PIB supera previsões, mas dados sugerem estagnação no 2º semestre

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 02 de setembro de 2022

Os números do Produto Interno Bruto (PIB), que em tese “mede” o volume de riquezas produzidas por um país, vieram, no segundo trimestre, acima das projeções antecipadas por analistas, consultores e pelo mercado, impulsionado pelo consumo das famílias e pela reabertura das atividades no setor de serviços. A expectativa, daqui em diante, considerando-se o esgotamento dos efeitos da reabertura dos serviços e dos incentivos ao consumo, os impactos da política de juros altos sobre o lado real da economia, num cenário em que as famílias já enfrentam níveis históricos de endividamento, e o desaquecimento nas principais economias do planeta, é de estagnação virtual da atividade econômica no segundo semestre.

As estimativas para o PIB ao longo dos 12 meses deste ano indicam a possibilidade de taxas de crescimento um pouco melhores que as previsões iniciais, embora num ambiente de desaceleração. Essa melhora pontual, de toda forma, será determinada pelo comportamento observado na primeira metade do ano. Nas estimativas dos economistas Natalia Cotarelli e Matheus Fuck, do Itaú BBA, os resultados já observados nos dois primeiros trimestres do ano deixam um “carrego estatístico” muito próximo de 2,6% para o segundo semestre. O dado sugere uma taxa de crescimento no ano próxima daquele número, ainda que a economia pare de avançar na segunda metade do ano. Trata-se, na verdade, de mero efeito estatístico, que ajudará a “enfeitar” os números do PIB no fechamento do ano. A se confirmar a desaceleração apresentada pelos indicadores diários acompanhados pelo banco, a “herança estatística” para 2023 seria muito menos positiva, o que estaria por trás das previsões de um crescimento medíocre no próximo ano, em torno de 0,4% a 0,5%.

No mesmo ritmo

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O ritmo da atividade econômica no segundo trimestre, no entanto, praticamente reeditou o dado do trimestre imediatamente anterior, na série com ajuste sazonal – quer dizer, descontados fatores que ocorrem em períodos determinados do ano e que, de outra forma, poderiam afetar os resultados na economia, para baixo ou para cima, sem que isso necessariamente signifique alguma variação efetiva no ritmo da geração de riquezas. Segundo divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB avançou 1,2% na saída do primeiro para o segundo trimestre deste ano, avançando 3,2% na comparação com os três meses finalizados em junho do ano passado. Na medição anterior, a economia havia avançado 1,1% na passagem do quarto trimestre de 2021 para o primeiro deste ano. Na previsão mais mencionada pelos bancos e outras instituições do setor financeiro, esperava-se uma variação em torno de 0,9% no segundo trimestre.

Balanço

  • A principal surpresa, na visão de Natalia Cotarelli e Matheus Fuck, veio precisamente do setor de serviços, que registrou avanço de 1,3% em relação ao primeiro trimestre deste ano e cresceu 4,5% diante do segundo trimestre do ano passado. Na leitura do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), “o dinamismo mais robusto do consumo das famílias rebateu na expansão dos serviços”. De fato, nos dados do IBGE, o consumo das famílias, que havia registrado variação de apenas 0,5% nos primeiros três meses deste ano, cresceu 2,6% no segundo trimestre, sempre em relação ao trimestre imediatamente anterior.
  • Os economistas do Itaú BBA, assim como a equipe do Iedi, sugerem que a reação observada para o consumo das famílias estaria relacionada pelos sucessivos pacotes de estímulos fiscais adotados pela equipe econômica na antevéspera das eleições, o que teria contrabalançado temporariamente os efeitos deletérios da alta da inflação sobre o poder de compra das famílias e sobre suas decisões de consumo.
  • Segundo o Iedi, o desempenho pode ser atribuído às “medidas adotadas para suportar a demanda das famílias, a exemplo do saque extraordinário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), da antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas e da elevação da margem do crédito consignado sobre a renda do beneficiário”.
  • O Itaú BBA trabalha com a perspectiva de uma economia em relativa estabilidade no semestre em curso, alternando uma elevação mínima de 0,1% no terceiro trimestre e recuo de 0,1% no quarto trimestre. Nessa avaliação, “o estímulo fiscal provavelmente será compensado pelos efeitos da política monetária contracionista [quer dizer, pela escalda dos juros] e pela desaceleração da atividade global”.
  • O investimento voltou a circular por terreno positivo, mas depois de quedas pronunciadas num período mais recente. O IBGE registra variação de 4,8% no segundo trimestre, depois de queda de 3,0% no primeiro, sempre em relação aos três meses imediatamente anteriores. Na comparação com igual período do ano passado, o investimento havia desabado 7,2% no primeiro trimestre e anotou elevação modesta de 1,5% no segundo, encerrando a primeira metade do ano ainda em baixa de 2,9% diante do mesmo semestre do ano passado.
  • O setor de serviços, depois de perdas sucessivas ao longo de 2020 e até o primeiro trimestre do ano passado, engrenou uma fase de recuperação do terreno que havia perdido desde o começo da pandemia, empurrado pela demanda reprimida nesta área, “principalmente daqueles que conseguiram preservar emprego e renda ao longo da pandemia”, assinala o Iedi. Os dados do IBGE mostram elevação de 1,3% no segundo frente ao primeiro trimestre deste ano, com alta de 4,5% frente ao segundo trimestre de 2021, acumulando elevação de 4,1% no primeiro semestre.
  • Há dúvidas entre economistas de correntes diversas em relação à capacidade de o setor preservar o mesmo ritmo daqui em diante, considerando um ambiente de incertezas, com eleições adiante e um cenário nebuloso no próximo ano.