Perdas se espalham pela indústria e produção volta a cair em setembro

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 02 de novembro de 2022

Os efeitos “retardatários” da política de juros altos sobre a atividade econômica, as incertezas nos cenários doméstico e internacional, a inflação persistente e o avanço da carestia no setor de alimentos continuam a operar de forma a esvaziar as possibilidades de crescimento mais alentado no terço final deste ano. Até aqui, a indústria surge como principal setor afetado pelo efeito combinado daqueles fatores, com a produção apontando para baixo pelo segundo mês consecutivo em setembro, na comparação com o mês imediatamente anterior, depois de oscilar entre altos e baixos desde o final do semestre passado.

O “efeito gangorra”, conforme registrado neste espaço (O Hoje, 06.10.2022), parece ter aberto espaço para uma redução continuada da produção, conforme sugerem os dados da mais recente pesquisa mensal sobre a produção industrial, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A produção no setor, que já havia experimentado recuo de 0,7% na saída de julho para agosto, voltou a anotar baixa em idêntica intensidade, numa queda de 0,7% na passagem de agosto para setembro, já descontados fatores sazonais. Na visão do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), “este é um sinal de que a oscilação entre altas e baixas, que vimos na virada do semestre, pode estar dando lugar a uma nova sequência de declínios”.

Os sinais, no entanto, são de uma piora qualitativa no desempenho industrial entre agosto e setembro, conforme anota ainda o mesmo Iedi, sempre com base nos números apurados pelo IBGE. Houve uma “piora quanto à amplitude setorial no resultado mais recente”, aponta o Iedi, mostrando que, em agosto, perto de 35% dos 26 ramos industriais investigados pelo IBGE haviam apresentado números negativos na comparação com julho. Essa proporção saltou para 81% em setembro, quando 21 daqueles ramos ficaram no vermelho e apenas cinco apresentaram crescimento.

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Perdas mais amplas

Na mesma direção, o indicador de “difusão” do IBGE, que assinala o percentual de produtos em crescimento na indústria como um todo, despencou de 70,3% em agosto para apenas 30,9% em setembro. Foi o percentual mais baixo para o mês desde setembro de 2018, quando apenas 22,7% dos produtos fabricados pela indústria chegaram a crescer em relação a agosto do mesmo ano. Na comparação com o mesmo mês de 2021, o índice de difusão saiu de 48,0% em agosto para 45,3% no mês seguinte, apenas mais elevado do que em setembro do ano passado (42,6%), quando a indústria havia registrado baixa de 4,1%. Considerada a série desde 2013, o percentual de produtos em alta foi o segundo mais baixo para o mesmo mês desde de 2016.

Balanço

  • Para reforçar seu diagnóstico, o Iedi acrescenta que 86% dos 26 ramos investigados pelo IBGE apresentaram perdas mais acentuadas do que a baixa anotada pelo conjunto da indústria, diante de 78% em agosto deste ano. Os números vieram muito ruins para as indústrias de fabricam produtos de madeira, para a metalurgia, produtos diversos, bebidas e confecções, com baixas, pela ordem, de 8,8%, 7,6%, 6,1%, 4,6% e de 3,6%.
  • Entre os ramos industriais que chegaram a avançar, destacam-se as indústrias de produtos de fumo, com alta de 6,9%, outros equipamentos de transportes (mais 2,7%), máquinas e equipamentos (2,2%) e a indústria extrativa, que avançou 1,8%. A indústria de transformação, no entanto, apresentou baixa de 1,3%.
  • Entre os grandes setores industriais, conforme a pesquisa do IBGE, todos tropeçaram em setembro, com perdas de 1,1% para a indústria de bens intermediários e de 1,4% no setor de produtos semi e não duráveis. A produção de bens de capital, que havia sofrido baixas de 1,6% e de 3,2% em junho e julho, não conseguiu dar continuidade aos números positivos de agosto, quando chegou a avançar 5,8%, recuando 0,5% em setembro.
  • A indústria de bens duráveis havia perdido todo o avanço de 6,5% observado em junho com queda de 6,8% no mês imediatamente seguinte, recuperando-se em seguida ao saltar 6,2% em agosto. Mas, em setembro, a produção recuou 0,2%.
  • A base de comparação mais baixa em setembro do ano passado ajuda a explicar parcialmente o avanço registrado no mesmo mês deste ano, com a produção avançando 0,4% nesse tipo de comparação. Ainda assim, praticamente 54% dos ramos acompanhados pelo órgão oficial de pesquisas, ou 14 em 26, apresentaram dados negativos em relação a setembro do ano passado. Os números foram piores para os setores de manutenção, reparação e instalação de máquinas e equipamentos (-6,4%), para produtos de madeira (-4,5%), têxteis (-3,2%), móveis (-2,8%) e confecções (-2,4%).
  • A produção de alimentos, que sofreu baixa de 2,9% entre agosto e setembro, foi igualmente menor do que em setembro de 2021, com perda de 0,4%. No acumulado entre janeiro e setembro deste ano, a indústria de bens alimentícios anota variação de apenas 0,7%, saindo-se ainda assim melhor do que a média de todo o setor industrial, que apresentou redução de 1,1%.
  • Com os devidos ajustes sazonais, quer dizer, excluindo-se fatores que se repetem em períodos determinados do ano (feriados, finais de semanas e outras ocorrências), a produção em setembro não conseguiu retomar sequer os níveis de fevereiro de 2020, antes da pandemia, acumulando queda de 2,4% até setembro deste ano.
  • O tamanho do atraso no setor industrial pode ser observado ainda na comparação com maio de 2011, quando a produção havia alcançado sua melhor marca histórica. Desde lá, a pesquisa aponta uma retração de 18,7%. Em outras palavras, a indústria consegue produzir hoje o equivalente a 81,3% do que produzia há 11 anos. A produção de duráveis, por seu turno, estava, em setembro deste ano, 37,1% abaixo dos níveis recordes de março de 2011. No setor de bens de capital, a distância chegava a 23,9% quando se considera o volume produzido em abril de 2013.