O tormento de não poder sair às ruas
Ainda repercute a anedota segundo a qual feliz era o Brasil quando a população desconhecia os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal e sabia decorados os nomes dos 11 jogadores da Seleção de futebol. O que marcou esse tormento para os integrantes do STF foi a transmissão ao vivo das sessões. Os julgamentos, todos eles, despertam paixões, afinal, no mínimo há um lado contrário e outro favorável.
Por isso, Luís Roberto Barroso deixou a presidência da Suprema Corte pedindo um tempo para retiro espiritual. Nem houve tempo: pediu para sair. Como alguém que gosta do Direito abre mão de compor seu Everest? A parte mental não aguenta. O próprio Barroso foi assediado em porta de hotel, em aeroporto, no meio da rua.
Agora, diz-se que a única mulher do STF, Cármen Lúcia, também pode antecipar a aposentadoria. Eis um dos gargalos da democracia: ter de respeitar a opinião alheia. Quando quem a emite é um julgador, cresce a dificuldade, porque alguém vai ser derrotado.
Mais uma vez, o efeito é originário da política. Como a Constituição é um saco de gatos que cabe tudo, tudo vai parar no Supremo, de briga de vizinho a furto em supermercado. A encrenca se avolumou com a polarização pós-2013, com apogeu em 2018 e o insuportável em 2022.
Respeitar o trabalho alheio, não importa qual, é básico da formação. Isso tem de ser explicado para esquerdistas e bolsonaristas, que aprontam todas na redes sociais. O Supremo erra muito, como no caso da suspensão de obras viárias em Goiás, porém erro ainda maior é considerar suas decisões passíveis do OK das ruas.
A Seleção de futebol perdeu para o Japão. O STF decidiu contra o que achávamos correto. E daí?