Quinta-feira, 28 de março de 2024

Coluna

O que Neymar, PSG e as semifinais da Champions League têm a ver com política internacional

Publicado por: Marcelo Mariano | Postado em: 26 de abril de 2021
Neymar ao lado do CEO da Qatar Airways, dois representantes de diferentes estratégias de soft power usadas pelo pequeno, rico e ambicioso país do Oriente Médio | Foto: reprodução

Historicamente, esporte e política caminham lado a lado. Segundo Henry Kissinger, um dos mais importantes diplomatas americanos, as Olimpíadas de Pequim, em 2008, foram realizadas “no exato momento em que a crise econômica começava a sacudir o Ocidente [e] concebidas como uma expressão do ressurgimento chinês”.

E esse é só um entre tantos exemplos. Os Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936, e os de Moscou, em 1980, também foram importantes instrumentos políticos da Alemanha nazista e da União Soviética, respectivamente.

No futebol, não é diferente. Quando Neymar entrar em campo nesta quarta-feira pelas semifinais da Champions League, lembre-se: isso só é possível por causa do soft power do Catar, um pequeno, rico e ambicioso país do Oriente Médio, que será a sede da Copa do Mundo de 2022, e cujo governo é dono do Paris Saint-Germain.

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Em resumo, o soft power, termo cunhado pelo cientista político americano Joseph Nye, é a capacidade de um país “alcançar os resultados que prefere na política mundial porque outros países querem segui-lo ou concordam com uma situação que provoca tais resultados”, ou seja, uma forma de projetar poder sem usar recursos militares.

No caso do Catar, o investimento no futebol é uma estratégia de soft power. Contratar jogadores caros demonstra poder, a imprensa e os torcedores falam sobre o país e cada título do PSG é também uma conquista política.

O Catar tem outras estratégias de soft power, como a emissora Al Jazeera, uma referência jornalística no mundo árabe-muçulmano, e a companhia aérea Qatar Airways, frequentemente reconhecida como a melhor do mundo e que colocou o país no mapa do turismo.

Quando Neymar foi comprado pelo PSG em 2017, o clube francês – ou melhor, o governo do Catar – desembolsou 222 milhões de euros, fazendo do jogador brasileiro a contratação mais cara da história do futebol.

Na sua frota de 228 aviões, a Qatar Airways tem dez Airbus A380, o maior do mundo. Um único modelo passa de 400 milhões de dólares. Em outras palavras, Neymar foi um trocado. Todo esse investimento no PSG, que começou em 2011, mudou o futebol e colocou o clube francês na primeira prateleira da Europa.

Dez anos depois, conquistar a Champions League, a principal competição do continente, seria a consagração desse projeto. Na semifinal, o PSG enfrenta o Manchester City, que, por sua vez, recebe investimento dos Emirados Árabes Unidos.

Os dois países são rivais regionais. Em 2017, chegaram a romper relações diplomáticas. A rivalidade também está presente no futebol. Em 2019, os Emirados Árabes Unidos sediaram a Copa da Ásia, e o Catar eliminou os donos da casa nas semifinais por 4 a 0, antes de derrotar o Japão na final e vencer seu primeiro grande torneio.

Portanto, a partida entre PSG e Manchester City, apesar de ocorrer em solo europeu, será também uma disputa política entre países do Oriente Médio.

*Marcelo é assessor internacional da Prefeitura de Goiânia e vice-presidente do Instituto Goiano de Relações Internacionais (Gori). Escreve sobre política internacional às segundas-feiras.