Inflação bem-comportada ajuda a reforçar críticas aos juros altos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 11 de maio de 2024

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) havia alcançado 0,61% em abril do ano passado, o que resultou numa taxa de 4,18% no acumulado em 12 meses – vale dizer, já abaixo do teto da meta inflacionária definida para 2023 pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que serve (ou deveria servir) para delimitar limites para a política monetária, quer dizer, para os juros básicos administrados pelo Banco Central (BC). Mesmo assim, sob o comando de Roberto Campos Neto, o BC resistia e só veio a iniciar a redução da taxa básica no começo de agosto daquele ano, quando os juros recuaram modestamente de 13,75% – taxa que vigorava há 12 meses – para 13,25%.

Para rememorar, o centro da meta inflacionária no ano passado estava fixado em 3,25%, com um piso de 1,75% e um teto de 4,75% (já que a política de metas admite uma tolerância de 1,5 ponto percentual para baixou ou para cima em relação à meta central). Neste ano, o Copom decidiu reduzir o centro da meta para 3,0%, com teto de 4,50% e piso de 1,50%. Em abril deste ano, o IPCA chegou a 0,38%, ligeiramente acima da expectativa mediana dos mercados. Segundo o relatório Focus, produzido semanalmente pelo BC para “medir” o ânimo dos mercados, o setor financeiro esperava uma taxa de 0,34%.

De toda forma, a despeito de alguma elevação em relação às quatro semanas finalizadas em 14 de abril e principalmente na comparação com março, a inflação em 12 meses baixou para 3,69%, saindo de 4,51% em janeiro passado. Como os números confirmam, a inflação manteve-se comportadamente inferior ao teto da meta, dado que não parece ter comovido a diretoria do BC, ou pelo menos a maior parte dela, que decidiu desacelerar, na quarta-feira, um processo já tímido de cortes dos juros básicos.

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E agora, Campos Neto?

Mais do que isto, as expectativas para a inflação de 2024 e de 2025, dentro do tal “horizonte relevante para a política monetária”, mantinham-se abaixo do teto da meta, fixando-se em 3,72% para este ano e em 3,64% para o próximo ano, em ligeira baixa, portanto. Quer dizer, não só a inflação corrente segue trajetória benigna, como as previsões do setor financeiro vinham refletindo alguma confiança em relação ao cumprimento da política de metas, num sinal de que uma redução mais acentuada dos juros básicos já havia fazia parte dos cenários trabalhados pelo setor e não seria surpresa, portanto, se o BC perseverasse no caminho de resto já antecipado desde o final de 2023. Resta saber qual será o comportamento das tais “expectativas” daqui para frente diante das articulações travadas por Campos Neto para torpedear a política monetária e o futuro da economia no curto prazo e do racha que essa estratégia de alto risco gerou entre os membros do Copom.

Balanço

  • Em sua evolução recente, o IPCA saiu de 0,16% no encerramento de março para 0,21% nos 30 dias terminados em 14 de abril, para encerrar o mês passado em 0,38% (como já anotado mais acima). O avanço explica-se basicamente por focos de pressão altista concentrados na área da saúde (medicamentos e planos de saúde), combustíveis e alimentos no domicílio – neste caso, por conta da influência altista dos preços da cebola, do tomate, do mamão e de café moído.
  • As altas de 2,84% e de 0,76% registradas, pela ordem, por produtos farmacêuticos e planos de saúde responderam por pouco mais de um terço da inflação de abril. Esse tipo de pressão tende a se dissipar nas próximas semanas já que refletem reajustes anuais definidos pelo setor público. O preço médio dos remédios, num exemplo, foi reajustado em 4,50% em 31 de março, gerando impactos ao longo de abril e, em escala menor, provavelmente em maio.
  • Os preços dos combustíveis, que vinham em terreno negativo nas últimas semanas, subiram em média 1,74% em abril, puxados pelos aumentos de 1,50% nos preços da gasolina, de 4,56% para o etanol e 0,32% no caso do diesel. A alimentação dentro da casa ficou 0,81% mais cara em média, diante de variações de 0,59% em março e de 0,74% na medição feita com base no IPCA-15 (aferido entre os dias 15 de março e 14 de abril).
  • A evolução da “taxa de inflação” dos alimentos consumidos no domicílio, como parece claro, vinha desacelerando, saindo de um incremento de 0,15 pontos para apenas 0,07 pontos percentuais. A tragédia humanitária que atingiu o Rio Grande do Sul pode alterar esse cenário, embora ainda não se possa ter com antecipação os impactos das enchentes sobre os preços dos alimentos. O arroz, por exemplo, vinha em baixa nas últimas medições, com recuos de 1,89% até 14 de abril e de 1,93% nos 30 dias completos do mesmo mês, lembrando que o Estado responde por pouco mais de 70,0% da produção brasileira do grão.
  • Em abril, mais uma vez, praticamente toda a alta no custo da alimentação em casa concentrou-se na cebola (mais 15,63%), no tomate (14,09%), no mamão (22,76%) e café moído (3,08%). Na verdade, esses quatro produtos responderam por 93,0% do aumento nos preços da alimentação em domicílio, contribuindo ainda com 30,9% na composição do IPCA “cheio”.
  • Mencionados como um dos pontos de incerteza na trajetória futura da inflação pelo Copom e pretexto para limitar a redução dos juros na quarta-feira, os serviços mostraram desaceleração, com a variação saindo de apenas 0,10% para apenas 0,05%. Parte da desaceleração deveu-se à queda de 12,09% nos preços das passagens aéreas. Mesmo excluídas do cálculo, no entanto, a inflação dos serviços teria baixado de 0,46% em março para 0,13% em abril. Acumulada em 12 meses, a inflação nesta área saiu de 7,49% em abril do ano passado para 4,60% no mesmo mês deste ano, em linha com o desaquecimento relativo experimentado pela atividade no setor mais recentemente.