Investimento estrangeiro cai ao nível mais baixo na série histórica

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 29 de julho de 2021

O investimento estrangeiro no País (IDP) caiu, em junho, ao seu nível mais baixo na série histórica do Banco Central (BC), iniciada em 1995, e desabou 96,6% em relação a mesmo mês do ano passado, saindo de US$ 5,165 bilhões para apenas US$ 174,482 milhões, num tombo ainda de 89,1% frente a maio deste ano. Em igual período, o chamado investimento em carteira, ou seja, em ativos como ações e títulos, registrou recuo de 6,5% e atingiu US$ 5,127 bilhões em junho deste ano, diante de US$ 5,483 bilhões no mesmo mês de 2020, mas anotou elevação de 4,7% na passagem de maio para junho deste ano. Estes são capitais tipicamente especulativos e, portanto, voláteis por natureza, que circulam pelo mundo em busca de oportunidades de ganhos rápidos, sem compromissos maiores com os locais onde aportam. Embora tenham sofrido algum recuo em junho, acumularam no primeiro semestre forte avanço frente ao ano passado, atingindo níveis também historicamente elevados.

No caso do investimento direto, em geral identificado com a compra de participação em empresas já em funcionamento e expansão das operações de multinacionais instaladas no País, a tendência é de que os dólares trazidos por esses investidores permaneçam por prazos mais longos no mercado doméstico, o que significa riscos mais baixos de turbulências sempre associadas com a fuga de capitais em momentos de crise nas economias em geral. No primeiro semestre deste ano, o IDP chegou a subir 8,3% na comparação com os primeiros seis meses do ano passado, avançando de US$ 23,724 bilhões para US$ 25,691 bilhões. Mas a tendência mais recente tem sido de forte desaceleração. Para reforçar, no acumulado entre janeiro e maio, o IPD chegou a apresentar salto de 50,7% frente aos mesmos cinco meses de 2020, avançando de US$ 15,873 bilhões para US$ 23,919 bilhões (já considerando os dados revisados e atualizados pelo BC).

“Dólares andorinhas”

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Nos 12 meses terminados em junho deste ano, o corte nos valores investidos diretamente por estrangeiros atingiu US$ 19,197 bilhões, já que esse investimento recuou de US$ 65,826 bilhões entre julho de 2019 e junho de 2020 para US$ 46,629 bilhões nos 12 meses seguintes – um retrocesso de 29,2%. Os dólares da especulação global, estimulados pela liquidez excessiva nos mercados mundiais, que têm turbinado toda sorte de apostas de alto risco ao redor do globo, seguem tendências inversas por aqui, superando de longe as marcas de anos anteriores.

Balanço

  • A despeito do tropeço registrado em junho, o investimento em carteira anotou uma reviravolta frente ao ano passado. Na primeira metade de 2020, o País anotou a saída de US$ 26,195 bilhões, cenário revertido neste ano, com a entrada de US$ 17,598 bilhões (quer dizer, uma virada correspondente a US$ 43,793 bilhões).
  • A mudança de sinais foi puxada pelos mercados de ações e de títulos de dívida negociados aqui dentro. No caso das bolsas, o BC havia registrado a fuga de US$ 20,360 bilhões ao longo dos primeiros seis meses do ano passado. Neste ano, em igual período, as estatísticas mostram a entrada líquida de US$ 9,773 bilhões – valor recorde para um primeiro semestre em toda a série.
  • O mercado de títulos de dívida (públicos e privados) recebeu US$ 12,095 bilhões entre janeiro e junho deste ano, o melhor resultado para o semestre desde 2015 (quando chegaram a entrar no mercado doméstico US$ 21,421 bilhões). Para comparação, na primeira metade de 2020, os investidores retiraram do País algo como US$ 11,392 bilhões, considerando a mesma modalidade de investimento.
  • No acumulado em 12 meses até junho, os investimentos em carteira aproximaram-se dos valores do IDP para o mesmo intervalo, somando US$ 41,192 bilhões. Para comparação, nos 12 meses imediatamente anteriores perto de US$ 41,941 bilhões haviam deixado o País. Novamente, os principais mercados escolhidos pela alta especulação internacional foram os de ações e títulos de dívida negociados domesticamente.
  • Entre julho de 2019 e junho do ano passado, o mercado de ações chegou a perder US$ 22,473 bilhões e acumulou investimentos de US$ 22,901 bilhões nos 12 meses seguintes. O mercado de títulos de dívida, que havia anotado a fuga de US$ 26,453 bilhões, passou a registrar uma entrada líquida de dólares na faixa de US$ 23,529 bilhões.
  • As estatísticas externas do País continuam indicando cenários muito favoráveis, ainda que a participação de investimentos meramente especulativos tenha demonstrado avanço vigoroso nos últimos meses. No primeiro semestre deste ano, o salto de 51,6% no saldo da balança comercial (exportações menos importações de bens e produtos), de US$ 13,093 bilhões para US$ 19,848 bilhões, explica em grande parte a redução de 47,4% no déficit na conta de transações correntes. O rombo externo desabou de US$ 13,261 bilhões para US$ 6,975 bilhões. A conta do IDP cobriu com folga esse resultado negativo, superando o déficit em quase 3,7 vezes.
  • A relação entre o investimento direto no País e o déficit em transações correntes apresentou melhora sensível nos 12 meses encerrados em junho passado, isso porque o rombo caiu numa velocidade mais intensa do que o IDP. Enquanto o investimento baixou 29,2% diante dos 12 meses imediatamente anteriores, como visto, o déficit em transações correntes despencou 63,5%, de US$ 53,751 bilhões para US$ 19,637 bilhões.
  • A queda, no entanto, não foi exatamente “virtuosa”, já que refletiu em grande medida os impactos gerados pela pandemia sobre atividade econômica, o emprego e a renda. A retração da demanda produziu queda mais do que proporcional nas despesas em dólares do País nos mercados mundiais, fazendo encolher o rombo nas relações entre o Brasil e os demais países. O ciclo mais recente de alta nos preços das commodities contribuiu, ainda, para turbinar os resultados das exportações de minério de ferro, petróleo em bruto, soja, açúcar, carnes e outros produtos agrícolas (o que terminou agravando o processo de “primarização” da pauta de exportações, o que já seria tema para outra coluna).