Mercados projetam para março inflação mais alta em sete anos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 26 de março de 2022

O “tarifaço” dos combustíveis, em vigor desde 11 de março, levou os grandes bancos e suas assessorias econômicas a revisar para cima as projeções para a inflação de março, depois de uma sequência de previsões desautorizadas pela realidade dos preços. A menos de uma semana para o final do mês, as previsões mais conservadoras ainda sugeriam uma taxa levemente abaixo de 1,0%, mas algumas apostas já flertavam com índices inflacionários ligeiramente acima de 1,30% – no que seria a taxa mais alta desde março de 2015, quando a inflação havia atingido 1,32%.

Divulgado na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de março veio acima do esperado pelo setor financeiro, batendo em 0,95% na medição feita entre 12 de fevereiro e 16 de março, capturando muito parcialmente ainda o forte reajuste imposto pela Petrobrás aos preços da gasolina, diesel e gás de cozinha, em vigor desde 11 de março. Os mercados, que já vinham errando para menos nas previsões anteriores, aguardavam um índice em torno de 0,85% nas estimativas mais frequentes, enquanto o Itaú BBA, situando-se na ponta menos otimista, acreditava numa variação de 0,89%.

Na versão do banco, os itens de higiene pessoal, alimentos no domicílio e ainda a gasolina subiram mais do que o esperado, com alívio para as pressões exercidas pelos preços dos serviços, “com destaque para passagens aéreas, cursos regulares e aluguel”. Na comparação entre o IPCA de fevereiro e o índice aferido ao longo da última quinzena daquele mês e as primeiras duas semanas de março, houve certo recuo na taxa, que saiu de 1,01% para aqueles 0,95%, com o fim do foco de alta centrado no segmento de educação (por conta da alta das matrículas e das mensalidades escolares) e ainda porque os aluguéis focaram ligeiramente mais baratos.

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Altas e baixas

Os cursos regulares, por exemplo, chegaram a experimentar salto de 6,67% no IPCA de fevereiro e apontaram estabilidade nos 30 dias encerrados em 16 de março, com zero de variação. O aluguel, que havia registrado variação de 0,98%, passou a recuar 0,04%. As passagens aéreas, que já haviam baixado 5,0% em fevereiro, passaram a cair 7,55%. Outros itens, relacionados acima pelo Itaú BBA, subiram mais do que o esperado, como a gasolina, com variação de 0,83% (modesta ainda, considerando o reajuste autorizado no dia 10 deste mês), mas havia caído 0,47% em fevereiro. Artigos de higiene saíram de uma taxa de 1,43% para alta de 3,98%, enquanto o custo da alimentação no domicílio avançou 2,51% nas duas primeiras semanas de março, acelerando o ritmo da alta nos preços do setor, que havia sido de 1,65% em fevereiro.

Balanço

  • Nas estimativas anunciadas em 10 de março, quando foi divulgado o IPCA de fevereiro, no mesmo dia do anúncio do “tarifaço”, o Itaú BBA trabalhava com estimativas de 0,94%, 0,88% e -0,31% para o IPCA de março, abril e maio (numa queda explicada pela saída da bandeira tarifária de escassez hídrica para a amarela, mais baixa, no caso da energia elétrica residencial). Revisadas, aquelas projeções passaram a apontar variações de 1,31% em março, de 1,11% para abril e deflação (queda nos preços) de 0,26% para maio.
  • Até 18 de março, na média das estimativas coletadas pelo Banco Central (BC) em seu relatório Focus, na mediana das projeções do setor financeiro, o IPCA estava previsto em 0,99% para este mês, recuando para 0,88% em abril e finalmente recuando 0,20% em maio. Mas o mercado tem sido surpreendido de forma desfavorável nos últimos meses, ao trabalhar com previsões mais otimistas do que autorizado pelos dados da realidade, em função não só de problemas na modelagem definida pelo setor para antecipar indicadores, mas também por conta de uma visão um tanto distanciada do lado real da economia.
  • Mesmo com o dólar mais favorável, sob o ponto de vista das pressões inflacionárias, as altas de preços já contratadas para as próximas semanas tendem a produzir índices de inflação mais carregados, dada a própria dimensão dos aumentos já contratados, especialmente no setor de combustíveis, com todos os impactos sobre as diversas cadeias produtivas, de alimentos a bens eletrônicos e eletrodomésticos, de roupas a cosméticos. A alta já em curso nos custos dos transportes tende a encarecer todos aqueles produtos (e mais um pouco), fazendo persistirem pressões altistas em toda a economia, especialmente em um momento de alta de custos em todo o mercado internacional.
  • Gasolina, etanol, diesel e gás de botijão, por exemplo responderam, somados, por menos de 4,0% da inflação medida pelo IPCA-15 de março, acumulando uma taxa conjunta de 0,04%. A contribuição relativamente baixa foi assegurada pela queda de 4,70% nos preços do etanol, que agora entraram em alta nos postos, influenciada pelo aumento da gasolina.
  • Em fevereiro, ao contrário, os mesmos quatro itens haviam anotado deflação de 0,08%, com baixas de 0,47%, de 5,04% e de 0,27% para a gasolina, o etanol e o gás. O botijão e a gasolina passaram a subir 1,29% e 0,83%, pela ordem, nas quatro semanas encerradas em 16 de março, numa reviravolta concentrada basicamente nas duas primeiras semanas deste mês. A queda nos preços do etanol passou a ser de 4,70%, em desaceleração e já indicando alguma alta no final da primeira quinzena de março. Já os preços do óleo diesel escalaram de 1,65% para 4,10%.
  • Detalhe final: os perfumes, por conta da alta do petróleo, sozinhos responderam por 12,43% do IPCA-15 de março, com salto de 12,84% em 30 dias (diante de alta de 6,17% em fevereiro).