Judiciário legislou tanto que deu ao Congresso o direito de julgar
O que está acontecendo no Brasil é capaz de despertar Montesquieu do sono de 270 anos: aqui, o Executivo julga (não apenas quando multa ou em processos administrativos, os PADs), o Legislativo julga (nas CPIs e cassações) e o Judiciário, que também julga, faz o serviço do Executivo (cria despesas) e do Legislativo (edita mais normas que o Senado e a Câmara juntos). É o caso da anistia para os envolvidos no 8 de janeiro de 2023.
O projeto zanzou nos gabinetes de três parlamentares do baixo clero, os deputados por São Paulo Guilherme Derrite (PP) e Paulinho da Força (Solidariedade), que nem estavam nos mandatos, e o senador catarinense Esperidião Amim (PP). Falam em dosimetria como se fosse medida de pinga. Talvez sequer conheçam a Parte Geral do Código Penal, que vai até o artigo 120. Dizem que é de 1940, mas ela é de 1984, com trocentas modificações. O artigo 59 explica como o juiz deve dosar culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade do réu; motivos, circunstâncias e consequências do crime; além do comportamento da vítima. Decide qual a pena e seu tamanho, o regime inicial de seu cumprimento (fechado, aberto, semiaberto) e pode trocá-la por outra, se possível. No cálculo, se vale do artigo 68 para atenuantes e agravantes, causas de diminuir e aumentar a cana brava.
São os parâmetros legais. Dentro deles, o julgador se refestela. Valem para qualquer pessoa, até para a pessoa cuja inelegibilidade pretendida pelos três Poderes resultou nessa bagunça toda: Jair Bolsonaro (PL). Mas isso era quando havia princípios como o da individualização da pena, do juiz natural, do duplo grau de jurisdição…