Coluna

Na indústria, cada vez menos setores conseguem manter produção em alta

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 02 de agosto de 2019

Dois
números específicos chamam a atenção na pesquisa da produção industrial de
junho divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) e parecem retratar a evolução da indústria no curtíssimo prazo, ambos
pouco lisonjeiros. O chamado “índice de difusão”, que aponta o percentual de
produtos em crescimento ao longo de determinado período, desabou de 63% em maio
para 22,4% em junho, indicando que pouco mais de um quinto dos produtos
acompanhados pela pesquisa chegaram a apresentar algum avanço na comparação com
o mês imediatamente anterior.

Trata-se
do índice mais baixo para o período desde os primeiros anos da década em curso,
equiparando-se aos 23,0% anotados em junho de 2014, quando a economia já
namorava seriamente com a recessão. O segundo dado considera a comparação com
junho de 2018. Neste caso, somente 37,8% dos produtos estiveram em crescimento,
menor percentual desde junho de 2014, quando havia alcançado 30,7%. Esses
indicadores mostram claramente que o setor industrial enfrenta dificuldades
evidentes para conseguir descolar, um problema que não é recente mas continua
sem merecer a devida atenção da equipe que passou a ditar os rumos da política
econômica desde janeiro passado.

A
indústria vai mal já há alguns trimestres, configurando um cenário nitidamente
recessivo. Sempre na comparação com igual período do ano anterior, a produção
caiu 1,2% no último trimestre de 2018, despencou 2,3% no primeiro trimestre
deste ano e baixou 1,0% no segundo trimestre – uma queda em ritmo menor
aparentemente por conta de um efeito calendário (já que a produção havia sido
severamente afetada pela greve dos caminheiros no final de maio do ano passado,
refletindo-se ainda ao longo das primeiras semanas do mês seguinte). Na
comparação com o mês imediatamente anterior, a produção sofreu a segunda baixa
consecutiva em junho, recuando 0,6% depois de anotar variação negativa de 0,1%
em maio. O retrato fica ainda pior quando comparado a junho do ano passado.
Neste caso, a produção encolheu 5,9%, levando o resultado acumulado no primeiro
semestre para uma retração de 1,6%.

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Alívio, a médio
prazo

Na
avaliação do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), a
liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS),
anunciada pelo governo num “reconhecimento aos graves problemas de
insuficiência de demanda da economia”, e a redução, na quarta-feira, dos juros
básicos para 6,0% (saindo dos 6,5% que vigoravam desde março de 2018) poderão
até ajudar “a reverter a atual situação desfavorável da indústria, mas podem
levar tempo para surtirem efeito”. A se considerar a experiência anterior,
ainda no governo Temer, os impactos tendem a ser limitados no tempo, podendo se
esgotar rapidamente se não vierem novas medidas de reforço à demanda, de forma
mais estruturada. “Por isso, o crescimento da indústria em 2019 não está
garantido”, acrescenta o instituto.

Balanço

·  
No
caso da redução dos juros, especialistas estimam que seus efeitos sobre a
economia real em geral demoram algo em torno de seis meses para começarem a ser
percebidos. Muito obviamente, trata-se de uma boa notícia, após meses de
relutância do BC. Mas veio muito tarde para resgatar a economia ainda neste
ano.

·  
O
Iedi aponta outro dado que pode trazer algum “alento”. De acordo com análise do
instituto, o número de ramos da indústria em queda foi reduzido de 21 no
primeiro trimestre para sete no segundo, sempre em 2019. “Em outros termos,
pode ser que estejam se tornando mais localizados os retrocessos industriais
com o avançar do ano, o que traz possibilidades maiores de superação da fase
recessiva”, considera a instituição.

·  
No
mês de junho, no entanto, os dados da pesquisa mostram um cenário de piora.
Nada menos do que 76,9% dos setores (20 entre os 26 pesquisados) sofreram
perdas na comparação com junho do ano passado e apenas seis conseguiram
respirar com algum alívio (com destaque para a indústria de impressão e
reprodução de gravuras, que experimentou salto de 11,2% em relação a junho do
ano passado).

·  
Ainda
sob os efeitos da tragédia de Brumadinho, que derrubou a produção de minério de
ferro, e da queda na extração de petróleo (aqui influenciada parcialmente pelo
desmonte da Petrobrás), a indústria extrativa apresentou a pior queda no mês,
desabando 16,3%.

Passados mais de 12 meses desde a paralisação
dos caminhoneiros, a produção industrial não conseguiu retomar o ritmo
anterior, com perdas ainda de 4,1% na comparação entre junho deste ano e abril
de 2018. Em seu nível atual, a produção encolheu 17,9% desde maio de 2011.
Entre setembro de 2013 e junho passado, a indústria de bens de capital sofreu
perda de 32,7%.