“Marasmo” da produção emperra modernização no setor industrial

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 02 de dezembro de 2023

Os anos de baixo crescimento, com períodos de verdadeira estagnação da indústria como agora, deverão cobrar um preço alto mais adiante, em um país que já enfrenta há tempos um nítido processo de desindustrialização, motivada por políticas econômicas hostis e decisões equivocadas nesta área, com o abandono de quaisquer formatos de política industrial, ausência de lideranças industriais de fato e interesses mais orientados, em parte do empresariado do setor, a objetivos de curtíssimo prazo. Os resultados da indústria, já decorridos os 10 primeiros meses do ano, mostram que a indústria literalmente não saiu do lugar, com crescimento nulo de sua produção na comparação com 2022, numa tendência que tem se repetido ao longo de quase todo o segundo semestre.

“Sem uma retomada do crescimento industrial, torna-se difícil dar robustez ao processo de sua modernização em direção à digitalização e à sustentabilidade, caminhos perseguidos pelos principais países do mundo por meio de suas estratégias industriais”, sustenta em sua análise mensal o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Na avaliação ainda do instituto, “no centro do marasmo que marca 2023 estão as atividades mais negativamente impactadas pelo elevado nível de taxas de juros que ainda persiste no País”. Diante dos desafios colocados à frente da indústria, complementa o Iedi, a paralisia atinge principalmente o setor de bens capital, reforçando a tendência de baixa no investimento em toda a economia.

Nos dados ajustados sazonalmente, excluídos aqueles fatores que ocorrem sempre em iguais períodos todos os anos e poderiam distorcer comparações, enquanto a indústria em geral variou meramente 0,1% em outubro, frente ao mês anterior, após tem registrado zero de crescimento na passagem de agosto para setembro, a produção de bens de capital (máquinas, equipamentos, instalações industriais e outros) caiu 1,1%. Para relembrar, a taxa dessazonalizada em setembro também havia sido negativa, com baixa de 2,2%. Naqueles dois meses, segundo a pesquisa mensal da produção industrial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção de bens de capital acumulou redução de 3,2%.

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Perdas sucessivas

Na comparação com os mesmos meses do ano passado, a indústria de bens de capital chegou em outubro ao sétimo mês de resultados negativos, ao anotar perda de 10,3% em outubro. Apenas para registrar, nos dois meses anteriores, setembro e agosto, o setor havia encolhido 12,4% e 13,1% respectivamente. Em 12 meses, o setor encolheu 9,0% e sua produção encontra-se 3,7% abaixo dos níveis de fevereiro de 2020, antes da pandemia, com perdas atingindo inimagináveis 37,0% na comparação com agosto de 2013, quando havia alcançado seu melhor desempenho em toda a série histórica do setor, quer dizer, há pouco mais de 10 anos.

Balanço

  • A produção de bens intermediários, indústria que “alimenta” todo o restante do setor industrial, fornecendo matérias primas e insumos em geral, avançou 0,6% e 0,9% em setembro e outubro, depois de ter encolhido 1,2% entre maio e agosto. A comparação mensal, quer dizer, considerando os mesmos meses de 2022, mostra o terceiro mês de resultados relativamente positivos para o segmento, com taxas de crescimento saindo de apenas 0,1% em agosto para 1,2% em setembro e 1,3% em outubro.
  • Parece ser uma reação, mas com ímpeto ainda insuficiente para fazer frente às perdas acumuladas neste ano, tanto que a produção continua estagnada em relação ao ano passado, com leve recuo de 0,1% na comparação com os 10 primeiros meses deste ano e o mesmo intervalo de 2022 e simplesmente zero de variação em 12 meses.
  • Entre altos e baixos, o setor de bens intermediários conseguiu superar os níveis alcançados em fevereiro de 2020, avançando 2,7% nessa comparação. Mas ainda registra perdas de 15,3% em relação a maio de 2011, quando a produção havia registrado seu nível mais elevado na série de dados do IBGE.
  • A produção de bens de consumo duráveis, que dependem não apenas dos níveis de renda das famílias, mas igualmente da oferta de crédito e de seus custos, ainda escorchantes para o consumidor, continuou em terreno negativo, depois de um fugaz avanço em agosto, provavelmente como resposta às medidas de estímulo às vendas de automóveis.
  • Em agosto, a pesquisa do IBGE havia identificado uma variação de 7,8% em relação a julho e de 2,8% na comparação com agosto do ano passado. Mas em setembro e outubro, a produção de duráveis caiu 4,4% e 2,4% frente aos meses imediatamente anteriores. Tomando como base setembro e outubro do ano passado, a produção caiu 3,0% e 3,2%, passando a acumular incremento de 2,5% em 10 meses e de 2,3% nos 12 meses encerrados em outubro deste ano, diante dos 12 meses anteriores.
  • O setor tem sido um dos mais castigados pela crise no setor industrial, com a produção de duráveis mantendo-se 22,1% inferior aos níveis de fevereiro de 2020. Se comparada a março de 2011, quando a produção chegou a seu melhor momento na série da pesquisa, a queda chega a 42,2%.
  • A produção de semi e não duráveis, categoria que inclui bebidas, bens alimentícios, vestuário, calçados e outros segmentos, já havia caído 1,8% em setembro, frente a agosto, recuou 0,3% em outubro, acumulando redução de 2,1%. Considerando outubro do ano passado como base, a produção no mesmo mês deste ano avançou 4,0%, no terceiro mês de crescimento nesse tipo de comparação.
  • A indústria de alimentos, que aumentou sua produção em 4,3% frente a outubro do ano passado, respondeu sozinha por alguma mais do que metade da taxa de crescimento da indústria em geral. O salto de 10,8% na produção de coque, derivados de petróleo e biocombustíveis ajudou a puxar a comparação mensal, embora 13 entre os 25 setores acompanhados pelo IBGE tenham apresentado perdas em relação ao décimo mês do ano passado.