Coluna

Produção industrial ainda avança modestamente e enfrenta dificuldades

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 05 de dezembro de 2019

A
produção industrial finalmente engatou seu terceiro mês consecutivo de (baixo)
crescimento, o que não deixa de ser um dado positivo. Uma sequência de
resultados positivos assim não era observada desde 2017, conforme sublinha o Instituto
de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). De qualquer forma, os
sinais de alguma melhoria são até aqui incipientes, precisam ter uma
continuidade nos próximos meses até se configurar uma virada de tendência de
fato e indicam um ritmo ainda insuficiente para antecipar um desempenho mais
promissor daqui em diante, que permita ao setor recuperar todo o terreno
perdido nos anos de crise. Na verdade, ainda não ajudaram a mudar o sinal
observado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em sua
pesquisa mensal da produção industrial: transcorridos os primeiros 10 meses do ano,
o setor continua a trafegar por terreno negativo, acumulando redução de 1,1%
frente a igual período do ano passado.

Na
versão do Iedi, a queda nas taxas básicas de juros, repassada numa moderação
exasperante pelos bancos ao custo de dinheiro que emprestam às famílias e às
empresas, a liberação de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS) e a “reativação, mesmo que precária, do emprego” (sobre a qual há
dúvidas consistentes) tenderiam a assegurar uma certa continuidade para a
reação da produção na indústria. Sempre lembrando que os efeitos do FGTS tendem
a ser limitados no tempo, como demonstra a experiência do governo Temer,
devendo-se considerar ainda que parte do dinheiro poderá ser direcionado para o
pagamento de dívidas.

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A
jogar contra, tem-se a retração da economia na Argentina, que afeta
especialmente a venda externa de bens manufaturados (e, portanto, sua produção
aqui dentro), o desaquecimento no comércio internacional de forma mais ampla, o
impacto das incertezas geradas pela disputa comercial entre Estados Unidos e
China, sobretudo diante das reações intempestivas do presidente
norte-americano, e a expectativa de menor crescimento em economias importantes
(a exemplo da Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Japão e outras). Em conjunto,
essas restrições podem tornar mais difícil sustentar números positivos para as
exportações (que, na verdade, já vêm caindo neste ano, acumulando baixa de 6,4%
na comparação entre os primeiros 11 meses de 2019 e igual período de 2018).

Fora da curva?

Não
deixa de causar certa perplexidade o fato de um governo que se declara
radicalmente liberal recorrer a políticas mais “intervencionistas” para
estimular a demanda, que, ao fim e ao cabo, são a negação do liberalismo
defendido pelo superministro dos mercados. Desde seu anúncio, percebe-se não
apenas uma certa falta de convicção da equipe econômica em relação às medidas
que tiveram que adotar para tentar injetar algum ânimo na economia, mas
principalmente ausência de coordenação e planejamento. A liberação do FGTS, por
exemplo, não faz parte de uma política mais ampla de estímulo ao consumo e,
neste sentido, não se fez seguir de outras providências na mesma direção, o que
prenuncia um fôlego mais curto e efeitos passageiros sobre a atividade
econômica.

Balanço

·  
O
Iedi acredita que a produção industrial pode mesmo encerar o ano “mais próxima
da estabilidade do que da recessão”, o que tendea ser considerado até positivo,
mas muito pouco ambicioso, seja pelo tamanho da ociosidade nas fábricas, seja
porque restaria um longo trajeto a ser coberto até que a atividade industrial
retome os níveis anteriores à fase mais crítica, observada de 2014 em diante.

·  
Na
série de dados do IBGE, considerando os níveis médios trimestrais da produção
industrial, o setor ainda estaria 15,8% abaixo daqueles observados no trimestre
finalizado em maio de 2011. Em outubro deste ano, a produção sequer havia
retomado o mesmo nível observado em abril de 2018, antes da greve dos
caminhoneiros. Mas a distância, que já foi bem maior, agora se encontra em 1,7%
(mais claramente, a produção realizada em outubro deste ano ainda foi 1,7% mais
baixa do que a de abril do ano passado).

·  
Claro,
muito obviamente, evidentemente, isso não anula o fato de a produção ter
alcançado o terceiro mês de crescimento consecutivo em outubro, acumulando no
período um avanço de 2,4% de acordo com o IBGE. Mas igualmente é fato que esse
ritmo tem sido modesto e o crescimento não chegou ainda para
uma série de setores, concentrando-se, pelo menos em outubro, nos setores de
produção de alimentos e veículos e na indústria de petróleo.

·  
Conforme
a pesquisa do IBGE, aponta ainda o Iedi, 12 entre 46 ramos da indústria (ou 46%
do total) “não conseguiram expandir sua produção” em outubro. Nos 10 meses
iniciais deste ano, 57% dos setores pesquisados continuam “no vermelho” e mesmo
entre aqueles que cresceram, “só metade deles conseguiu reforçar seus
resultados” (quer dizer, apresentaram números melhores do que nas pesquisas
anteriores). Em outubro, apenas 48,2% dos produtos registraram incremento no
volume produzido em relação ao mesmo mês do ano passado.

·  
“A
melhora dos meses recentes tem sido promovida pela produção de bens de consumo,
enquanto a de bens intermediários continua se retraindo e a de bens de capital
sofreu forte desaceleração”, analisa o Iedi.

·  
A
produção de bens de capital, que de certa forma antecipa tendências para o
investimento na economia, caiu 0,4% e 0,3% em setembro e outubro, na comparação
com os meses imediatamente anteriores, e recuou 2,9% frente a outubro de 2018.
A taxa de crescimento da produção no setor saiu de 5,0% no segundo trimestre
para 1,4% no terceiro (sempre em relação a idêntico intervalo de 2018).