Coluna

Indústria devolve ganho (já modesto) de 2018 e consolida tendência recessiva

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 05 de fevereiro de 2020

Os
números da produção industrial em 2019 divulgados ontem pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desmentem mais uma vez a profusão
de análises “polianas” disseminadas ao longo das últimas semanas (e meses, na
verdade) pela imprensa que se autoproclama especializada, mídia sociais e
quejandos. Analisada em seu conjunto, a indústria enfrentou uma recessão de
fato ao longo do ano passado, devolvendo todo o ganho (e um pouco mais)
registrado em 2018.

Na
verdade, mostra a pesquisa mensal da produção industrial do instituto, o setor
sequer conseguiu se reerguer acima dos níveis alcançados antes da greve dos caminhoneiros em maio de 2018 – o que parece ser a
comprovação definitiva de que a indústria brasileira enfrenta sérias
dificuldades para retomar o crescimento, muito além de questões conjunturais
(como a paralisação virtual do setor de extração mineral diante da interrupção
na produção de minério de ferro em áreas importantes da Vale depois da tragédia
de Brumadinho no começo de 2019).

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Com
base em indicadores dessazonalizados (quer dizer, excluídos fatores que ocorrem
em momentos específicos de cada período e que podem afetar as comparações,
distorcendo os resultados), a produção em dezembro passado ainda se encontrava
4,2% mais baixa do que em abril de 2018. A queda mais forte (-21,3%) foi
registrada pela produção de outros equipamentos de transporte. Mas produtos
farmacêuticos e metalúrgicos, por exemplo, experimentavam baixas de 10,6% e de
10,1% entre dezembro de 2019 e abril de 2018, com redução de 5,2% para máquinas
e equipamentos e de 4,8% para o setor de alimentos.

A
“animação” de amplos setores da grande imprensa e, claro, dos tais “mercados”
serviu, convenientemente, a outros propósitos, não confessados, mas
presumíveis.

A
produção afinal recuou em dezembro passado pelo segundo mês consecutivo, seja
na comparação com o mês imediatamente anterior, seja em relação a igual período
do ano anterior. Pior: com retração pronunciada na produção de bens de capital
(máquinas, equipamentos, tratores, caminhões e demais itens utilizados na
fabricação de outros produtos), indicando novo período de queda para os
investimentos em geral, o que tende a rebaixar ainda mais as perspectivas de
uma retomada mais vigorosa da economia como um todo mais à frente. Lembrete:
dezembro teve 21 dias úteis, diante de 20 dias em novembro de 2019 e em
dezembro de 2018.

Perdas em
sequência

Na
passagem de novembro para dezembro, o recuo veio mais intenso do que as
previsões dos departamentos econômicos de bancos, financeiras, corretoras e
administradoras de riquezas (que o economês denomina como “ativos”). Afinal,
esse é o “mercado” que conta para a equipe econômica e para a grande imprensa.
A produção sofreu baixa de 0,7% naquela comparação, depois de cair 1,7% em
novembro (na comparação com outubro). Em dois meses, a perda chegou a 2,4%. Se
comparada a dezembro de 2018, a produção baixou 1,2% e já havia sofrido queda
de 1,8% em novembro. O setor encerrou 2019 com redução de 1,1% depois de
registrar avanço apenas modesto no ano anterior (1,0%). Quase dois terços dos
26 setores de atividade investigados pelo IBGE sofreram perdas no último mês de
2019 e no acumulado de todo o ano passado. Definitivamente, não houve motivos
para celebrações e rojões.

Balanço

·  
Os
números negativos nos últimos dois meses de 2019, apontam os economistas Luka
Barbosa e Matheus Felipe Fuck, do Itaú Unibanco, deverão “contaminar” os
primeiros resultados da indústria neste ano, determinando um ritmo ainda muito
lento para a atividade industrial no trimestre inicial de 2020, ajudando a
frear toda a economia.

·  
A
produção foi penalizada ainda pela queda nas exportações de bens manufaturados,
que sofreram baixa de 1,6% no terceiro trimestre de 2019 e despencaram 13,8% no
quarto trimestre, sempre em comparação com os volumes embarcados pelo setor nos
mesmos períodos de 2018. Em contrapartida, ajudando a afundar um pouco mais o
nível da atividade industrial, a entrada de bens manufaturados produzidos lá
fora avançou 9,7% e 7,9% na mesma sequência.

·  
Considerando
o seu melhor momento, registrado no já longínquo maio de 2011, a produção
industrial acumula perdas de 18,0%. O tombo mais severo, nesse tipo de
comparação, continua reservado para a indústria de bens de capital (aquela que
produz itens que serão utilizados para fabricar outros produtos, como
caldeiras, alto-fornos, tornos, fresadoras, colheitadeiras, tratores, outras
máquinas e equipamentos e até mesmo caminhões).

·  
Comparada
ao pico, alcançado em setembro de 2013, a produção de bens de capital acumula
perdas de 41,9%, uma enormidade. Em outubro, novembro e dezembro, na comparação
com o mês imediatamente anterior, a produção do setor caiu 1,4%, 1,3% e 8,8%.
Na mesma sequência, mas em relação aos mesmos três meses de 2018, os tombos
foram de 2,1%, 3,2% e 5,9%. Depois de um período positivo, notadamente no
segundo quadrimestre de 2019 (quando avançou 4,0%), a indústria de bens de
capital capotou, encerrando 2019 com recuo de 0,4% (depois de avançar 6,2% e
7,1% em 2017 e 2018).

·  
No
terceiro quadrimestre de 2019, comparado ao mesmo intervalo de 2013, a produção
do setor sofreu baixa de 2,3%, com retração de 19,9% nos bens de capital para a
agricultura e de 3,4% no segmento de transporte. Numa exceção, a produção de
bens de capital destinados à indústria aumentou 5,9% nos últimos quatro meses
de 2019.

·  
No
acompanhamento do Itaú Unibanco, o nível do investimento deve ter experimentado
contração de 2,0% no quarto trimestre do ano passado, limitando o avanço
esperado para o Produto Interno Bruto (PIB) a 0,6% nos três meses finais de
2019.