bancos centrais tenderão a conduzir a economia mundial para uma recessão em 2023, ainda na visão de Castelar e Silvia, gerando ainda “razoável volatilidade nos mercados financeiros”.
  • Um ponto de preocupação antecipado pela dupla de economistas está nas perspectivas “nada favoráveis” antevistas para a economia chinesa, afetada especialmente por medidas radicais de distanciamento social adotadas para conter a Covid-19. “A expectativa é que a China cresça apenas 3,2% neste ano, de acordo com as previsões do pesquisador Lívio Ribeiro”, acrescentam. O mercado chinês respondeu por 27,5% de todas as exportações brasileiras no acumulado entre janeiro e setembro deste ano, saindo de 33,6% em igual período do ano passado, o que dá uma ideia dos efeitos potenciais para a economia brasileira por conta da desaceleração na China.
  • As variáveis complicam-se um pouco mais com o agravamento do conflito entre Rússia e Ucrânia, entrando em uma fase “bem mais preocupante”, e ainda com o anúncio recente da Opep+, que reúne os países exportadores de petróleo, de “um corte agressivo na produção”. A redução na oferta mundial de petróleo, no entendimento de Castelar e Silvia, “deve contribuir para manter os preços do petróleo em patamar elevado, a despeito da desaceleração da economia mundial”.
  • Internamente, os “efeitos defasados” da política de juros altos sobre a economia tenderão a desestimular a atividade, com “perda de dinamismo do crédito às famílias”, desestimulando sua propensão a consumir. Num círculo vicioso, a alta expressiva da taxa real de juros (descontada a inflação) reduz o espaço para as famílias renegociarem dívidas, levando a maior inadimplência e a novo ciclo de encarecimento do crédito à frente. As incertezas na área fiscal, com volta do déficit primário em 2023, completam o quadro analisado por Castelar e Silvia.