Investimento federal atinge fundo do poço e gasto com juros cresce 13,4%

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 31 de janeiro de 2023

As contas do Tesouro Nacional no ano passado confirmam o achatamento continuado dos investimentos federais e, em direção oposta, o avanço retomado das despesas com juros da dívida pública. No primeiro caso, os recursos investidos pelo governo central alcançaram o fundo do poço, com tombo de quase 27,0% em termos reais na comparação entre 2021 e 2022. A valores de dezembro do ano passado, atualizados com base na variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o investimento murchou de praticamente R$ 62,121 bilhões em 2021 para R$ 45,558 bilhões um ano depois, num corte de R$ 16,563 bilhões.

Em valores nominais, o investimento realizado pelo governo central encolheu de 0,64% do Produto Interno Bruto (PIB), que já era historicamente muito baixo, para apenas 0,46% também entre 2021 e 2022. Foi o menor índice desde que a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) passou a publicar esse dado de forma sistemática, em 2008. O nível mais elevado havia sido registrado em 2014, quando os valores investidos chegaram a representar 1,34% do PIB – relação quase três vezes mais elevada do que aquela observada no ano passado. Para comparar, agora em valores reais, o investimento desabou 64,20% desde 2014, despencando de R$ 127,261 bilhões para aqueles R$ 45,558 bilhões. A conta de investimentos perdeu, em quase 10 anos, qualquer coisa ao redor de R$ 81,703 bilhões.

Com a escalada das taxas de juros básicas desde a segunda metade de março do ano passado, os gastos com juros entraram em alta, avançando de R$ 449,095 bilhões para R$ 509,261 bilhões a valores de dezembro do ano passado, correspondendo a um incremento de 13,40%. Ou seja, ao mesmo tempo em que o investimento sofreu corte de R$ 16,563 bilhões, os gastos com juros registraram um acréscimo de R$ 60,166 bilhões. Tomadas a valores correntes, quer dizer, sem correção com base no IPCA, as despesas com juros passaram a representar 5,12% do PIB, configurando a relação mais elevada em cinco ano e a sexta maior proporção na série histórica iniciada em 1997. Apenas para registro, as despesas com juros haviam alcançado 5,18% do PIB em 2017.

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Segundo maior gasto

Como consequência da política de juros tresloucados, tocada pelo Banco Central (BC) “independente”, a despesa nesta área consolidou-se como a segunda mais elevada na execução orçamentária, atrás apenas dos gastos com benefícios previdenciários. Essa configuração da execução orçamentária tende a causar urticária entre porta-vozes dos interesses do mercado financeiro. A ortodoxia econômica divide as despesas entre primárias e financeiras. Aquelas de caráter financeiro, quer dizer, juros e amortizações, são consideradas à parte e não entram, por isso mesmo, no cálculo do resultado primário (que corresponde à diferença entre receitas e despesas com o devido desconto de gastos financeiros). Sob o ponto de vista da contabilidade pública, os juros representam sim uma despesa. Como não sobram recursos provenientes da arrecadação de impostos, contribuições, taxas e de outras fontes para fazer frente ao gasto financeiro, para honrar os juros, o governo federal vê-se obrigado a vender títulos no mercado para captar recursos, ampliando seu endividamento.

Balanço

  • A despesa com juros no ano passado foi 48,3% mais elevada do que todos os recursos destinados ao pagamento da folha de pessoal e encargos, que vinham sendo achatados pelo governo. Na passagem de 2021 para 2022, em termos reais, os gastos com servidores sofreram baixa de 6,08%, caindo de R$ 365,608 bilhões para R$ 343,381 bilhões, num corte de R$ 22,227 bilhões.
  • A despesa primária total apresentou variação real de 2,14% ao passar de R$ 1,792 trilhão para R$ 1,830 trilhão, em grandes números, subindo o equivalente a R$ 38,388 bilhões. Mas com a inclusão dos juros, o gasto passa a apresentar crescimento de 4,40%. Nesta conta muito pouco ortodoxa, o gasto total do Tesouro avançou de R$ 2,241 trilhões para quase R$ 2,340 trilhões, o que correspondeu a um acréscimo de R$ 98,554 bilhões.
  • Ainda assim, a relação dessa despesa com o PIB baixou de 25,18% para 23,79% em função principalmente da maior variação nominal do produto, que teria avançado 10,53% na estimativa do BC (lembrando que esse índice não desconta a variação dos preços dos diversos componentes do PIB e, portanto, não deve ser entendido como a variação do volume das riquezas produzidas no ano pela economia em seu conjunto).
  • De volta ao tema, os juros perdem apenas para as despesas com o pagamento de benefícios previdenciários, que apresentaram variação de 2,57% entre 2021 e 2022, passando de R$ 789,179 bilhões para R$ 809,504 bilhões. A variação foi menos intensa do que aquela observada para a arrecadação líquida de contribuições dentro do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que avançou 6,31% em termos reais. A valores de dezembro do ano passado, a arrecadação no setor avançou de R$ 511,772 bilhões para R$ 544,084 bilhões. Enquanto a conta das despesas com benefícios mostrou acréscimo de R$ 20,325 bilhões, a arrecadação anotou incremento de R$ 32,312 bilhões. Esse comportamento fez o déficit da Previdência Social apresentar recuo de 4,32% na mesma comparação, baixando de R$ 277,408 bilhões para R$ 265,420 bilhões (ou R$ 11,987 bilhões a menos).
  • O resultado primário, sem a inclusão dos juros, trocou de sinais na saída de 2021 para 2022, passando de um déficit próximo a R$ 40,166 bilhões para superávit (receitas maiores do que despesas) de R$ 57,078 bilhões, numa “virada” de quase R$ 97,245 bilhões.
  • Se incluída a conta dos juros, ainda sem os devidos ajustes em geral realizados pela STN nesse tipo de cálculo, o resultado passa a ser negativo, ainda que tenha demonstrado redução entre aqueles dois anos. O rombo, nessa conta ainda preliminar, baixou de R$ 489,260 bilhões para R$ 452,183 bilhões, encolhendo 7,58% em termos reais.