O tombo na exportação de carne e a dependência em relação à China

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 09 de novembro de 2021

Ainda sob bloqueio chinês, as exportações goianas de carne bovina congelada e resfriada despencaram 62,2% entre setembro e outubro deste ano, ajudando a derrubar o total exportado pelo Estado na passagem de um mês para o seguinte. Na comparação com outubro do ano passado, o tombo das vendas de carne bovina para o restante do mundo chegou a 44,4%, limitando a variação das exportações totais a apenas 1,56% – apenas para relembrar, em setembro havia sido registrada alta de quase 17,0% frente a igual mês de 2020.

A desaceleração acentuada levou a balança comercial do Estado para terreno negativo em outubro pela primeira vez desde fevereiro deste ano, quando o déficit entre exportações e importações havia se aproximado de US$ 88,0 milhões (saindo de um resultado também negativo em US$ 83,0 milhões no primeiro mês deste ano). As exportações goianas saíram de US$ 761,471 milhões em setembro para US$ 569,309 milhões no mês seguinte, caindo 25,2%. A baixa nas vendas externas de carne bovina foi responsável por quase 60% da redução observada (mais precisamente 59,4%) para o total das vendas externas em outubro.

Os embarques de carne bovina resfriada e congelada desabaram de quase US$ 183,50 milhões em setembro para US$ 69,338 milhões. A China respondeu por apenas 4,5% desse total, importando de Goiás US$ 3,119 milhões em outubro, míseras 486 toneladas, diante de US$ 136,0 milhões em setembro (74,1% de toda a exportação goiana de carne bovina no mês), correspondendo a 21,923 mil toneladas. Tanto em volume como em valor, o tombo foi de praticamente 98%.

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As importações saltaram 44,9% de setembro para outubro, de US$ 455,387 milhões para US$ 659,914 milhões, marcando novo recorde mensal. O avanço ficou concentrado na importação de energia elétrica, que tem disparado neste ano para suprir o mercado doméstico e impedir um colapso no fornecimento em função da crise hídrica. A compra de eletricidade pelo Estado saltou de US$ 26,631 milhões em setembro para US$ 196,738 milhões em outubro (mais 638,8%), respondendo por 83,2% do aumento experimentado pelo total das importações goianas no período. Como resultado, o superávit comercial (exportações menos importações) de US$ 306,084 milhões registrado em setembro transformou-se em déficit de US$ 90,605 milhões em outubro.

Dependência e erros

O que parece um problema apenas pontual, limitado a um único produto, serve para colocar sob foco, mais uma vez, os riscos envolvidos na dependência em relação à China. De certa forma, dadas as dimensões daquele mercado e seu crescente apetite por commodities, seria esperada certa dose de concentração das exportações. Trata-se de um tema complexo, mas que não tem sido tratado devidamente pelas autoridades brasileiras, seja para utilizar a posição de grande fornecedor como base para negociações envolvendo a possibilidade de integrar no mercado internacional outros setores da economia, seja buscando construir alternativas que permitissem a abertura de novos mercados lá fora. Nada a estranhar aqui. Afinal, truculência e incapacidade de pensar estrategicamente têm sido a marca do desgoverno em Brasília.

Balanço

  • No caso da carne bovina, como se sabe, os embarques foram suspensos em setembro, mas afetaram as exportações mais duramente em outubro e, até aqui, não há perspectiva de retomada dos carregamentos com destino aos portos chineses. A suspensão esteve relacionada à confirmação de dois casos de uma variedade atípica da chamada encefalopatia espongiforme bovina (EBB), mais conhecida como doença da vaca louca. A ocorrência foi observada em frigoríficos de Nova Canaã do Norte (MT) e de Belo Horizonte (MG) em animais mais erados e não colocam em risco a saúde humana.
  • A estratégia chinesa, que certamente pode envolver interesses além daqueles meramente sanitários, causou a paralisação dos carregamentos de carne para aquele país, que neste ano passou a responder por 68,5% de toda a exportação de carne bovina de Goiás, causando efeitos em cadeia sobre toda a pecuária. Os preços da arroba do boi gordo despencaram pouco mais de 15% entre o começo de setembro e a primeira semana de novembro, estacionando em níveis quase 5,5% abaixo dos preços registrados em igual período do ano passado, de acordo com acompanhamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP.
  • De volta aos números do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços sobre o comércio exterior, a importação de energia, mais uma vez, e as compras externas de adubos e fertilizantes responderam por 98,4% do crescimento das importações totais entre outubro de 2020 e o mesmo mês deste ano. Não houve aquisição de energia elétrica em outubro de 2020, mas as compras, como visto, somaram US$ 196,738 milhões em igual mês deste ano. As compras de adubo mais do que triplicaram, saltando de US$ 66,684 milhões para US$ 214,551 milhões em outubro deste ano.
  • Aqueles dois itens foram igualmente decisivos na definição da tendência de crescimento das importações ao longo do ano. Nos primeiros dez meses deste ano, o Estado importou US$ 4,353 bilhões (segundo maior valor da série histórica), o que correspondeu a um aumento de 60,7% frente aos US$ 2,709 bilhões importados entre janeiro e outubro do ano passado. Quer dizer, as compras externas anotaram acréscimo de US$ 1,644 bilhão, com a energia respondendo com avanço de US$ 784,166 milhões e os adubos entrando com mais US$ 434,593 milhões. Os dois itens explicam, portanto, perto de 74,1% do aumento geral acumulado pelas importações totais.
  • As compras de adubos foram impactadas fortemente pela alta de 49,7% nos preços médios, que subiram de US$ 236,74 para US$ 354,36 por tonelada. Em volume, as importações do produto subiram 26,8%, para 2,593 milhões de toneladas (74,2% de todo o volume importado pelo Estado).

As exportações cresceram 13,6%, avançando de US$ 6,998 bilhões para quase US$ 7,948 bilhões entre janeiro e outubro deste ano – o valor mais alto na série estatística do ministério. Cinco itens explicam 97,6% do crescimento das exportações totais – soja em grão (com contribuição de 41,24%), carne bovina (23,78%), farelo de soja (13,46%), cobre e seus concentrados (12,93%) e aves (6,17%).