Preços “monitorados” explicam mais de dois terços da inflação de maio

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 11 de junho de 2021

Os preços dos produtos e serviços “monitorados” experimentaram forte aceleração em maio e responderam por mais de dois terços do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) divulgado na quarta-feira, 9, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa categoria de bens e serviços inclui desde a energia elétrica, gás de cozinha, passagens de ônibus, trem e metrô, táxi, multas, pedágio, gasolina e diesel a medicamentos, planos de saúde, loterias, correios, tarifas de água e esgoto e os planos de telefonia fixa. A alta observada pelo IBGE na média de todo o País atingiu 2,11% no mês passado, com influência de pouco mais de 66,5% na formação do IPCA “cheio”, que alcançou 0,83% como já divulgado.

Em abril, para um IPCA na faixa de 0,31%, os preços monitorados, ou seja, definidos de alguma forma pelo setor público, por agências de regulação e estatais (a exemplo da Petrobrás, que estabelece os preços da gasolina, do diesel e do gás nas refinarias), haviam experimentado elevação de 0,38% e haviam sido responsáveis por 48,5% da inflação mensal. Claramente, aqueles preços tornaram-se o foco principal de pressão inflacionária em maio, principalmente em função da mudança na forma de cobrança da energia elétrica consumida nas residências.

Diante da forte estiagem que derrubou o nível dos reservatórios, a geração de energia pelas usinas hidroelétricas foi igualmente afetada, obrigando o governo a acionar as termoelétricas instaladas no País, que produzem energia mais cara. Para desestimular o consumo e compensar o custo mais alto na geração de energia, o governo estabeleceu esse sistema de “bandeiras”, que correspondem, resumidamente, a um adicional cobrado sobre a tarifa de energia, encarecendo seu preço para os consumidores. Desde maio, entrou em vigor o primeiro nível da “bandeira vermelha”, que acrescenta R$ 4,169 a cada quilowatt/hora consumido por residência.

Continua após a publicidade

A tarifa média de energia, que chegou a experimentar ligeiro recuo (-0,04%) em abril, apresentou elevação de 5,37% em maio. Se a tarifa de energia ajudou a segurar o IPCA em abril, no mês seguinte, contribuiu com 27,4% na composição do índice, puxando a taxa inflacionária para cima.

Espiral indesejável

Em proporção menos intensa, os preços dos demais produtos e serviços não controlados pelos governos, por suas agências e estatais apresentaram variação média ao redor de 0,28% em maio, frente a 0,16% um mês antes, na estimativa feita pela coluna com base em dados brutos do IBGE. Na medição de outras consultorias e bancos de investimento, os preços livres (quer dizer, em tese determinados livremente pelo mercado) saíram de uma variação de 0,28% em abril para 0,37% em maio, o que parece corroborar a tese sustentada pelo Banco Central (BC) e seu Comitê de Política Monetária (Copom) em defesa da alta dos juros básicos. Na versão da autoridade monetária, o aumento dos juros poderia ser justificada, a esta altura, como forma de conter “efeitos de segunda ordem” de pressões altistas reconhecidamente temporárias e concentradas em alguns setores da economia (alta dos preços dos alimentos, sob influência do mercado internacional, já parcialmente revertida; desvalorização do real frente ao dólar, encarecendo os produtos negociados lá fora pelo País, igualmente desacelerada; dentre outros focos). A ideia, neste caso, seria evitar que esses aumentos venham a “contaminar” os demais preços, gerando, aí sim, uma espiral inflacionária indesejável.

Balanço

  • O avanço dos preços livres, numa análise que toma como referência dados desagregados preparados pelo Banco Fator, parece ter sido influenciado mais fortemente pelo salto nos preços dos produtos negociados no exterior (os tais “tradables”, como os mercados preferem chamá-los). A inflação dos bens mais influenciados pelo mercado internacional saiu de 0,48% em abril para 0,99% no mês seguinte. Na leitura do banco, os preços livres passaram a subir a uma taxa mensal de 0,37% em maio, o que se compara com elevação de 0,28% em abril.
  • Aqueles bens que não são exportados pelo País e nem importados (“non tradables”), na verdade, registraram preços virtualmente estabilizados em maio, num ligeiro recuo de 0,08% frente a abril, quando haviam subido 0,14%. Nos 12 meses terminados em maio, a “inflação” desses produtos ficou limitada a 2,33% (enquanto o IPCA “cheio” atingiu uma variação de 8,06%).
  • Com a demanda doméstica ainda enfraquecida e cambaleante, os custos médios dos serviços praticamente não registraram alta em abril, com variação muito modesta de 0,05%. E tiveram pequeno recuo em maio (-0,15%), acumulando uma variação de 1,75% em 12 meses, muito distante do aumento médio verificado para o restante dos preços na economia.
  • As taxas inflacionárias de fato estão rodando em níveis mais elevados neste ano, mesmo se descontados os índices muito baixos observados em 2020, quando foram mais severas as restrições à circulação de pessoas e ao funcionamento de bares, lanchonetes, restaurantes, hotéis, casas de shows e de eventos, entre outros serviços.
  • Um dos fatores por trás desse aumento dos índices inflacionários foi o dólar, que havia saltado 9,7% entre dezembro do ano passado e março deste ano, considerando a cotação média mensal do período. A cotação da moeda saiu de quase R$ 5,15 para R$ 5,65 no período. Desde abril, no entanto, o câmbio se acomodou e passou a cair, quer dizer, o real tornou-se mais “barato” na comparação com o dólar, que entrou em alta no mercado internacional. Na média, sua cotação aqui dentro já acumulava, até ontem, dia 10, uma queda de 10,0% em relação a março, com o dólar aproximando-se de R$ 5,08.
  • As dúvidas em relação às decisões recentes do BC, com a retomada do processo de alta dos juros básicos, estão relacionadas principalmente aos efeitos que essa elevação terá sobre o lado real da economia, especialmente sobre os custos do crédito de longo prazo, vale dizer, sobre os financiamentos contratados pelas empresas para colocarem de pé projetos de investimento. Adicionalmente, o aumento dos juros terá consequências sobre a situação fiscal do Tesouro, encarecendo sua dívida e gerando novas despesas financeiras.