Melhoras no mercado de trabalho escondem distorções persistentes

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 01 de setembro de 2022

Os números do mercado de trabalho, aferidos pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), continuavam apontando dados recordes para o total de pessoas dentro da força de trabalho (soma de pessoas empregadas e em busca de empregos) e no número de trabalhadores ocupados. Mas também registravam recordes para o total de pessoas que trabalham por conta própria, para o número de empregados sem carteira no setor privado e, portanto, para aqueles lançados à informalidade por falta de oportunidades no mercado formal.

Mais claramente, como demonstra a mais recente edição da pesquisa, os avanços observados nos grandes números do mercado escondem distorções persistentes nesta área, que podem complicar as perspectivas de sustentação da atividade econômica daqui em diante. Principalmente diante das expectativas menos animadoras para o desempenho da economia a partir do trimestre final deste ano, diante dos efeitos dos juros altos sobre o lado real da economia, das perspectivas a cada dia mais sombrias para a conjuntura internacional, com pressões inflacionárias persistentes, desarticulação das cadeias de suprimento de bens, desaquecimento da atividade nas principais economias globais – todos esses fatores agravados pelo conflito que se alonga no leste europeu.

Aos dados da pesquisa, então. Os destaques ficam na conta da redução da taxa de desocupação e no número de trabalhadores desempregados, assim como para o aumento no número de pessoas ocupadas. A taxa de desemprego saiu de 13,7% no trimestre maio a julho de 2021 para 10,5% no trimestre finalizado em abril deste ano, recuando até 9,1% nos três meses encerrados em julho de 2022. Há nítida tendência de baixa, como parece óbvio, explicada pela retração no total de desocupados e pelo crescimento do emprego. A taxa, no entanto, continua muito acima dos níveis registrados antes da recessão de 2015-2016, quando havia flutuado entre 6,5% e 7,8%.

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Desemprego em baixa

As pessoas desempregadas, que chegaram a somar perto de 14,407 milhões no período entre maio e julho de 2021, passaram a representar 9,882 milhões no mesmo trimestre deste ano, em queda de 31,4% (quer dizer, 4,525 milhões a menos). Houve redução de 12,9% em relação ao trimestre imediatamente anterior (fevereiro a abril de 2022), com 1,467 milhão de desempregados a menos. A despeito dos avanços, aquele número ainda era 55,3% mais alto do que os 6,363 milhões de desocupados identificados pela pesquisa no trimestre final de 2014. O total de trabalhadores ocupados, por sua vez, cresceu 2,2% na passagem do trimestre finalizado em abril deste ano para o mesmo período encerrado em julho, saindo de 96,512 milhões para 98,666 milhões, com a criação de 2,154 milhões de vagas. Comparado ao trimestre maio-julho de 2021, quando a PNADC registrava 90,666 milhões de ocupados, foram abertas mais 8,0 milhões de ocupações.

Balanço

  • As estatísticas trazidas a público pela PNADC sugerem que o mercado de trabalho não conseguiu recuperar-se plenamente dos estragos causados pela recessão no começo da segunda metade da década passada e, mais recentemente, pela pandemia. Afinal, quando se considera o chamado “nível de ocupação”, taxa que afere a proporção da população de 14 anos ou mais com alguma forma de ocupação, seria preciso avançar mais na geração de empregos para que a economia pudesse retomar a relação observada no final de 2014.
  • No quarto trimestre daquele ano, o nível de ocupação encontrava-se em 58,5%, demonstrando que quase seis em cada 100 pessoas com idade de 14 anos ou mais haviam conseguido colocação no mercado de trabalho. O mesmo indicador chegou a quase 57,0% no trimestre entre maio e julho deste ano. Numa estimativa rápida, para sustentar o mesmo nível de ocupação alcançado ao final de 2014, a economia deveria ter gerado 2,655 milhões de empregos além dos 98,666 milhões de fato observados, elevando aquele número para algo como 101,32 milhões, num avanço adicional de 2,7%.
  • Essa variação teria reduzido o total de desempregados para um número muito próximo de 7,2 milhões, numa queda de 26,9% frente ao dado mais recente. A taxa de desocupação, nesta hipótese, seria reduzida de 9,1% para 6,7% – equivalente àquela anotada até 2015.
  • O IBGE realiza uma aproximação para estimar o número de trabalhadores informais, somando empregados sem carteira do setor privado, empregados domésticos sem carteira assinada, trabalhadores por conta própria e empregadores sem registro na Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), além de trabalhadores que prestam serviços para a própria família, muitas das vezes sem remuneração. Essa aproximação registrava, para o trimestre entre maio e julho deste ano, um total de 39,294 milhões de informais, perto de 560,0 mil a mais do que no trimestre anterior (+1,4%) e 2,866 milhões acima do trimestre maio-julho de 2021 (+7,9%).
  • Naquela estimativa, a informalidade teria respondido por 26,0% e por 35,8% de todos os empregos criados respectivamente entre os trimestres encerrados em abril e julho deste ano e entre os trimestres finalizados em julho de 2021 e em igual mês deste ano. Se forem incluídos os trabalhadores sem carteira a serviço do setor público, no entanto, os números ganham outra dimensão, mais preocupante ainda.
  • Neste caso, o total de informais teria saído de 38,597 milhões no trimestre encerrado em julho do ano passado para 41,231 milhões entre fevereiro e abril deste ano, atingindo 42,145 milhões no trimestre terminado em julho de 2022. Nesta hipótese, a informalidade teria contribuído com 44,4% do total de ocupações geradas 12 meses e por 42,4% do avanço registrado em relação ao trimestre fevereiro a abril deste ano.
  • “A informalidade elevada continua um problema a ser sanado”, anota do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), acrescentando que o total de trabalhadores subocupados por insuficiência de horas trabalhadas aumentou 51,8% deste o mesmo trimestre de 2014 (maio/julho), passando de 4,274 milhões para 6,486 milhões (mas em baixa de 17,1% frente a 2021). O total de pessoas em situação de desalento, na mesma comparação, quase triplicou, saltando de 1,452 milhão para 4,229 milhões (embora tenha baixado 19,8% sobre o mesmo trimestre de 2021).