Inflação havia subido para mais de 1,0%, antes do anúncio do “tarifaço”

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 12 de março de 2022

O “tarifaço” decretado na quinta-feira pela Petrobrás deverá fazer com que as taxas de inflação continuem a subir ao longo das próximas semanas, sob impacto direto do salto nos preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. Mas a escalada dos preços, que pode não ter sido encerrada agora e nem deverá ser “compensada” pelo pacote “pró-poluição” aprovado pelo Congresso na semana que passou, deverá gerar igualmente efeitos secundários sobre os índices inflacionários, ao provocar novos aumentos de preços em cadeia, ao encarecer os custos de transporte de bens e mercadorias em toda a economia, nos casos do diesel e da gasolina.

A alta do botijão de gás tende a ser parcialmente compensada pelo chamado “auxílio-gás” destinado a famílias de renda mais baixa, mas ajudará a reduzir o poder de consumo de famílias de renda baixa-média e média. Tudo somado – e já contabilizando um novo aperto na política de juros –, as perspectivas para a atividade econômica tornam-se ainda mais incertas, com agravamento do clima de insegurança entre empresas, classe média e trabalhadores em geral.

Antes mesmo de capturar os aumentos mais recentes da Petrobrás, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo(IPCA) de fevereiro, medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)entre os dias 29 de janeiro e 25 do mês passado, veio acima das projeções do mercado, que trabalhava com alguma coisa em torno de 0,95% para a inflação do segundo mês do ano (a equipe do Itaú BBA, mais otimista, acreditava num IPCA de 0,90% para fevereiro). A inflação atingiu 1,01%, na taxa mais elevada para o mês desde 2015 (quando havia alcançado 1,22%) e acumula índices acima de 10% em 12 meses pelo quinto mês consecutivo, chegando a 10,54% no mês passado.

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Na projeção do banco, o IPCA tenderá a atingir 0,94% neste mês e 0,88% em abril, antecipando-se deflação (inflação negativa ou queda nos preços médios) de 0,31% para maio, o que seria um alento caso a previsão venha a ser referendada pela realidade. O Itaú BBA acredita que a possibilidade de recuo do IPCA em maio estaria relacionada à volta da bandeira amarela para tarifa de energia, mais baixa do que a bandeira tarifária de escassez hídrica agora em vigor. A incerteza está justamente na dificuldade de prever quais serão os rumos da guerra na Ucrânia e saber a duração dos reflexos do conflito sobre a economia global e sobre os preços das commodities, notadamente nos casos do petróleo, seus derivados e do gás natural.

Pressões antes do “tarifaço”

As taxas vinham subindo antes mesmo do “tarifaço” deflagrado na quinta-feira passada, como mostra o acompanhamento feito semanalmente pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) havia recuado de 0,49% nos 30 dias finalizados em 7 de fevereiro para 0,28% no fechamento de fevereiro, especialmente por conta do relativo alívio trazido pelos preços dos combustíveis e da energia. Mas voltaram a subir pata 0,47% nas quatro semanas encerradas em 7 de março, três dias antes do anúncio do “tarifaço”.A maior contribuição para a alta veio do setor de alimentos, onde a inflação passou de 0,18% na primeira semana de fevereiro para 0,46% na primeira de março, com alta de 13,71% para o grupo hortaliças e legumes. Destaques negativos para cenoura e batata inglesa, com saltos de 53,72% e 18,46%, respectivamente.

Balanço

  • De volta ao IPCA do IBGE, o estrago esperado na área dos combustíveis pode ser avaliado com base no comportamento do índice entre as quatro semanas encerradas em 11 de fevereiro e a taxa registrada para todo o mês passado. Excluídos gasolina, etanol, diesel e o botijão de gás, o IPCA pouco sofreria alteração em relação aos 0,99% registrados efetivamente com a inclusão de todos os grupos e subgrupos acompanhados pela instituição no IPCA observado até meados de fevereiro.
  • Mas, desconsiderados os mesmos itens, teria registrado pouco mais do que aqueles 1,01% acumulados nas quatro semanas do mês passado, aproximando-se de 1,1%. A diferença é que os preços da gasolina haviam registrado queda de 0,47%, com baixa de 5,04% para o etanol e recuo de 0,27% para o botijão, mais do que compensando o aumento de 1,65% registrado pelo diesel.
  • Obviamente, as tendências de baixa ou de menor variação (caso do diesel, que vinha subindo 3,78% até 11 de fevereiro) não deverão prevalecer daqui em diante, como bem mostra a atitude dos postos já na quinta-feira, reajustando par o alto seus preços antes mesmo de terem entrado em seus tanques combustíveis com preços “novos”.
  • O etanol entrou na conta, muito embora, como sabido e conhecido, seus preços não sejam ditados diretamente pela Petrobrás. O problema é que a gasolina é concorrente direta do etanol e as altas de um lado estimulam aumentos no outro (o que nem sempre ocorre quando um dos preços cai). Adicionalmente, as usinas de cana atravessam um período de transição entre o final da safra 2020/21 e o começo da seguinte, 2021/22, o que tende a gerar algum estresse nos preços até que a nova safra comece a entrar no mercado em volumes mais substanciais.
  • Na leitura das economistas Julia Passabom e Luciana Rabelo, do Itaú BBA, o IPCA de fevereiro “continuou apresentando índice de difusão elevado (de 73,2% em janeiro para 74,8% no dado de hoje) e núcleos subjacentes pressionados. No acumulado dos últimos 12 meses, observamos inflação em serviços ainda pressionada com efeito da inércia e inflação de bens acima do patamar observado nos últimos anos e sem sinais de desaceleração”.
  • Se o “índice de difusão” (que mede o percentual de produtos em alta no período) manteve-se elevado, os chamados núcleos do IPCA, indicadores que excluem preços mais voláteis ou sujeitos a oscilações mais expressivas entre um mês e outro, atingiram a maior taxa média em pelo menos 13 meses, atingindo 0,99% em fevereiro, frente a 0,87% em janeiro. Em 12 meses, os núcleos passaram a subir 8,38% frente a 7,86% em janeiro (e 3,22% nos 12 meses encerados em fevereiro do ano passado).