No lado real, massacre e retrocesso. Mas mercados vivem semana de ganhos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 08 de maio de 2021

A semana termina com notícias trágicas para o País que resiste à falta de humanidade e de ética de suas autoridades e pouco animadoras para o lado real da economia – já que os rentistas ganharam novo presente do Banco Central (BC), com mais uma alta dos juros básicos. O massacre na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, com 25 assassinatos, e o discurso de ódio, alimentado desde Brasília, não podem ser dissociados, compondo o mesmo caldo pegajoso de ignorância, preconceito, discriminação e barbárie. Enquanto o País caminha para superar 420,0 mil mortes desde o começo da pandemia, os mercados ignoram a realidade e reagem como se a normalidade estivesse restaurada. Em seu mundinho de fantasia, a Bolsa subiu quase 2,7% ao longo da semana e o dólar desabou praticamente 3,9%, para R$ 5,23, desconsiderando mesmo os riscos de turbulência associados à “CPI da Covid”, que começa a expor as entranhas do governo e de sua pouca disposição para enfrentar a pandemia.

Depois de confirmar a retração na indústria, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)apresentou, na sexta-feira, os números pouco lisonjeiros do comércio varejista. O encolhimento no setor já era esperado, diante da avalanche de casos de contágio e de mortes causadas pelo Sars-CoV-2 e da falta premeditada de medidas de apoio a empresas e às famílias desde o final de 2020. A ausência de “surpresas”, no entanto, não esconde a dimensão da crise, que tende a derrubar o Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre e deve se agravar ainda em abril, quando os casos de Covid-19 e de mortes atingiram níveis recordes (até o momento) e a vacinação patinava no descaso e inoperância. A capacidade de assegurar taxas crescentes de imunização contra o vírus poderá ser determinante para definir os rumos da economia mais à frente. Uma capacidade que o País, infelizmente, não tem sido capaz de demonstrar ate aqui.

Ladeira abaixo

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O volume de vendas do comércio varejista “tradicional”, segundoa pesquisa mensal do IBGE, recuou 0,6% na saída de fevereiro para março em todo o País, com tombo de 5,7% em Goiás na mesma comparação. Os resultados do varejo ampliado, que inclui concessionárias de veículos e motos, lojas de autopeças e de materiais de construção, não foram melhores. Ao contrário. As vendas no segmento baixaram 5,3% no País e 4,1% no Estado, anulando os ganhos registrados em janeiro e fevereiro deste ano. Na verdade, dado o fraco desempenho mais recente das vendas, o varejo atingiu em março deste ano retrocesso de 6,7% em relação a fevereiro do ano passado, antes da pandemia, considerando os números para Goiás – um desempenho bem pior do que a média observada para todo o País, que apresentou recuo de 0,3%. No varejo ampliado, com contribuição principalmente dos materiais para construção, persiste avanço levemente inferior a 1,0% no Estado (também comparando março deste ano a fevereiro de 2020), o que contrasta com a perda de 3,6% acumulada ao longo do período em todo o País.

Balanço

  • A comparação com março deste ano com igual mês do ano passado, quando as primeiras medidas de distanciamento social foram adotadas pelos Estados, exatamente por esse motivo, vem carregada de distorções e não deve ser adotada para projetar resultados à frente. Para o varejo em todo o Brasil, as vendas cresceram 2,4% no caso do comércio varejista tradicional, mas saltaram 10,1% no varejo ampliado, com saltos de 27,6% para veículos, motos e peças, e de 33,4% no caso dos materiais de construção.
  • Em Goiás, nem mesmo a base mais reduzida ajudou a melhorar os números para o varejo convencional, que encolheu 4,1% frente a março de 2020, enquanto o comércio ampliado apresentou elevação de 4,9% (com altas de 20,6% para os veículos e de 11,8% para materiais de construção).
  • Pesaram, no caso do varejo restrito, em Goiás, os tombos de 12,6% nas vendas de hiper e supermercados, e de 32,2% para lojas de tecidos, vestuário e calçados. As lojas de móveis e eletrodomésticos e de medicamentos e cosméticos, respectivamente, anotaram altas de 22,2% e de 20,0% ainda em relação a março de 2020.
  • Ainda em Goiás, é preciso recordar que em março do ano passado as vendas do varejo restrito haviam sofrido baixa de 8,3%, com redução de 5,3% para o comércio varejista ampliado. A tendência mais recente, utilizando índices de vendas dessazonalizados pelo IBGE (quer dizer, excluídos fatores que ocorrem em períodos determinados do ano e que podem distorcer comparações), mostra desaquecimento importante para o setor, tanto em Goiás como no restante do País.
  • No caso goiano, o varejo restrito encolheu pouco mais de 11,0% entre agosto do ano passado, quando atingiu o maior nível desde a pandemia, e março deste ano. Entre outubro passado e março de 2021, as vendas do comércio ampliado apontam baixa de 5,9%. As estatísticas pioram muito quando são levados em dados de mais longo prazo da série histórica. O varejo restrito atingiu seu melhor momento, em Goiás, em maio de 2014. Desde lá, desabou 32,9% (o que significa dizer que o setor havia perdido, em março deste ano, praticamente um terço de tudo o que vendeu naquele mês).O comércio ampliado registrou seu desempenho mais vistoso em agosto de 2012 e chegou a março deste ano carregando perdas de 31,9%.
  • Outras comparações desnudam as dimensões do processo de derretimento das vendas no País como um todo. Até outubro do ano passado, comparadas a fevereiro, as vendas do varejo restrito cresciam 6,6%. Em março deste ano, apresentaram recuo de 0,3% na comparação com fevereiro de 2020. Para o varejo ampliado, depois de crescerem 4,0% entre fevereiro e novembro, as vendas passaram a cair 3,6% em março passado.

O desaquecimento atingiu até mesmo o setor de materiais de construção, sugerindo uma inversão na tendência de crescimento observada nos meses anteriores. As vendas nesta área sofreram queda de 5,6% na saída de fevereiro para março deste ano, em todo o País. Até setembro de 2020, agora em relação a fevereiro daquele mesmo ano, as lojas do setor cresciam a uma taxa de 29,3%. Mas o índice foi rebaixado para 13,9% em março deste ano (ainda tomando os níveis pré-pandemia como base).