Indústria continua patinando em baixo crescimento neste ano

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 06 de julho de 2022

A produção industrial conseguiu alcançar seu primeiro resultado positivo na comparação com igual período do ano imediatamente anterior depois de colecionar nove meses consecutivos de perdas. Na comparação mês a mês, segundo a pesquisa mensal do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que recorre a dados devidamente dessazonalizados (quer dizer, expurgados de fatores que se repetem em determinados períodos do ano e poderiam distorcer a comparação), o setor registrou a quarta variação positiva em sequência – o que pode ser visto como um alívio, mas apenas conseguiu deixar a produção industrial nos mesmos níveis de dezembro do ano passado. Num olhar menos condescendente, a indústria não saiu do lugar nos cinco primeiros meses deste ano.

Na passagem de abril para maio, a produção registrou variação de 0,3%, depois de avanços de 0,2% em abril, de 0,6% em março e de 0,7% em fevereiro. No primeiro mês do ano, comparado a dezembro de 2021, a indústria havia derrapado e sofrido baixa de 1,9%. Os índices de variação observados nos quatro meses seguintes, apenas para reforçar, não foram suficientes para repor as perdas anotadas em janeiro, numa observação também do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O cenário à frente, especialmente no segundo semestre, não parece reservar dados mais lisonjeiros para o setor industrial e para a atividade econômica como um todo. Os economistas mais identificados com os mercados e instituições independentes antecipam novo desaquecimento para a economia como um todo nos dois últimos trimestres deste ano, principalmente como consequência dos reflexos da alta de juros sobre o lado real da economia. Na visão do Iedi, diante das “expectativas de desaceleração da economia brasileira na segunda metade de 2022, é possível que esta falta de robustez no desempenho recente (da indústria) comprometa a continuidade da sequência de variações positivas que temos visto nos últimos meses”.

Caça ao voto

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Chamada de “PEC do desespero”, a proposta de emenda constitucional aprovada recentemente pelo Senado e sob escrutínio da Câmara, prevendo a ampliação do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, cria auxílio para caminhoneiros autônomos e taxistas e dobra o “vale-gás” até dezembro próximo, a despeito de seu caráter nitidamente eleitoreiro, deverá irrigar a economia com R$ 41,25 bilhões, se tudo correr como esperam as hostes do bolsonarismo em sua sanha para conquistar votos. O impacto sobre a atividade econômica tende a ser limitado, no entanto, especialmente quando se lembra que a injeção de quase R$ 86,7 bilhões entre abril e junho, com a liberação de recursos do Fundo de  Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a antecipação do 13º salário para aposentados e pensionistas da Previdência, trouxe reflexos já limitados. A nova “onda de bondades” significará algo inferior a 48% dos recursos liberados no primeiro semestre, com reflexos, portanto, ainda mais limitados.

Balanço

  • O dado a complicar o cenário adiante está precisamente na política monetária, quer dizer, a política de juros altos. O impacto do aumento dos juros sobre o lado real da economia tende a se intensificar ao longo do semestre em curso, nas previsões do tal mercado, que levam em conta os efeitos retardatários daquela alta sobre a atividade econômica.
  • Além disso, o volume de recursos gastos pelo governo central com juros nos 12 meses encerrados em abril deste ano, dado mais recente divulgado pelo Tesouro Nacional, foi simplesmente 3,4 vezes maior do que todo o dinheiro que supostamente será colocado à disposição das famílias por conta da liberação de recursos do FGTS, do pagamento antecipado de pensões e aposentadorias e das supostas vantagens criadas pela “PEC do desespero”.
  • Entre maio do ano passado e abril deste ano, os juros nominais custaram ao Tesouro em torno de R$ 436,067 bilhões, diante dos R$ 127,95 bilhões que se espera sejam desembolsados até o final deste ano. Para comparar, nos 12 meses imediatamente anteriores, os juros haviam consumido perto de R$ 242,043 bilhões. O impacto da política monetária sobre os cofres do Tesouro correspondeu a um salto de 80,16% nas despesas com juros, gerando rombos e crescimento da dívida pública federal.
  • Tudo considerado, o dinheiro retirado do lado real da economia pela política de juros altos vai superar com sobras todo o festival de gastos contratados pelo governo, enxugando e limitando os efeitos sobre a atividade via redução da oferta de crédito e seu encarecimento, além de tornar mais caro o financiamento dos investimentos.
  • De volta aos números da indústria em maio, para se ter uma visão de como o seu desempenho tem sido claudicante, vale recordar que a produção conseguiu naquele mês seu primeiro dado positivo frente ao mesmo período do ano anterior depois de nove meses de perdas acumuladas. E não chegou a ser um avanço expressivo, com variação de 0,5% frente a maio do ano passado. Dois setores concentraram o crescimento observado: coque, produtos derivado do petróleo e biocombustíveis, que registrou crescimento de 15,3% frente a maio de 2021; e máquinas e equipamentos, num avanço de 5,5% na mesma comparação. Excluídos esses dois setores e ainda a indústria extrativa, que experimentou tombo de 8,2% em função das quedas na extração de petróleo e na produção de minério de ferro, os demais setores da indústria apresentaram recuo de 0,2%.
  • Comparados aos níveis anteriores à pandemia, 13 setores da indústria (metade dos segmentos acompanhados pelo IBGE) continuavam com produção mais baixa do que em fevereiro de 2020 e outros 13 conseguiram crescer nessa comparação. Na média geral, no entanto, a atividade industrial continuava em maio deste ano 1,1% abaixo de fevereiro de 2020. Os níveis observados em maio passado, em mais um exemplo das dificuldades à frente para o setor, estavam nada mais do que 17,6% abaixo dos níveis de maio de 2011, quando a produção havia alcançado seu melhor resultado na série histórica do IBGE.